sábado, 20 de agosto de 2016

O JOGO

   No silêncio da tarde, quando a pequena cidade parece dormir, preguiçosa e vazia, uma forte batida ecoava no ar, quebrando aquela monotonia. Era um daqueles dias em que chove de manhã e na metade da tarde brilha o sol, despertando para um recomeço das coisas simples e boas da vida.
   O barulho parecia ser ouvido e entendido por algumas pessoas, especialmente. E essas pessoas, ao arremesso único de uma bocha, na Concha do Salão paroquial, convergiam para o local, alegres como se fosse um ponto de encontro entre bons e velhos amigos... A maior parte velha mesmo!
   Andar lento, porém, firme, sorriso no rosto, olhar atento ao redor, como a confirmar se o sinal fora ouvido e dar início ao ritual. Quem tivesse a ideia e chegasse primeiro ao local dava o aviso! 
   Os companheiros caminhavam barulhentos, riso alto, gritos eufóricos. Meu avô Mário era um deles. Quando ele ouvia o barulho, dizia: “Olha, escuta”. “Escuta o quê?”, a gente respondia. “Tem jogo”. E corria, literalmente para o local.
   Após a primeira batida, como se fosse o martelar de uma araponga, outros homens começavam a pipocar nas ruas, parecendo dia de festa. Lembro até do nome de alguns amantes do bocha, como o José Maratta, o Antônio Barbeiro, o velho Pessuti, além de muitos e muitos outros que, mesmo não lembrando seus nomes, não esqueço a alegria estampada nos rostos familiares. De uma hora para outra, como se costumava dizer, animava a cara da cidade. 
   Eu costumava olhar o campo de bocha, ou cancha: era gostoso de pisar, dava para jogar outras coisas ou simplesmente passar em cima e deixar marcas dos pés descalços. E até via os homens jogarem, às vezes, quando ia chamar meu avô. Mas achava tão sem graça aquela bola pesada e não conseguia, nem queria, entender as regras, a concentração, a “mirada no bolim”, lançado previamente, para então atirar. E despertar a cidade de sua inércia habitual. 
   Havia uma parada para contar os pontos, quando os jogadores discutiam e gritavam, quase tão alto quanto o barulho da bola de madeira. A maioria dos jogadores era formada por descendentes de italianos. Conforme alguns historiadores, o jogo de bocha teve origem na Itália e, pela algazarra dos jogadores, não dá para duvidar. “Bocci, botchie” era o sotaque do meu avô para o nome do jogo.
   Como o tempo costuma filtrar as lembranças e nos faz entender as razões do fato, acabei aprendendo muito com esse jogo, apesar de não entender as regras nem achar nenhuma graça: a importância do esporte como equipe, o valor da amizade, a beleza das coisas simples, a maioria dos pensamentos, a força que pode ser espalhada através de um sinal; desde que seja entendido como um convite à alegria de viver. (ESTELA MARIA FREDERICO FERREIRA, leitoa da FOLHA, página 2, coluna DEDO DE PROSA, FOLHA RURAL, sábado, 20 de agosto de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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Comentários

Wanda Cobo

"Maravilha meu amigo, continue nos deliciando com suas ideias." W.D Londrina-Pr


Adilson Silva

Olá Professor José Roberto, Parabéns pelas excelentes matérias , muito bom conhecimento para todos. muita paz e fraternidade. Londrina-Pr

Marcos Vitor Piter

Excelentes e Sabias palavras parabéns Professor um Abraço dos Amigos de Arapongas - PR.

João Costa

Meus parabéns por vc e por tudo que pude ler continue levando este conhecimento p/ todos. Forte abraço! João Batista.
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Meu amigo continue contribuindo com a sua sabedoria. Forte abraço... João Batista 31/10/2013
Daiane C M Santos
Parabéns, muito criativo e inteligente!
Zeze Baladelli
Oi meu amigo,entrei seu blog,parabéns querido,voce é um gentleman,um grande amigo e muito inteligente,desejo que Deus te abençoe mais e mais...super beijo...



MARINA SIMÕES

Caro amigo Roberto, muito obrigada por suas sábias e verdadeiras palavras. Como é bom encontrarmos no nosso dia adia pessoas que comungam nossas idéias, nossas críticas, ou mesmo comentário sobre determinados assuntos. Eu procuro escrever e mostrar mensagens de
fé, de esperança, ou mesmo um alento carinhoso para nós que vivemos um mundo tão cruel, egoísta e caótico. Estou tentando escrever um comentário sobre seus textos. Parabéns, eu os tenho como que a "arquitetura" com as palavras. É um estilo totalmente seu, e meu amigo é simplesmente estimulante. Ele nos faz pensar e isto é muito bom. Um grande abraço. Marina.



JOÃO RENATO
Aqui estou eu novamente é impossivel não entrar aqui para vê estas maravilha por vc postada. Forte abraço do seu amigo hoje e sempre...........

ADALGISA
Parabéns! meu amigo querido!!!Adorei seu blog, mensagens lindas e suaves como a tua persoalidade e seu jeito de ser!!!Abraços e beijos.
TIAGO ROBERTO FIGUEIREDO
Parabéns professor José Roberto seu blog está divino..abs !
JAIRO FERNANDES
Olá, Querido Professor José Roberto! Fiquei muito emocionado com suas mensagens postadas, gostaria muito de revê-lo novamente após muitos anos, você fora meu professor e tenho muita saudade, gostaria que enviasse-me o seu endereço.ʺ Deus te ilumine sempreʺ Pois fazes parte de minha história de vida.
ALICE MARIA
Oi tio.Muito lindo seu cantinho na internet. Tô de olho. Lembro também de algumas coisas lá da Serra, principalmente da venda do vô Rubens. Beijo ,Alice Maria.

WANDA COBO

WANDA COBO

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