terça-feira, 26 de abril de 2016

MEMÓRIAS DE UM DEPRESSIVO





   Por um momento pensei em escrever “ex-depressivo” no título desta coluna, mas não seria justo: com os que ainda sofrem ou irão sofrer a mesma doença, com as cicatrizes que a depressão deixa nas almas por onde passou; e comigo mesmo, que venci, mas ainda tenho a depressão nítida na memória. Sou como aquele alcoólatra que não bebe há mais de vinte anos mas mantém uma garrafa de vodca na geladeira, só para provar que é mais forte que a bebida. O “ex” na faz sentido. 
   Se vocês querem uma definição, aqui vai uma. Já devem ter notado o carinho e a saudade com que sempre me refiro ao meu pai nestas linhas. Pois uma crise de depressão é equivalente a receber a notícia da morte de meu pai por telefone, várias vezes seguidas, esquecendo-me do terrível fato entre um telefonema e outro. 
   Leitor de muitas narrativas sobre campos de concentração, tanto os nazistas como os comunistas, arrisco mais uma definição da doença: estar depressivo é como ter a mente transformada em Auschwitz, por algumas horas...ou alguns dias. A depressão é um prenúncio do Inferno; não tenho dúvida que Dante conheceu esse mal. 
   Escrevo estas memórias, e pretendo continuá-la em outras colunas, porque a depressão é um problema de saúde que afeta a sociedade inteira (difícil encontrar alguém que não tenha ao menos um caso na família ou entre os amigos íntimos), mas também para exorcizar meus fantasmas. De vez em quando, em momentos de tristeza ou desânimo, que são perfeitamente naturais e não devem ser confundidos com a doença, contemplo uma nesga da face do velho monstro, a sombra de uma sombra, e sou colocado diante da remota, porém efetiva possibilidade de que ele volte. Falar, escrever sobre a depressão é evitar esse risco. Tchau, querida.
   Por falar em campos de concentração, o psicólogo e escritor Victor Frankl,  ex-prisioneiro de Auschwitz, desenvolveu a tese de que a chance de sobreviver ao campo era diretamente proporcional à existência de um sentido na vida: família, o trabalho, a profissão, uma tarefa a ser realizada. A depressão, ao contrário, fornece um sentido, mas um sentido falso, vazio, traiçoeiro. Muitas acabam por se afeiçoar a ela; eu mesmo vivi essa paixão que desagrega a alma. Muitos anos depois, já livre do doença, li as palavras de François Mauriac que descreviam minha vida na época passada: “Eu não amava a felicidade, não amava a paz. (...) Nada esperem de mim sobre esse assunto da angústia que não pertença à minha própria experiência: eu gostava da angústia e a preferia à Deus”. 
   O escritor Stephen King, um sobrevivente, confessou não lembrar como escreveu o romance “O Iluminado”, mergulhado que estava na amnésia do vício. Da minha época de depressão, ao contrário, eu me lembro muito bem, especialmente das coisas que deixei de fazer e amar e escrever. A melancolia será sempre a sombra de uma sombra na minha vida, e escrevo agora para você que passou ou passa por essa escuridão, com a única finalidade de dizer: - Há saída. ( Fale com o colunista: avenidaparana@folhadelondrina.com.br página 3, caderno FOLHA CIDADES, coluna AVENIDA PARANÁ, terça-feira, 26 de abril de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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Comentários

Wanda Cobo

"Maravilha meu amigo, continue nos deliciando com suas ideias." W.D Londrina-Pr


Adilson Silva

Olá Professor José Roberto, Parabéns pelas excelentes matérias , muito bom conhecimento para todos. muita paz e fraternidade. Londrina-Pr

Marcos Vitor Piter

Excelentes e Sabias palavras parabéns Professor um Abraço dos Amigos de Arapongas - PR.

João Costa

Meus parabéns por vc e por tudo que pude ler continue levando este conhecimento p/ todos. Forte abraço! João Batista.
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Meu amigo continue contribuindo com a sua sabedoria. Forte abraço... João Batista 31/10/2013
Daiane C M Santos
Parabéns, muito criativo e inteligente!
Zeze Baladelli
Oi meu amigo,entrei seu blog,parabéns querido,voce é um gentleman,um grande amigo e muito inteligente,desejo que Deus te abençoe mais e mais...super beijo...



MARINA SIMÕES

Caro amigo Roberto, muito obrigada por suas sábias e verdadeiras palavras. Como é bom encontrarmos no nosso dia adia pessoas que comungam nossas idéias, nossas críticas, ou mesmo comentário sobre determinados assuntos. Eu procuro escrever e mostrar mensagens de
fé, de esperança, ou mesmo um alento carinhoso para nós que vivemos um mundo tão cruel, egoísta e caótico. Estou tentando escrever um comentário sobre seus textos. Parabéns, eu os tenho como que a "arquitetura" com as palavras. É um estilo totalmente seu, e meu amigo é simplesmente estimulante. Ele nos faz pensar e isto é muito bom. Um grande abraço. Marina.



JOÃO RENATO
Aqui estou eu novamente é impossivel não entrar aqui para vê estas maravilha por vc postada. Forte abraço do seu amigo hoje e sempre...........

ADALGISA
Parabéns! meu amigo querido!!!Adorei seu blog, mensagens lindas e suaves como a tua persoalidade e seu jeito de ser!!!Abraços e beijos.
TIAGO ROBERTO FIGUEIREDO
Parabéns professor José Roberto seu blog está divino..abs !
JAIRO FERNANDES
Olá, Querido Professor José Roberto! Fiquei muito emocionado com suas mensagens postadas, gostaria muito de revê-lo novamente após muitos anos, você fora meu professor e tenho muita saudade, gostaria que enviasse-me o seu endereço.ʺ Deus te ilumine sempreʺ Pois fazes parte de minha história de vida.
ALICE MARIA
Oi tio.Muito lindo seu cantinho na internet. Tô de olho. Lembro também de algumas coisas lá da Serra, principalmente da venda do vô Rubens. Beijo ,Alice Maria.

WANDA COBO

WANDA COBO

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