sábado, 18 de fevereiro de 2017

CAÇADORES DE NEUROMITOS

   Professora da Uenp integra grupo de especialistas que está produzindo série de livros para desmentir informações equivocadas amplamente disseminadas sobre o funcionamento do cérebro
   Quem nunca ouviu que o ser humano só usa 10% da capacidade do seu cérebro e, se conseguisse atingir os 100%, teria poderes sobre-humanos? Ou que bebês que ouvem música clássica tornam-se adultos mais inteligentes? Afirmações como essas são bastante comuns e repetidas com tanta frequência que passaram a ser aceitas como verdades quando, na realidade, não passam de neuromitos, expressão que define as informações sem nenhum embasamento científico a respeito do funcionamento do cérebro. 
   A propagação de neuromitos ganhou força a partir da década de 1990, impulsionada pela rápida expansão dos avanços da neurociência no mundo, e desde então há um esforço de profissionais da área para combater e desmitificar os equívocos disseminados acerca de atividade cerebral. 
   Psicóloga com mestrado e doutorado em psicobiologia e professora da Universidade Estadual do Norte do Paraná (Uen), no campus de Bandeirantes (Norte Pioneiro), Roberta Ekuni, decidiu desfazer os neuromitos e em conjunto com os neurocientistas Larissa Zeggio e Orlando Bueno reuniu em livros artigos científicos que, em linguagem acessível, se dedicam a esclarecer os enganos. O primeiro volume, “Caçadores de Neuromitos – O que você sabe sobre seu cérebro é verdade?” , saiu em 2015 e, o segundo volunme, “Caçadores de Neuromitos: Desvendando os mistérios do cérebro”, foi lançado na sexta-feira (17). O terceiro já está em produção. Em entrevista à FOLHA, Roberta explica alguns equívocos e orienta como é possível se defender de um neuromito. 

   O que são neuromitos?
   Neuromitos são informações erradas sobre as descobertas do cérebro. São informações sem base científica e as pessoas passam essa informação para as outras como se fossem verdade. Eu comecei a pesquisar neuromitos mais ou menos em 2012, 2013, quando vi que na área de educação tinha muita informação errada sobre o cérebro, como, por exemplo, dizer que as crianças que usam mais o lado direito do cérebro são mais criativas, se usam mais o esquerdo têm mais o raciocínio lógico. Ou que os meninos são melhores em matemática do que as meninas. Os cientistas que estudam matemática dizem que isso é mentira e provam por quê. Tem até um livro que se chama “Cem bilhões de neurônios” e hoje a gente sabe que na verdade são 86 bilhões de neurônios (no cérebro) e como foi feita essa descoberta. Inclusive, há pós-graduações e especializações que as pessoas fazem para aprender essas informações sem nenhuma base científica. Eles acabam gastando dinheiro e investindo tempo aprendendo coisas que não são verdades. Então, me reuni com o professor Orlando Bueno, que foi meu orientador de mestrado, e com a Larissa Zeggio (mestre e doutora em neurociência), e resolvemos escrever sobre isso. Convidamos neurocientistas e em 2015 lançamos o volume 1 (“Caçadores de Neuromitos – O que você sabe sobre seu cérebro é verdade?). Então, além de informar o que está errado nós, junto com os neurocientistas que são colaboradores do nosso trabalho, damos a informação correta. Esse livro vem sendo usado até em cursos de graduação.

   Como surgem os neuromitos?
   Mais ou menos na década de 1990 foi o boom da neurociência. Começaram a ser descobertas muitas coisas legais na neurociência e as pessoas começaram a se interessar sobre neurociência. Só que muitas vezes para virar uma notícia tem que fazer uma manchete meio sensacionalista. Não é culpa do jornalismo, não, só que daí às vezes a pessoa não lê toda a matéria. E o artigo científico é muito difícil para a população ter acesso e interpretá-lo. Por exemplo, A neurocientista Molly Crockett (norte-americana) estudou dois grupos. Um grupo tomava um inibidor de neurotransmissor e outro, um placebo, e depois ambos tinham que fazer uma tarefa de decisão Nenhum grupo sabia o que estava tomando e nem o pesquisador que estava aplicando a bebida. O que acontece é que o grupo que tomou o inibidor do neurotransmissor teve um pior desempenho na tarefa de tomada de decisão, então existem vários alimentos que são precursores desse neurotransmissor, por exemplo, banana, pão de queijo, chocolate, enfim. E as notícias que saíram na época foram “coma pão de queijo antes de tomar uma decisão”, porque daí seu cérebro vai estar preparado. Mas não foi isso o que ela disse na pesquisa. Na pesquisa, estava inibindo e não colocando mais neurotransmissores. Ela só mostrou que o neurotransmissor específico estava envolvido no processo de tomada de decisão. A diminuição dele prejudicava e não o aumento dele melhorava a tomada de decisão. Então, a gente procura passar as informações da maneira como são mostradas nas pesquisas. 

   Como um leigo se defende de um neuromito?
   A população precisa ser alfabetizada cientificamente. A alfabetização científica não é saber ter ciência não é saber ter ciência. É saber interpretar, discutir sobre aquilo que você está lendo, criticar. Então, esse pensamento crítico vem com o treinamento. E o nosso objetivo é tentar dar algumas armas para as pessoas começarem a refletir, “ah, isso daqui está com cara de neuromito, vou pesquisar mais”, e saber buscar a informação, não acreditar em tudo o que as pessoas falam porque é muito grande o volume de informações nesse campo, principalmente depois da década de 1990, que foi esse boom de neurociência. Toda capa de revista, de tempos em tempos, tem um cérebro estampado. O cérebro é o órgão responsável por interpretar o que a gente ouve, o que a gente vê, o que a gente fala, então as pessoas têm interesse em saber um pouco mais sobre ele, independente de sua formação. 

   Um dos neuromitos mais mais difundidos é aquele que diz que o ser humano só utiliza 10% da sua capacidade cerebral e que se conseguisse ultrapassar esses 10% teria poderes sobre-humanos. Isso não é verdade? 
   Até agora não foi nada comprovado sobre isso, inclusive, se você tem lesões cerebrais até menores do que 10% você fica com muito prejuízo. Existem pesquisas na área da neuropsicologia, que é a ciência que estuda as áreas cerebrais e a relação com o comportamento humano. Qual área, levando em conta processos emocionais, está envolvida com a fala, qual área está envolvida com a visão, enfim. Essas pesquisas mostram que lesões muito pequenas às vezes causam prejuízos enormes para as pessoas. Então, se a gente usasse só 10%, o cérebro poderia ser super lesionado que não teria problema nenhum. A gente usa o cérebro todo. Eu diria que 100%. Vamos pensar. O cérebro, numa pessoa, em média, ocupa 2,3% do peso corporal dela e ele consome mais de 20% de toda energia que a gente produz. Se a gente usasse 10% dos 2,3%, daria 0,2% consumindo 20% de todo nosso gasto energético, não faz sentido. E não só esse argumento, mas pesquisas com neuroimagem não encontraram nenhuma área do cérebro sem função. Então, o que acontece é que esse mito dos 10% é muito otimista. Porque você fica: “Nossa, se eu desbloquear minhas capacidades...”.

   Mas é possível melhorar a capacidade cerebral? 
   Você pode melhorar suas habilidades, sim, através de treino. Você vê muitas pessoas que, por exemplo, não sabem tocar teclado, mas depois de muito treino conseguem. Não tem nada muito mágico para melhorar a capacidade a não ser treino, esforço, dedicação. É muito mais fácil você falar “vou desbloquear uma área e vou ficar boa”, mas isso não existe.

   E não tem medicamentos que ativem determinadas regiões cerebrais?
   No livro, tem um capítulo que fala sobre a pílula da inteligência, que fala justamente isso. Até agora não tem nenhum medicamento que comprove que se as pessoas tomarem elas vão ter um melhor desempenho orgânico. Infelizmente ou felizmente não tem essa comprovação. Ritalina, modafinil (medicamentos propagados como pílulas da inteligência)... Não existem evidências científicas que comprovem isso, pelo contrário. Não é bom as pessoas ficarem tomando medicamentos sem terem nenhuma indicação. Porque a gente vê muito as pessoas fazendo esse tipo de propaganda, vendendo no mercado negro. É ruim. 

   Os neuromitos ajudam a neurociência de alguma forma ou eles só prestam um desserviço?
   Eu não acho que eles ajudam a neurociência de forma alguma. A neurociência já é incrível por sí só. Já tem tantas descobertas legais que a gente não precisa ficar criando informações erradas para chamar mais atenção do público. Inclusive eu já vi professores falando de neurociência em sala de aula como se fossem verdades, de tanta informação errada que passa por aí. Então, até a gente da ciência tem que investigar bem os fatos antes de replicar para os alunos porque tem aquela questão da autoridade, se você é professor, você é autoridade. Se você fala isso para um aluno, ele toma aquilo como verdade. Por isso é tão importante que os cientistas invistam em divulgar a ciência para a população. 

Leia entrevista completa, usando aplicativo capaz de ler QR Code e posicionando no código abaixo. (FONTE: SIMONI SARIS - REPORTAGEM LOCAL, página 3, FOLHA ENTREVISTA, Ciências, entrevista@folhadelondrina.com.br 18 e 19 de fevereiro, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA.

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Comentários

Wanda Cobo

"Maravilha meu amigo, continue nos deliciando com suas ideias." W.D Londrina-Pr


Adilson Silva

Olá Professor José Roberto, Parabéns pelas excelentes matérias , muito bom conhecimento para todos. muita paz e fraternidade. Londrina-Pr

Marcos Vitor Piter

Excelentes e Sabias palavras parabéns Professor um Abraço dos Amigos de Arapongas - PR.

João Costa

Meus parabéns por vc e por tudo que pude ler continue levando este conhecimento p/ todos. Forte abraço! João Batista.
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Meu amigo continue contribuindo com a sua sabedoria. Forte abraço... João Batista 31/10/2013
Daiane C M Santos
Parabéns, muito criativo e inteligente!
Zeze Baladelli
Oi meu amigo,entrei seu blog,parabéns querido,voce é um gentleman,um grande amigo e muito inteligente,desejo que Deus te abençoe mais e mais...super beijo...



MARINA SIMÕES

Caro amigo Roberto, muito obrigada por suas sábias e verdadeiras palavras. Como é bom encontrarmos no nosso dia adia pessoas que comungam nossas idéias, nossas críticas, ou mesmo comentário sobre determinados assuntos. Eu procuro escrever e mostrar mensagens de
fé, de esperança, ou mesmo um alento carinhoso para nós que vivemos um mundo tão cruel, egoísta e caótico. Estou tentando escrever um comentário sobre seus textos. Parabéns, eu os tenho como que a "arquitetura" com as palavras. É um estilo totalmente seu, e meu amigo é simplesmente estimulante. Ele nos faz pensar e isto é muito bom. Um grande abraço. Marina.



JOÃO RENATO
Aqui estou eu novamente é impossivel não entrar aqui para vê estas maravilha por vc postada. Forte abraço do seu amigo hoje e sempre...........

ADALGISA
Parabéns! meu amigo querido!!!Adorei seu blog, mensagens lindas e suaves como a tua persoalidade e seu jeito de ser!!!Abraços e beijos.
TIAGO ROBERTO FIGUEIREDO
Parabéns professor José Roberto seu blog está divino..abs !
JAIRO FERNANDES
Olá, Querido Professor José Roberto! Fiquei muito emocionado com suas mensagens postadas, gostaria muito de revê-lo novamente após muitos anos, você fora meu professor e tenho muita saudade, gostaria que enviasse-me o seu endereço.ʺ Deus te ilumine sempreʺ Pois fazes parte de minha história de vida.
ALICE MARIA
Oi tio.Muito lindo seu cantinho na internet. Tô de olho. Lembro também de algumas coisas lá da Serra, principalmente da venda do vô Rubens. Beijo ,Alice Maria.

WANDA COBO

WANDA COBO

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