segunda-feira, 7 de março de 2016

VIOLÊNCIA DAS GUERRAS E A IMPORTÂNCIA DE SE CONTAR HISTÓRIAS


   A Primeira Guerra Mundial foi há cem anos. Muito se falou sobre as decorrências da guerra: falta de propósitos claros, dos milhões de mortos, feridos, da ascensão econômica dos Estados Unidos, da frustração e ódio na Alemanha,  germe do nazismo, do início do desiquilíbrio político no Oriente Médio, etc. Mas eu gostaria de falar de um outro fenômeno da guerra, lembrado pela primeira vez pelo pensador alemão Walter Benjamin, em texto de 1936, chamado “O Narrador”. Benjamin afirma que a guerra foi responsável por destituir uma geração inteira da capacidade de trocar experiências por meio de narrativas. Disse o filósofo: “No final da guerra, observou-se que os combatentes voltavam mudos dos campos de batalha. Não mais ricos e sim mais pobres em experiências comunicáveis”. 
   O homem da terra – o camponês – e o viajante – o marinheiro e o mercador – são as fontes principais das histórias que compõem o repertório de comunicação entre as pessoas e, por meio desse repertório, vão se fixando e repassando, de geração em geração , os modos de agir e as regras de interdição que caracterizam o que chamamos de cultura ou autorreferência. Essa é a razão – ou deveria ser – de contarmos histórias para as crianças.
   A guerra emasculou uma geração inteira de jovens, privando-os do lugar necessário e do tempo fundamental para a troca de experiências por meio das narrativas. A vivência nas trincheiras foi uma não experiência; o medo diário e asfixiante não deixava espaço para registrar variantes, inversões de expectativas e desfechos surpreendentes típicos de qualquer boa história.
   Não é à toa que o mais conhecido romance da Primeira Guerra, do alemão Eric Maria Bemarque, descrevendo a rotina de horrores e sofrimentos da guerra, chamou-se “Nada de novo no front”. Semprun, no livro “A escrita ou a vida”, diz: “ Vem-me uma dúvida sobre a possibilidade de contar. Não que a experiência vivida seja indizível. Ela foi invisível, o que é outra coisa(...) Outra coisa que não se refere à forma de um relato possível, mas à sua substância. Não à sua articulação, mas à sua densidade.(...)”
   Hoje, como sabemos, as guerras continuam. Não em um sentido formal de “guerras mundiais”, com trincheiras ou bombas atômicas, mas a violência nas fronteiras, nos territórios ocupados, nos exercício fundamentalistas , nas lutas de traficantes, no trânsito, na insensibilidade policial, na violência doméstica ou, simplesmente, ditada pela miséria e pelo descaso. Da mesma forma, o “invisível” desses fatos torna pouco crível seus relatos. As tentativas feitas pelos jornais e programas de televisão acabam promovendo uma anestesia, uma banalização, um menoscabo que exaspera as vítimas e reforça a invisibilidade dos algozes. 
   As guerras e a violência extática que elas proporcionam podem ser enfrentadas pela formação de novas sensibilidades. E só as criações narrativas têm o condão dessa formação. Se a violência é a marca secular de nossa humanidade desenraizada, a capacidade de sensibilizar os outros – principalmente as crianças e os jovens – com a riqueza artística de um relato – pode ser a maior bandeira de paz e de um futuro menos sombrio. ( DANIEL MEDEIROS, doutor em Educação Histórica pela UFPR e professor do curso positivo em Curitiba, página 2, ESPAÇO ABERTO, segunda-feira. 7 de março de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comente!

Comente!

.

.

.

.

Comentários

Wanda Cobo

"Maravilha meu amigo, continue nos deliciando com suas ideias." W.D Londrina-Pr


Adilson Silva

Olá Professor José Roberto, Parabéns pelas excelentes matérias , muito bom conhecimento para todos. muita paz e fraternidade. Londrina-Pr

Marcos Vitor Piter

Excelentes e Sabias palavras parabéns Professor um Abraço dos Amigos de Arapongas - PR.

João Costa

Meus parabéns por vc e por tudo que pude ler continue levando este conhecimento p/ todos. Forte abraço! João Batista.
--------
Meu amigo continue contribuindo com a sua sabedoria. Forte abraço... João Batista 31/10/2013
Daiane C M Santos
Parabéns, muito criativo e inteligente!
Zeze Baladelli
Oi meu amigo,entrei seu blog,parabéns querido,voce é um gentleman,um grande amigo e muito inteligente,desejo que Deus te abençoe mais e mais...super beijo...



MARINA SIMÕES

Caro amigo Roberto, muito obrigada por suas sábias e verdadeiras palavras. Como é bom encontrarmos no nosso dia adia pessoas que comungam nossas idéias, nossas críticas, ou mesmo comentário sobre determinados assuntos. Eu procuro escrever e mostrar mensagens de
fé, de esperança, ou mesmo um alento carinhoso para nós que vivemos um mundo tão cruel, egoísta e caótico. Estou tentando escrever um comentário sobre seus textos. Parabéns, eu os tenho como que a "arquitetura" com as palavras. É um estilo totalmente seu, e meu amigo é simplesmente estimulante. Ele nos faz pensar e isto é muito bom. Um grande abraço. Marina.



JOÃO RENATO
Aqui estou eu novamente é impossivel não entrar aqui para vê estas maravilha por vc postada. Forte abraço do seu amigo hoje e sempre...........

ADALGISA
Parabéns! meu amigo querido!!!Adorei seu blog, mensagens lindas e suaves como a tua persoalidade e seu jeito de ser!!!Abraços e beijos.
TIAGO ROBERTO FIGUEIREDO
Parabéns professor José Roberto seu blog está divino..abs !
JAIRO FERNANDES
Olá, Querido Professor José Roberto! Fiquei muito emocionado com suas mensagens postadas, gostaria muito de revê-lo novamente após muitos anos, você fora meu professor e tenho muita saudade, gostaria que enviasse-me o seu endereço.ʺ Deus te ilumine sempreʺ Pois fazes parte de minha história de vida.
ALICE MARIA
Oi tio.Muito lindo seu cantinho na internet. Tô de olho. Lembro também de algumas coisas lá da Serra, principalmente da venda do vô Rubens. Beijo ,Alice Maria.

WANDA COBO

WANDA COBO

Postagens populares