sábado, 16 de maio de 2015

UM ‘CAUSO’ DE MULA SEM CABEÇA



                       
   Antigamente as pessoas se reuniam em volta de um fogão a lenha em dias frios  e contavam histórias que na sua imaginação corriam soltas. Lobisomens, bicho papão , saci-pererê e tantas outras crendices faziam as noites assustadoras, principalmente para quem andava em carreadores escuros pelas matas que faziam sombra nas estradas de terra. A luz elétrica ainda não havia chegado e ainda não tinha acabado com o medo dos mistérios que a ciência ainda não havia explicado. Esta é uma estória típica daquela época.
   Era um daqueles caboclos sabidos que tinha no couro da sola do pé quase um dedo de grossura e tinha um sítio numa cidade muito distante. Foi pioneiro da região. Quando chegou ali era muito mato e muito bicho. Contava que afugentou muitas onças naquelas paragens. Um tempo difícil, que piorou com a segunda guerra mundial, quando faltava muita coisa: açúcar, farinha e querosene para alumiar a escuridão daquelas noites perigosas. Mas o que matava o povo de medo era a tal de mula sem cabeça.
   Muita gente falava dela, mas ele nunca vira nada. E sempre incrédulo  ria das histórias. “Minha gente, isso é tudo ‘supertição’. Os amigos diziam que se ele continuasse a fazer troça da mula sem cabeça podia topar com ela numa daquelas noites. E ele brincava  que era coisa de gente medrosa.
   Certa noite,  depois de sair da beneficiadora de arroz onde vendera a sua pequena colheita, passou pela venda. Lá estavam os amigos de sempre, jogando bocha. Perguntaram se ele jogava uma partida e ele disse que não. Para caçoar, falou que tinha um encontro com a mula sem cabeça.
   Os amigos então avisaram: “Não brinque não. Se vir a mula sem cabeça feche os olhos e esconde as unhas que elas  brilham.  Assim  ela não te vê e de deixa em paz”. Ele riu-se. “Como é que mula sem cabeça enxerga brilho de unha se não tem olho pra ver nada disso”? Deu de ombros, brincalhão, e foi embora.
   Para chegar em sua casa dava uma hora a pé. A terra de areia atrasava um pouco a caminhada mas ele já estava acostumado. La pelas tantas escutou um galope vindo de longe. Quando percebeu, ela a tal de mula sem cabeça que vinha ao seu encontro.”Não é que esse trem existe mesmo, sô? E tocou a correr do animal assombrado senão atropelava-lhe as forças.
   Era corajoso  mas não era doido e com coisa de outro mundo não se brinca. E danou-se a correr pela estrada. E a mula atrás. Fogo na cabeça quase a lhe alcançar. Já quase perdendo o fôlego e encomendando a alma a Deus, rezou tudo quanto era oração e fez  menção de nunca mais abusar daquelas coisas. Foi quando lhe deu na  ideia de  lembrar do que os amigos lhe disseram. Saiu da estrada, fechou os olhos e se encolheu escondendo as unhas. Nada que desse brilho. E escutou o animal passar e  ir embora no mesmo galope.
   Abriu os olhos e tomou outro susto. Na cacunda da mula, fazendo trança na crina, estava  aquele de uma perna só com uma touca vermelha na cabeça a lhe rir enquanto bafejava o cachimbo. “Dá-lhe saci “, riu, satisfeito. E pegou a estrada para casa, assobiando feliz, enquanto mula e saci sumiam.
   Nisso, ele acorda com um chacoalhão do dono da venda. “Acorda que eu to fechando”. Ele, meio atordoado com o sonho ruim, respondeu: “É, acho bom dormir por aqui mesmo seu Zé. Amanhã pego a es trada”. E pagou uma  pernoite na venda. Pelo sim, pelo não, seguro morreu de velho! ( Texto escrito por DAILTON MARTINS,  leitor da FOLHA, página 2, espaço DEDO DE PROSA, caderno FOLHA RURAL,  publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA, sábado, 16 de maio de 2015),

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Comentários

Wanda Cobo

"Maravilha meu amigo, continue nos deliciando com suas ideias." W.D Londrina-Pr


Adilson Silva

Olá Professor José Roberto, Parabéns pelas excelentes matérias , muito bom conhecimento para todos. muita paz e fraternidade. Londrina-Pr

Marcos Vitor Piter

Excelentes e Sabias palavras parabéns Professor um Abraço dos Amigos de Arapongas - PR.

João Costa

Meus parabéns por vc e por tudo que pude ler continue levando este conhecimento p/ todos. Forte abraço! João Batista.
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Meu amigo continue contribuindo com a sua sabedoria. Forte abraço... João Batista 31/10/2013
Daiane C M Santos
Parabéns, muito criativo e inteligente!
Zeze Baladelli
Oi meu amigo,entrei seu blog,parabéns querido,voce é um gentleman,um grande amigo e muito inteligente,desejo que Deus te abençoe mais e mais...super beijo...



MARINA SIMÕES

Caro amigo Roberto, muito obrigada por suas sábias e verdadeiras palavras. Como é bom encontrarmos no nosso dia adia pessoas que comungam nossas idéias, nossas críticas, ou mesmo comentário sobre determinados assuntos. Eu procuro escrever e mostrar mensagens de
fé, de esperança, ou mesmo um alento carinhoso para nós que vivemos um mundo tão cruel, egoísta e caótico. Estou tentando escrever um comentário sobre seus textos. Parabéns, eu os tenho como que a "arquitetura" com as palavras. É um estilo totalmente seu, e meu amigo é simplesmente estimulante. Ele nos faz pensar e isto é muito bom. Um grande abraço. Marina.



JOÃO RENATO
Aqui estou eu novamente é impossivel não entrar aqui para vê estas maravilha por vc postada. Forte abraço do seu amigo hoje e sempre...........

ADALGISA
Parabéns! meu amigo querido!!!Adorei seu blog, mensagens lindas e suaves como a tua persoalidade e seu jeito de ser!!!Abraços e beijos.
TIAGO ROBERTO FIGUEIREDO
Parabéns professor José Roberto seu blog está divino..abs !
JAIRO FERNANDES
Olá, Querido Professor José Roberto! Fiquei muito emocionado com suas mensagens postadas, gostaria muito de revê-lo novamente após muitos anos, você fora meu professor e tenho muita saudade, gostaria que enviasse-me o seu endereço.ʺ Deus te ilumine sempreʺ Pois fazes parte de minha história de vida.
ALICE MARIA
Oi tio.Muito lindo seu cantinho na internet. Tô de olho. Lembro também de algumas coisas lá da Serra, principalmente da venda do vô Rubens. Beijo ,Alice Maria.

WANDA COBO

WANDA COBO

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