domingo, 27 de novembro de 2016

AUTORES INCORPORAM LIVROS



   Bate-papos com grandes escritores nos mostram como misturam Literatura e vida
   Palestras de escritores acabam se transformando numa deliciosa contação de histórias. Na semana que passou, participei de bate-papos com Ignácio de Loyola Brandão e Ana Miranda, convidados do Festival Literário Londrix, que termina neste fim de semana. 
   Loyola Brandão tem um repertório na ponta da língua, histórias encadeadas que vão surpreendendo os espectadores porque são muito atraentes e porque o autor é performático, sentando-se e levantando-se nos momentos certos, gesticulando e interpretando o que conta de forma expressiva. Aos 80 anos, tendo estreado na literatura em 1965 com o livro de contos “Depois do Sol”, ele é um marinheiro experiente quando se trata de tocar o barco da literatura numa conversa, como se estivesse no convés ou na sala de visitas com seus leitores. 
   Como um encantador de plateias, ele resgatou uma história da infância, contou como o avô era um exímio marceneiro que chegou a construir um carrossel, num tempo em que os mecanismos para fazer funcionar este tipo de brinquedo eram escassos. Os olhos dos cavalos eram bolinhas de gude, e no dia em que o carrossel pegou fogo, a única coisa eu sobrou foram os olhinhos de vidro, que o avô resgatou das cinzas. Essa história desdobrou-se em outras que permeiam toda sua infância. 
   O encantamento continuou com outro episódio da adolescência do autor, que era um péssimo aluno de matemática mas, num exame final, diante de uma sala cheia de moças bonitas, não quis fazer feio e improvisou a resolução de uma equação sem ter o menor conhecimento da matéria. O professor, percebendo o quanto havia de imaginação na solução daquele problema, fez com o aluno um pacto não declarado e deixou que Loyola passasse de ano, dando-lhe a nota de que precisava. Professores sábios nunca forçarão a aprenderem na marra matérias que não fazem o menor sentido para suas vidas, é o que penso sobre a “obrigatoriedade das disciplinas”. O professor de Loyola já sabia que estava diante de um grande escritor, não de um matemático. 
   Ana Miranda também trouxe belas histórias na bagagem, ela que faz da literatura verdadeiras viagens no tempo – resgatando personagens literários históricos como Gregório de Matos Guerra ou Gonçalves Dias em suas obras – mostrou que cultiva uma relação mágica com a vida fazendo da anotação de sonhos um hábito que alimenta sua escrita. Também mostrou encantamento com culturas primitivas e florestas, seres mágicos de carne e osso como um índio de uma tribo do Acre, do qual tomou conhecimento através de uma amiga tão criativa como ela. Ana Miranda, além de escrever, desenha sua literatura, faz as capas de seus próprios livros. Exímia contadora de histórias, não só para adultos, mas também para crianças, revelou como se relaciona com os netos, como escreve para eles e, ao mesmo tempo, como na própria infância, já inventava livros e até editoras fictícias. 
   O contato com pessoas que vivem da escrita nos deixa a impressão de que o “ofício mais solitário do mundo” – a literatura – enchem a vida dos autores de outras personas e personagens, na verdade, uma multidão. É como se o autor se desdobrasse em si mesmo – criando personas – que se relacionam com personagens acolhendo a ficção como uma extensão da vida. Uma ficção levada tão a sério que ninguém duvida que a fantasia e os sonhos ganham materialidade quando passam aos livros como circunstâncias vividas através de outra forma de percepção dos mundos. Emocionante o relato de Ana Miranda sobre um sonho em que lhe aparecia uma personagem que vivia em Paraty (RJ), uma moça cujo vestido de noiva foi roubado no dia do casamento. Observei como ela descreveu um detalhe que eu ao sonho uma configuração de realidade: a moça, de quem roubaram o vestido de noiva, monta um cavalo de lado, como faziam as mulheres dos séculos 17 e 18, e sai atrás de quem teria roubado a sua roupa no dia do casamento. Este detalhe não me deixa dúvida de que Ana Miranda de fato trilhou o “caminho do ouro”, cavalgando sonhos que, afinal, tomam forma em sua literatura, compartilhada com leitores e outros sonhadores. Fiquei pensando se a moça encontrou o vestido. (Crônica da jornalista e escritora CÉLIA MUSILLI celiamusilli@gmail.com página 4, caderno FOLHA 2, coluna CÉLIA MUSILLI,  26 E 27 de novembro de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).   

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Comentários

Wanda Cobo

"Maravilha meu amigo, continue nos deliciando com suas ideias." W.D Londrina-Pr


Adilson Silva

Olá Professor José Roberto, Parabéns pelas excelentes matérias , muito bom conhecimento para todos. muita paz e fraternidade. Londrina-Pr

Marcos Vitor Piter

Excelentes e Sabias palavras parabéns Professor um Abraço dos Amigos de Arapongas - PR.

João Costa

Meus parabéns por vc e por tudo que pude ler continue levando este conhecimento p/ todos. Forte abraço! João Batista.
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Meu amigo continue contribuindo com a sua sabedoria. Forte abraço... João Batista 31/10/2013
Daiane C M Santos
Parabéns, muito criativo e inteligente!
Zeze Baladelli
Oi meu amigo,entrei seu blog,parabéns querido,voce é um gentleman,um grande amigo e muito inteligente,desejo que Deus te abençoe mais e mais...super beijo...



MARINA SIMÕES

Caro amigo Roberto, muito obrigada por suas sábias e verdadeiras palavras. Como é bom encontrarmos no nosso dia adia pessoas que comungam nossas idéias, nossas críticas, ou mesmo comentário sobre determinados assuntos. Eu procuro escrever e mostrar mensagens de
fé, de esperança, ou mesmo um alento carinhoso para nós que vivemos um mundo tão cruel, egoísta e caótico. Estou tentando escrever um comentário sobre seus textos. Parabéns, eu os tenho como que a "arquitetura" com as palavras. É um estilo totalmente seu, e meu amigo é simplesmente estimulante. Ele nos faz pensar e isto é muito bom. Um grande abraço. Marina.



JOÃO RENATO
Aqui estou eu novamente é impossivel não entrar aqui para vê estas maravilha por vc postada. Forte abraço do seu amigo hoje e sempre...........

ADALGISA
Parabéns! meu amigo querido!!!Adorei seu blog, mensagens lindas e suaves como a tua persoalidade e seu jeito de ser!!!Abraços e beijos.
TIAGO ROBERTO FIGUEIREDO
Parabéns professor José Roberto seu blog está divino..abs !
JAIRO FERNANDES
Olá, Querido Professor José Roberto! Fiquei muito emocionado com suas mensagens postadas, gostaria muito de revê-lo novamente após muitos anos, você fora meu professor e tenho muita saudade, gostaria que enviasse-me o seu endereço.ʺ Deus te ilumine sempreʺ Pois fazes parte de minha história de vida.
ALICE MARIA
Oi tio.Muito lindo seu cantinho na internet. Tô de olho. Lembro também de algumas coisas lá da Serra, principalmente da venda do vô Rubens. Beijo ,Alice Maria.

WANDA COBO

WANDA COBO

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