sábado, 5 de novembro de 2016

A FOLHA E EU



   Eu ainda subiria a escada da redação mil vezes, sem que a rotina me canse

   Perdi as contas de quantas vezes eu subi as escadas da Folha de Londrina até a redação. Em junho passado, quando voltei ao jornal depois de seis anos de “exílio” entre Campinas e São Paulo, emocionei-me no segundo lance da escada, onde aproveitaram um canto para expor os troféus da Folha. Era o retorno às lembranças, um resgate de experiências sem as quais minha vida não seria a mesma. 
   Cheguei em Londrina no fim dos anos 70 com o objetivo de ser jornalista, antes mesmo de concluir o curso fiz meus primeiros freelas para a Folha, era a foca das focas. Colaborava com a Folha Rural, onde publiquei meus primeiros textos. Nada mais natural, além de ter nascido no Norte do Paraná e ter como pai uma pessoa que adorava plantações, sou irmã de um engenheiro agrônomo, cujo nome é referência na pesquisa agrícola do país. Terra e cultura me levaram a fazer textos sobre agricultura, antes de mergulhar de vez na cultura. 
   Sou “da Folha” desde quando o jornal ainda era do senhor João Milanez, o “patrão” que todos os dias vinha à redação de mesa em mesa, dedicando para cada um de nós uma provocação ou brincadeira. Cheguei à Folha contratada pelo Valmir Milanez, o “Purinho”, para quem fui pedir emprego já no fim dos anos 80. Ele me designou para a Folha da Sexta onde fiquei pouco tempo até chegar à Folha 2, que faz parte da minha história como criatura e criadora, papeis invertidos em muitos momentos nas últimas décadas. Também tive como chefe de redação Walmor Macarini com quem conversava sobre esoterismo, tive oportunidade de conviver com grandes nomes do jornalismo do Paraná, de Bernardo Pellegrini a Nelson Capucho, além do inesquecível Jerê, com quem trocava ideias não só na redação, mas na “sucursal do jornal”, um boteco que frequentávamos cotidianamente na galeria do Centro Comercial. O boteco – uma espécie de corredor rústico que ainda existe – era onde encontravam-se os jornalistas e o pessoal de teatro Enfumaçado e com as mesas lotadas, tinha uma atmosfera de clube de jazz, só faltava mesmo um bom saxofonista. Ele nunca apareceu e nosso jazz continuou imaginário. 
  Quando o senhor José Eduardo Andrade Vieira comprou parte da Folha trouxe junto um desejo de modernidade. O seu Zé nunca me censurou por qualquer notícia ou decisão tomada no âmbito da editoria de Cultura, em nossas conversas nunca deixamos de dizer exatamente o que pensávamos, com a sinceridade que deve permear as relações de trabalho. De suas falas, uma das mais marcantes era a que contemplava a liberdade editorial com um único pedido: “Só não me arranjem processos.” Dizia isso sorrindo como quem sabe, intimamente, que no jornalismo é quase impossível estabelecer um nunca. Até por isso, sua ponderação soava como uma sinalização, não como censura.
   Voltei ao jornal este ano e subi outra vez as escadarias até a redação, a convite de Alessandra Andrade Vieira Mejía e Nicolás Mejía. Encontrei o jornal naquilo que possa chamar de “fase 3” ou na terceira geração de ideias. Reencontrei amigos do tempo em que dava os primeiros passos no jornalismo, como Adriana de Couto, Lucilia Okamura, Claudemir Scalone e o sempre presente Oswaldo Militão, além de amigos novos ou já relativamente conhecidos. Encontro também um jornal formatado para novos desafios. Encontro um momento digital que me permite escrever como faço aqui, no tom de uma conversa, ao mesmo tempo que posso gravar um vídeo que entra nas redes sociais simultaneamente como se estivéssemos todos ali, na mesma sala da Folha. Minhas crônicas agora não “viajam” só no papel, mas desembarcam em telas luminosas com as quais me dou muito bem. A diversidade de meios não deve alterar o que é fundamental: o conteúdo jornalístico. A escola de onde venho ensina que jornalismo sempre será paixão, além de uma trabalheira danada da qual saímos no fim do dia com a sensação de uma estranha leveza. O trabalho criativo é o que confere ao jornalismo a aura que plana sobre a burocracia e o trabalho automático. Nem sempre a pauta é a de nossos sonhos, mas o prêmio é a reportagem estampada no dia seguinte, algumas muito boas, outras nem tanto, mas sempre uma somatória de trabalho e desejo, condição privilegiada de quem parte das ideias mas não escreve apenas com a cabeça, sente também a emoção de deparar-se às vezes com uma escadaria pela qual eu subiria ainda mil vezes, sem que a rotina me canse. Na minha história só faltou mesmo aquele músico de jazz depois de cada expediente. (Crônica da jornalista e escritora CÉLIA MUSILLI, celia.musilli@gmail.com caderno FOLHA 2, página 4, coluna CÉLIA MUSILLI, 5 e 6 de novembro de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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Comentários

Wanda Cobo

"Maravilha meu amigo, continue nos deliciando com suas ideias." W.D Londrina-Pr


Adilson Silva

Olá Professor José Roberto, Parabéns pelas excelentes matérias , muito bom conhecimento para todos. muita paz e fraternidade. Londrina-Pr

Marcos Vitor Piter

Excelentes e Sabias palavras parabéns Professor um Abraço dos Amigos de Arapongas - PR.

João Costa

Meus parabéns por vc e por tudo que pude ler continue levando este conhecimento p/ todos. Forte abraço! João Batista.
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Meu amigo continue contribuindo com a sua sabedoria. Forte abraço... João Batista 31/10/2013
Daiane C M Santos
Parabéns, muito criativo e inteligente!
Zeze Baladelli
Oi meu amigo,entrei seu blog,parabéns querido,voce é um gentleman,um grande amigo e muito inteligente,desejo que Deus te abençoe mais e mais...super beijo...



MARINA SIMÕES

Caro amigo Roberto, muito obrigada por suas sábias e verdadeiras palavras. Como é bom encontrarmos no nosso dia adia pessoas que comungam nossas idéias, nossas críticas, ou mesmo comentário sobre determinados assuntos. Eu procuro escrever e mostrar mensagens de
fé, de esperança, ou mesmo um alento carinhoso para nós que vivemos um mundo tão cruel, egoísta e caótico. Estou tentando escrever um comentário sobre seus textos. Parabéns, eu os tenho como que a "arquitetura" com as palavras. É um estilo totalmente seu, e meu amigo é simplesmente estimulante. Ele nos faz pensar e isto é muito bom. Um grande abraço. Marina.



JOÃO RENATO
Aqui estou eu novamente é impossivel não entrar aqui para vê estas maravilha por vc postada. Forte abraço do seu amigo hoje e sempre...........

ADALGISA
Parabéns! meu amigo querido!!!Adorei seu blog, mensagens lindas e suaves como a tua persoalidade e seu jeito de ser!!!Abraços e beijos.
TIAGO ROBERTO FIGUEIREDO
Parabéns professor José Roberto seu blog está divino..abs !
JAIRO FERNANDES
Olá, Querido Professor José Roberto! Fiquei muito emocionado com suas mensagens postadas, gostaria muito de revê-lo novamente após muitos anos, você fora meu professor e tenho muita saudade, gostaria que enviasse-me o seu endereço.ʺ Deus te ilumine sempreʺ Pois fazes parte de minha história de vida.
ALICE MARIA
Oi tio.Muito lindo seu cantinho na internet. Tô de olho. Lembro também de algumas coisas lá da Serra, principalmente da venda do vô Rubens. Beijo ,Alice Maria.

WANDA COBO

WANDA COBO

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