sábado, 11 de agosto de 2018

REFLEXÃO COM ARROZ E FEIJÃO


   Na mesa do almoço, meu filho pergunta o que é jornalismo. Num primeiro momento, digo que jornalismo é produzir conteúdos a partir dos acontecimentos. Mas também explico que as matérias podem ter viés informativo, opinativo ou mesmo literário, quando produzimos crônicas ou reportagens que “namoram” com aquilo que um dia foi chamado “new jornalismo” e que, ainda hoje, aparece como um conteúdo de valor, em tempo de notícias simultâneas como café expresso.
   Estudante de Artes Visuais, meu filho é minucioso como se desenhasse sempre um retrato com máximo de fidelidade. Às vezes, perco a paciência, mas ele quer comparações e pergunta como é meu dia a dia. Respondo que sempre há fatos novos e que, embora se convencione que o jornalismo seja neutro, acredito que nos posicionamos na forma de abordar um assunto e no tratamento que lhe damos com mais ou menos espaço nas páginas, na escolha de títulos e fotos. Digo que o jornalismo por natureza, ainda é matéria de interação com a sociedade, um diálogo que se estabelece a partir das notícias que ajudam a formar opinião. 
   Ele acha minha resposta rasa. Tem por hábito ir fundo demais nas coisas, de modo que lhe sugeri que estude psicologia ou filosofia, além da arte, mas resolvi devolver a pergunta e quero saber como é sua vivência artística. Ele me diz que a arte é uma interpretação do mundo e uma busca constante da forma que expresse uma ideia ou conteúdo. Diz que uma coisa é aprender Michelangelo, um mestre excepcional da forma, que ele já tentou imitar como exercício. Outra coisa é aprender com Rembrandt, cuja pintura tem claros e escuros, oferecendo texturas diversificadas. Cita ainda as obras dos contemporâneos e sugiro que ele poderia ser um bom professor para ver se lhe aponto um campo mais objetivo de trabalhar com a arte, a partir do entendimento e da explicação do ofício.
   Volto ao jornalismo e digo que coletamos fatos, buscamos e compramos versões, opiniões e colocamos tudo no caldeirão do texto para cozinhar a matéria que, enfim, vai virar notícia divulgada em maior escala. Ele se alegra ao perceber que no caldeirão de fatos colocamos criatividade ao produzir a notícia, que é nossa forma de apresentar o fato, e chama isso de “dar identidade ao texto”. 
   Percebe que, assim como na arte, sempre faremos nossa leitura ou interpretação do mundo a partir da matéria jornalística. Então me pergunta como é fazer poemas? Sugiro que aí o buraco é mais embaixo ou mais em cima. Que a poesia é quando temos uma fresta no céu que se abre sobre nossa cabeça, inspirando uma leitura incomum das coisas, muito mais metafórica. Lembro do dia que ele viu pela janela uma revoada de pássaros e me disse: “Mãe, parece um aquário”. Entendi perfeitamente sua transposição da cena para a água e digo que sua frase me soou poética.. 
   Explico que o jornalismo nem sempre combina com a poesia. Que me dia a dia na redação é absorvente e me rouba o poema, que exige subjetividade, não precisão. Ele pergunta como começa um poema. Apresento um verso que há anos me desafia: “A solidão é um animal antigo” . Ele gosta do verso, mas pergunta o que significa. Digo que foi uma ideia para qual ainda não tendo continuidade, ainda não é poema. Mas esclareço que significa, possivelmente, que a solidão é um dilema humano desde a antiguidade. 
   Repito que, no momento, tenho pouco tempo para pensar em poesia, que o cotidiano do jornalismo é objetivo, mas é através dele que ganho o pão. Como exemplo, mostro que o País vive no momento um dilema político e que um candidato cuja inicial é B, surge como ameaça. Ele sugere que B, para não se concretizar como ameaça, deve ficar “invisível”, ao passo que a imprensa fala dele todos os dias. Concordo que no jornalismo padecemos de um excesso de objetividade e que, subjetivamente, criamos ameaças quando falamos delas, ainda que seja para criticar. Ele alerta que o marqueteiro de Trump mostrou interesse em fazer no Brasil a campanha de B., aquele que “deve permanecer !invisível”. Prometo não dizer o nome do dito cujo em vão . É bem melhor voltar-se para a arte, a poesia e a filosofia do que manter-se no raso da crítica que, sem querer, transformamos em propaganda. (FONTE: Crônica escrita por CÉLIA MUSILLI, celia.musilli@gmail.com caderno FOLHA 2, página 2, coluna CÉLIA MUSILLI, 11 e 12 de agosto de 2018, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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Comentários

Wanda Cobo

"Maravilha meu amigo, continue nos deliciando com suas ideias." W.D Londrina-Pr


Adilson Silva

Olá Professor José Roberto, Parabéns pelas excelentes matérias , muito bom conhecimento para todos. muita paz e fraternidade. Londrina-Pr

Marcos Vitor Piter

Excelentes e Sabias palavras parabéns Professor um Abraço dos Amigos de Arapongas - PR.

João Costa

Meus parabéns por vc e por tudo que pude ler continue levando este conhecimento p/ todos. Forte abraço! João Batista.
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Meu amigo continue contribuindo com a sua sabedoria. Forte abraço... João Batista 31/10/2013
Daiane C M Santos
Parabéns, muito criativo e inteligente!
Zeze Baladelli
Oi meu amigo,entrei seu blog,parabéns querido,voce é um gentleman,um grande amigo e muito inteligente,desejo que Deus te abençoe mais e mais...super beijo...



MARINA SIMÕES

Caro amigo Roberto, muito obrigada por suas sábias e verdadeiras palavras. Como é bom encontrarmos no nosso dia adia pessoas que comungam nossas idéias, nossas críticas, ou mesmo comentário sobre determinados assuntos. Eu procuro escrever e mostrar mensagens de
fé, de esperança, ou mesmo um alento carinhoso para nós que vivemos um mundo tão cruel, egoísta e caótico. Estou tentando escrever um comentário sobre seus textos. Parabéns, eu os tenho como que a "arquitetura" com as palavras. É um estilo totalmente seu, e meu amigo é simplesmente estimulante. Ele nos faz pensar e isto é muito bom. Um grande abraço. Marina.



JOÃO RENATO
Aqui estou eu novamente é impossivel não entrar aqui para vê estas maravilha por vc postada. Forte abraço do seu amigo hoje e sempre...........

ADALGISA
Parabéns! meu amigo querido!!!Adorei seu blog, mensagens lindas e suaves como a tua persoalidade e seu jeito de ser!!!Abraços e beijos.
TIAGO ROBERTO FIGUEIREDO
Parabéns professor José Roberto seu blog está divino..abs !
JAIRO FERNANDES
Olá, Querido Professor José Roberto! Fiquei muito emocionado com suas mensagens postadas, gostaria muito de revê-lo novamente após muitos anos, você fora meu professor e tenho muita saudade, gostaria que enviasse-me o seu endereço.ʺ Deus te ilumine sempreʺ Pois fazes parte de minha história de vida.
ALICE MARIA
Oi tio.Muito lindo seu cantinho na internet. Tô de olho. Lembro também de algumas coisas lá da Serra, principalmente da venda do vô Rubens. Beijo ,Alice Maria.

WANDA COBO

WANDA COBO

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