domingo, 15 de janeiro de 2017

ONDE SE ESCONDEM AS SOMBRINHAS?



   Não tenho dúvidas que os guarda-chuvas sabem mais de esconderijos do que eu
   Gatos, namorados e guarda-chuvas têm o dom de desaparecer magicamente. Minha gata Tatoo de vem em quando some como se entrasse num labirinto oculto no apartamento, depois de muito chamá-la – e a gata fingir que não ouve – ela dá um miadinho breve, informando que está viva, e nem sempre tenho tempo para procurá-la em todos os vãos e armários. O miado é o sinal de fumaça de que preciso na nossa comunicação matinal. 
   De namorados nem preciso falar, quase todas as mulheres tiveram lá seus romances que viraram sorvete, como diria meu velho pai referindo-se àquilo que derrete num piscar de olhos. Imagino que para os homens não seja diferente. 
   Mas das três coisas as que mais desparecem são mesmo os guarda-chuvas. Desde menina imagino um lugar onde todos se reúnem para conversar animadamente sobre os ventos que os fizeram sumir da vista dos donos. Eles devem rir dos antigos donos. 
   Perdi as contas de quantas sombrinhas já tive e perdi. Algumas parece que foram tragadas por alguma entidade sobrenatural ou gente bem viva e muito rápida. Coisa assim como deixar uma sombrinha apoiada no caixa eletrônico de um banco, dar dez passos sem ela até a saída, me lembrar que a esqueci, voltar ao caixa e descobrir que ela não está mais lá. Quem seria o “mão leve” capaz de subtrair um objeto de outra pessoa em tão pouco tempo? Imagino se esquecesse com frequência o dinheiro sacado no caixa como já me aconteceu. Só depois de reclamar no banco descobri, pelas câmeras de segurança, que uma simpática velhinha havia pegado a grana supondo que fosse dela. Uma vovozinha arteira, dessas que a gente nem imagina que possa nos passar para trás. 
   Mas a frequência maior das perdas e danos ocorre mesmo com os guarda-chuvas: As vezes eu mesma dou conta de escondê-los, como nesta semana, em que procurava a gata num lixeira de papeis onde ela costuma ficar e encontrei no seu lugar a sombrinha xadrez que me fez falta na terça-feira, quando o céu escureceu como se viesse a maior tempestade que depois se dissipou me dando alívio, porque havia perdido a sombrinha e saí à rua como um marujo que resolve enfrentar o mar bravio. Mas tudo não passou de um mau humor de verão. 
   Não tenho dúvidas que os guarda-chuvas sabem mais de esconderijos do que eu. Por tudo isso, resolvi morar perto do trabalho de modo que não necessite de sombrinhas para fazer um trajeto curto. Em dias de chuva, protejo-me embaixo das marquises e com trinta passos dobro a esquina e já estou na portaria do jornal. 
   Libertar-me das sombrinhas é uma espécie de vingança contra todas que desaparecem sem deixar rastros: aquela vermelhinha da infância, a de estampa de flores, a prateada que mais parecia um acessório de Star Wars, a verde-musgo que encontrei num canto aqui na Folha depois de anos e, suponho, seja a mesma que usei para zanzar pelo centro no intervalo de alguns almoços. 
   O fato é que, apesar de tudo, gosto de chuvas e sombrinhas, Os dias úmidos vêm para lavar as cidades e as almas, depois tudo fica limpo com a promessa de dias claros nos quais as sombrinhas adormecem em algum armário, até serem de novo despertadas para um abre e fecha que parece um ritual de invocação dos deuses, porque nada dá mais proteção às nossas cabeças do que sombrinhas que recebem a chuva transformando-a em música. 
   No mais, acredito piamente que os guarda-chuvas só não desaparecem quando são usados diariamente pelos sujeitos que nunca saem sem ele. Um amigo, o jornalista Ariel Palacios, nunca ia à faculdade sem um guarda-chuva a tiracolo, coisa de um argentino acostumado também ao clima instável de Curitiba. C om ele aprendi que guarda-chuva só são fieis quando levados em conta cotidianamente, como coisas essenciais, como certos namorados e namoradas que precisam de atenção constante para não corrermos o risco de serem levados pelo vento. Quanto aos gatos, ninguém sabe ao certo o que se passa em suas cabeças. (Crônica escrita por CÉLIA MUSILLI, celia.musilli@gmail.com páginas 2 e 3, coluna CÉLIA MUSILLI, caderno FOLHA 2, 14 E 15 de janeiro de 2017, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comente!

Comente!

.

.

.

.

Comentários

Wanda Cobo

"Maravilha meu amigo, continue nos deliciando com suas ideias." W.D Londrina-Pr


Adilson Silva

Olá Professor José Roberto, Parabéns pelas excelentes matérias , muito bom conhecimento para todos. muita paz e fraternidade. Londrina-Pr

Marcos Vitor Piter

Excelentes e Sabias palavras parabéns Professor um Abraço dos Amigos de Arapongas - PR.

João Costa

Meus parabéns por vc e por tudo que pude ler continue levando este conhecimento p/ todos. Forte abraço! João Batista.
--------
Meu amigo continue contribuindo com a sua sabedoria. Forte abraço... João Batista 31/10/2013
Daiane C M Santos
Parabéns, muito criativo e inteligente!
Zeze Baladelli
Oi meu amigo,entrei seu blog,parabéns querido,voce é um gentleman,um grande amigo e muito inteligente,desejo que Deus te abençoe mais e mais...super beijo...



MARINA SIMÕES

Caro amigo Roberto, muito obrigada por suas sábias e verdadeiras palavras. Como é bom encontrarmos no nosso dia adia pessoas que comungam nossas idéias, nossas críticas, ou mesmo comentário sobre determinados assuntos. Eu procuro escrever e mostrar mensagens de
fé, de esperança, ou mesmo um alento carinhoso para nós que vivemos um mundo tão cruel, egoísta e caótico. Estou tentando escrever um comentário sobre seus textos. Parabéns, eu os tenho como que a "arquitetura" com as palavras. É um estilo totalmente seu, e meu amigo é simplesmente estimulante. Ele nos faz pensar e isto é muito bom. Um grande abraço. Marina.



JOÃO RENATO
Aqui estou eu novamente é impossivel não entrar aqui para vê estas maravilha por vc postada. Forte abraço do seu amigo hoje e sempre...........

ADALGISA
Parabéns! meu amigo querido!!!Adorei seu blog, mensagens lindas e suaves como a tua persoalidade e seu jeito de ser!!!Abraços e beijos.
TIAGO ROBERTO FIGUEIREDO
Parabéns professor José Roberto seu blog está divino..abs !
JAIRO FERNANDES
Olá, Querido Professor José Roberto! Fiquei muito emocionado com suas mensagens postadas, gostaria muito de revê-lo novamente após muitos anos, você fora meu professor e tenho muita saudade, gostaria que enviasse-me o seu endereço.ʺ Deus te ilumine sempreʺ Pois fazes parte de minha história de vida.
ALICE MARIA
Oi tio.Muito lindo seu cantinho na internet. Tô de olho. Lembro também de algumas coisas lá da Serra, principalmente da venda do vô Rubens. Beijo ,Alice Maria.

WANDA COBO

WANDA COBO

Postagens populares