segunda-feira, 16 de março de 2015

A DOR NÃO USA MÁSCARA


   Morte de filho de homossexuais expõe um preconceito secular

   Neste domingo ruidoso de protestos, peço um minuto de silêncio por Peterson Ricardo de Oliveira, 14 anos, morto, ao que consta, depois de ser agredido numa escola da  Grande São Paulo por ser filho de um casal homossexual.
   Peço um minuto de silêncio não só por Peterson, mas por todos os homossexuais agredidos e mortos. Vale também um minuto de silêncio por suas mães,  pais, amigos e namorados.  Vale ainda não só um minuto de silêncio, mas um constrangimento envergonhado, o fato de Peterson ter sido agredido por este motivo e o fato da homofobia não ser ainda criminalizada.
   No momento em que o Brasil se envolve em grandes movimentos populares, penso nos pequenos movimentos que poderiam contribuir para a criação de uma sociedade com base num humanismo em falta.  A violência é um fato cotidiano e dói saber que um garoto de 14  anos sofreu bullying, envolveu-se numa discussão e foi agredido  estupidamente por colegas da mesma idade porque seus pais são gays. Dói saber que, ao voltar para a sala de aula e começar a passar mal depois da agressão, ele ainda pediu que o socorressem porque não queria morrer. Dói saber que ocorreu uma hemorragia interna e que, provavelmente,  a  agressão sofrida foi a causa da hemorragia, uma vez que ele já era portador de um aneurisma.
   Num país onde partidos e governantes dedicam  pouco espaço aos direitos dos homossexuais – desde 2001 a criminalização por homofobia aguarda aprovação pelo Senado – o preconceito mata todos os dias. Um relatório do Grupo Gay da Bahia dá conta que um homossexual é morto no Brasil  a cada 28 horas.  Em 2013, 312 gays, lésbicas e travestis foram mortos no País.  Engana-se  quem acha que as coloridas manifestações que se repetem nas capitais a cada ano bastam para resolver o preconceito introjetado  numa sociedade que ainda rejeita beijos entre duas pessoas do mesmo sexo em novelas.
   Em minhas andanças, tenho visto demonstrações de carinho entre homossexuais nas ruas,  mas eu transito normalmente  pelo sul e o sudeste, e as estatísticas dão conta que os estados mais perigosos para os gays são Roraima, Mato Grosso e Rio Grande do Norte, só para citar os três primeiros, levando-se em conta o número de crimes cometidos.
   Mas a morte de Peterson ,na última semana,  mostra que na Grande São Paulo – considerada  capital cultural do País – ainda acontecem coisas inimagináveis  e que vai longe o dia em que as escolas estarão preparadas para educar para a diversidade de gêneros. A homofobia deveria ser considerada crime o quanto antes, mas no Brasil as políticas que levam em conta o debate em torno de tabus demoram a ser implementadas,  como aconteceu só agora com o feminicídio – crime e violência contra a mulher –  na semana passada sancionado como lei pela presidente Dilma Rousseff. A mesma presidenta, durante a campanha, só se apressou a dizer alguma coisa  consistente sobre c riminalização da homofobia depois do assunto ganhar vulto após ser retirado do programa da então candidata Marina Silva.
   Há uma versão de que Peterson Oliveira foi agredido numa espécie de “corredor da morte”, com adolescentes  formando um círculo para lhe dar socos e pontapés. Seu irmão que estuda na mesma escola diz ter testemunhado o fato. A diretora afirma que não houve agressão dentro da escola, mas apenas “uma pequena discussão em sala de aula”, o que deverá  ser elucidado  numa investigação, já que pequenas discussões não causam a morte de ninguém. Um delegado disse que “nenhuma hipótese está descartada” e chegou a afirmar que o menino sofreu mesmo uma agressão. O fato é que, nestas horas, a batata quente é passada de mão em mão.  Ninguém  quer se responsabilizar por acontecimento tão bruto e, alguns fazem vista grossa a uma situação que expõe todo preconceito de uma sociedade afeita a padrões comportamentais do século 16.
   A base de respeito às diferenças ainda precisa ser construída no momento em que a cultura caminha em direção à luz depois de tanto obscurantismo. O homossexualismo já foi considerado crime em séculos precedentes, em Portugal, em 1533,  eram previstas penas pesadas contra homossexuais em tribunais sob a influência da Inquisição.  A  exemplo de outros países, Portugal e Espanha disseminaram para suas colônias suas leis e preconceitos, uma ferida que sangra te hoje como no caso de Peterson.
   Embora haja registros arqueológicos de práticas homossexuais desde 1.200 A.C., a discriminação perdura  e foi avalizada durante longos períodos nos quais o homossexualismo, depois de deixar de ser crime, passou a ser visto como “doença mental”, o que perdurou até os estudos de Freud que ajudou a reverter o conceito. Mas o que interessa, neste domingo, é chamar a atenção sobre outros movimentos  em nome do humanismo e por valores arejados. No momento em que homossexuais ajudam na construção de uma sociedade mais justa, inclusive acolhendo filhos que ninguém mais quer – por preconceito de raça ou credo – eles também precisam contar com garantias legais que facilitem suas decisões e protejam suas vidas.
   Acima de tudo, resta refletir sobre uma questão ética: cada um tem o direito de ser o que é. Ou  para lembrar Oscar Wilde, poeta e dramaturgo inglês julgado e condenado no século 19 por ser homossexual: “Por detrás do sofrimento,  há sempre sofrimento.  Ao contrário do prazer, a dor não usa máscara”. E dor é o que está sentindo a família de Peterson e outras vítimas dos algozes da diversidade. Não é possível que isso  perdure como uma ferida,  a dor da família  de Peterson diz respeito a todos nós.  ( Texto escrito por CÉLIA MUSILLI , celiamusilli@terra.com.br  extraído da página  4, FOLHA 2, publicação do jornal  FOLHA DE LONDRINA,  domingo, 15 de março de 2015). 

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Comentários

Wanda Cobo

"Maravilha meu amigo, continue nos deliciando com suas ideias." W.D Londrina-Pr


Adilson Silva

Olá Professor José Roberto, Parabéns pelas excelentes matérias , muito bom conhecimento para todos. muita paz e fraternidade. Londrina-Pr

Marcos Vitor Piter

Excelentes e Sabias palavras parabéns Professor um Abraço dos Amigos de Arapongas - PR.

João Costa

Meus parabéns por vc e por tudo que pude ler continue levando este conhecimento p/ todos. Forte abraço! João Batista.
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Meu amigo continue contribuindo com a sua sabedoria. Forte abraço... João Batista 31/10/2013
Daiane C M Santos
Parabéns, muito criativo e inteligente!
Zeze Baladelli
Oi meu amigo,entrei seu blog,parabéns querido,voce é um gentleman,um grande amigo e muito inteligente,desejo que Deus te abençoe mais e mais...super beijo...



MARINA SIMÕES

Caro amigo Roberto, muito obrigada por suas sábias e verdadeiras palavras. Como é bom encontrarmos no nosso dia adia pessoas que comungam nossas idéias, nossas críticas, ou mesmo comentário sobre determinados assuntos. Eu procuro escrever e mostrar mensagens de
fé, de esperança, ou mesmo um alento carinhoso para nós que vivemos um mundo tão cruel, egoísta e caótico. Estou tentando escrever um comentário sobre seus textos. Parabéns, eu os tenho como que a "arquitetura" com as palavras. É um estilo totalmente seu, e meu amigo é simplesmente estimulante. Ele nos faz pensar e isto é muito bom. Um grande abraço. Marina.



JOÃO RENATO
Aqui estou eu novamente é impossivel não entrar aqui para vê estas maravilha por vc postada. Forte abraço do seu amigo hoje e sempre...........

ADALGISA
Parabéns! meu amigo querido!!!Adorei seu blog, mensagens lindas e suaves como a tua persoalidade e seu jeito de ser!!!Abraços e beijos.
TIAGO ROBERTO FIGUEIREDO
Parabéns professor José Roberto seu blog está divino..abs !
JAIRO FERNANDES
Olá, Querido Professor José Roberto! Fiquei muito emocionado com suas mensagens postadas, gostaria muito de revê-lo novamente após muitos anos, você fora meu professor e tenho muita saudade, gostaria que enviasse-me o seu endereço.ʺ Deus te ilumine sempreʺ Pois fazes parte de minha história de vida.
ALICE MARIA
Oi tio.Muito lindo seu cantinho na internet. Tô de olho. Lembro também de algumas coisas lá da Serra, principalmente da venda do vô Rubens. Beijo ,Alice Maria.

WANDA COBO

WANDA COBO

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