Era nos anos 1960, meus pais agricultores, após tempos de duro trabalho e economia finalmente conseguiram comprar um pequeno sítio. Era uma propriedade com um cafezal, um pequeno pasto, e uma casa grande em madeira de peroba-rosa. Mas tudo precisava de cuidados, o cafezal de uma boa poda, adubagem, correção do solo. O pasto bem degradado com muitas ervas daninhas e as cercas em péssimo estado. A casa necessitava de uma boa reforma. Não tinha paiol e a tulha carecia de uma melhoria. Como toda a economia foi dada na compra, não tínhamos nada para iniciar o trabalho que a propriedade exigia.
Certo dia, compareceu em nossa casa o sr. Admilson, que era gerente do Banco do Brasil na cidade. Veio conhecer nossa família e vendo a situação, prontificou-se a fazer um financiamento. Meu pai fez o empréstimo bancário para pagar em três anos. Animado, foi a cidade e comprou o adubo, contratou o Zecão do Trator parar arar o pasto, comprou sementes de colonião para a pastagem e arame farpado para as cercas. Tudo foi ficando muito bonito com o tempo. Naquele primeiro ano a colheita de café não foi muito boa pois a adubagem demoraria a melhorar a lavoura.
No segundo ano, foi uma colheita boa, mas o inesperado aconteceu. Em julho daquele ano uma grande geada que arrasou com a nossa região e a nossa lavoura. Levara alguns anos para a recuperação. O dinheiro da colheita não dava nem para pagar uma parte da dívida no banco. Meu pai então foi ao banco conversar com o sr. Admilson, que aliás constantemente vinha em casa para almoçar e levar frutas. Meu pai voltou arrasado pois o gerente foi muito frio e disse que não tinha jeito, e que meu pai teria que honrar o compromisso, caso contrário o banco tomaria a propriedade. Desesperado, colocou o sítio a venda, o que aconteceria meses depois por um valor muito abaixo do mercado. Saldou a dívida e ficamos quase sem nada.
Mudamos para a fazenda Santa Cecília, onde o fazendeiro, muito rígido, colocou para meu pai as regras. Sem opção fomos trabalhar lá sendo uma verdadeira humilhação para a nossa família. Tínhamos que comprar os mantimentos e roupas na “venda” da fazenda. No final do primeiro ano do contrato, depois de muito trabalho de todos nós, meu pai foi fazer o acerto, e nada sobrou. Pela segunda vez, vi meu pai chorar. Meus irmãos mais velhos resolveram então ir para a cidade para aprender o ofício de mecânico na oficina do compadre Elpídio, padrinho do nosso irmão Álvaro, o que deixou minha mãe triste. Ele iriam para a cidade e enviariam os seus salários para ajudar nas despesas da casa.
Num fim de semana, recebemos a visita de seu Augustinho, padrinho de nosso caçula Mauro. Vendo a nossa situação ele prontamente disse: - Compadre, vocês vão morar no meu outro sítio. No primeiro ano não quero nenhuma renda e a seguir 50% da renda do café e os mantimentos que produzir será todo seu.
Lá fomos de mudança. A casa era bem confortável e a propriedade muito bem cuidada. Em quatro anos que estávamos lá, tivemos uma grande melhora na vida e acima de tudo dignidade. Meus dois irmãos mais velhos já mecânicos, e o Moacir era contínuo no banco. Compramos uma casa na cidade e nos mudamos para lá, onde meu pai comprou um táxi e nossa vida teve uma grande melhora. Porém meu pai nunca esqueceu a agricultura, mesmo com o passar dos anos. (SIDNEY GIROTTO, leitor da FOLHA, página 2, coluna DEDO DE PROSA, FOLH RURAL, 14 e 15 de janeiro de 2017, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).
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