O terrorista monta os explosivos cuidadosamente, triste seria explodirem já e perder a vida sozinho sem virar notícia. Então formiga passa diante de seu pé. Pode matar pisando com a velha bota que calçou para deixar as novas para o irmão menor, mas afinal é o último bichinho que verá antes de cumprir seu destino, então deixa que vá.
Mas ela não vai: volta, e fica daquele jeitinho das formigas esfregando as patinhas e olhando para ele, como a pergunta – e daí? E daí o que, ele retruca, quer morrer? Ela parece querer, porque apenas dá umas voltinhas e volta a encarar a ponta da bota. Ele bate o pé de leve, ela se afasta ligeirinha.
Menino, uma dia se perguntou porque formigas são assim, e passou a ler sobre elas no celular de um tio. Existem há mais de 100 milhões de anos, muuuuito antes dos humanos., únicas a viver em todo o planeta menos nos polos. São tantas que sua população só caberia num número de 16 zeros, formilhões de formigas que, se fossem pesadas, pesariam mais que a humanidade.
Rapazola, apaixonou-se pela vida das formigas, tão organizadas quanto trabalhadeiras. A rainha, a viver apenas para fornecer ovas, fonte de população, as soldadas a guarnecer o formigueiro, s babás a cuidar das larvas, as operárias sempre a buscar comida, com suas antenas a cheirar o mundo. Se uma encontra com outra, tocam antenas e, se uma assim percebe que a outra está faminta, regurgita a lhe dar a comida do próprio corpo.
A rainha não se perpetua no poder como os humanos: envelhecendo, pede para ser substituída. E os machos, que fecundarão a próxima rainha, morrerão logo em seguida, mas deixando o formigueiro com futuro. Formigas, ele aprendeu então, não vivem para si, mas umas para as outras e todas para o formigueiro.
A formiguinha volta com outra, e estacam diante dele: e daí? Ele nem namorada tem ainda, mas algumas moças já lhe sorriem. Fechando os olhos, revê seus sorrisos, seus olhares doces como também a perguntar: e daí?
Se explodir, ganhará a eternidade mas, aqui, não continuará no formigueiro humano através dos filhos. E as duas formigas ali: e daí? Daí ele fica tempão pensando, pensando, até ver que elas se foram para o formigueiro, para a vida. Então retira de si os explosivos, e avisa que ainda não está pronto, talvez nunca esteja. Porque, perguntam. Não sei, responde, sabendo, entretanto, que formigas não matam formigas. (Crônica escrita por Domingos Pellegrini, jornalista e escritor, página 2, FOLHA 2, coluna AOS DOMINGOS PELLEGRINI, 4 e 5 de novembro de 2017, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).
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