No pequeno “largo” da cidade, assim chamado antes de ser praça, aquela hora era muito especial. Ao lado da
Igreja de madeira, uma senhora de vestido de pregas, muito comportado,
geralmente escuro ou cinza, cabelos trançados ou presos, origem italiana,
chegava para tocar o sino.
A Igreja, o sino e a mulher formavam uma paisagem de desenho, ao cair da tarde, quebrando o silêncio preguiçoso com badaladas que eram um convite.
Quase ao mesmo tempo desciam e subiam , das várias ruas, outras pessoas, especialmente mulheres e crianças e se encaminhavam para a pequena igreja.
Era hora do Anjo! E eu gostava disso tudo! Chegava correndo para a oração à qual se seguia a reza do terço. E logo no início ficava meditando, não sobre a oração, mas sobre a parte que dizia: “...e o Verbo se fez carne...” Verbo para mim era o que se decorava na escola...eu canto, tu cantas, ele canta! E como era que virou carne?! Difícil para uma criança entender, mas não impossível para crer.
Dentro da igreja as mulheres se sentavam de um lado e os homens de outro. As casadas usavam véus preto na cabeça e as solteiras brancos. As crianças eram convidadas a ficarem quietas mas eram puro movimento.
Após a oração do Angelus, uma das senhoras, com acentuado sotaque italiano, “puxava” o terço, desfiando as contas do rosário com muito carinho, numa espécie de homenagem à Mãe de Jesus, com a qual as mulheres tanto se identificavam em suas dores e amores pela família e os filhos, num tempo de velada submissão feminina e intensa força interior.
Para mim, os cinco mistérios do terço eram longos... Em vez de acompanhar as contas, iam contando quantas Ave Marias faltavam para acabar. Sabia de cor os cantos marianos que intercalavam a reza e ainda os guardo na memória com saudade.
Terminava o terço e começava a Ladainha. Essa era um encanto à parte. Só não entendia porque as pessoas comparavam “ladainha” com um nome de reclamações. Nenhuma semelhança!
Começava enaltecendo as virtudes de Maria como Mãe Rainha, Virgem e outras qualidades tão cheias de ternura. A mulher de sotaque italiano ia recitando a ladainha e os demais respondendo “rogais” por nós. Embalada pela monotonia das aclamações, eu ia cochilando...
Num determinado momento a voz mudava o tom e exclamava mais alto : A Rainha da Paz! “Rogais” por nós! Eu despertava e sabia que estava terminando, só faltava umas poucas Ave-Marias pelas intenções da comunidade ( que não eram poucas ).
Encantava-me aquele ambiente e gostava de observar principalmente a vida daquelas mulheres piedosas e lutadoras, em tempos difíceis, que sabiam onde encontrar a confiança necessária para enfrentar seus problemas e os dos familiares. Outros tempos, outros contextos, mas uma maneira simples e sempre atual de dar sentido à vida
Ainda hoje, nas manifestações marianas da Igreja católica, volta à lembrança aquela imagem : seis horas da tarde, o sino, o rosário e o canto da ladainha , a devoção dos simples, dos puros e de todos aqueles têm amor e vivem a sua fé. ( Texto escrito por ESTELA MARIA FERREIRA, leitora da FOLHA, extraído do espaço Dedo de Prosa, página 1 da FOLHA RURAL, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA, sábado, 14 de março de 2015).
A Igreja, o sino e a mulher formavam uma paisagem de desenho, ao cair da tarde, quebrando o silêncio preguiçoso com badaladas que eram um convite.
Quase ao mesmo tempo desciam e subiam , das várias ruas, outras pessoas, especialmente mulheres e crianças e se encaminhavam para a pequena igreja.
Era hora do Anjo! E eu gostava disso tudo! Chegava correndo para a oração à qual se seguia a reza do terço. E logo no início ficava meditando, não sobre a oração, mas sobre a parte que dizia: “...e o Verbo se fez carne...” Verbo para mim era o que se decorava na escola...eu canto, tu cantas, ele canta! E como era que virou carne?! Difícil para uma criança entender, mas não impossível para crer.
Dentro da igreja as mulheres se sentavam de um lado e os homens de outro. As casadas usavam véus preto na cabeça e as solteiras brancos. As crianças eram convidadas a ficarem quietas mas eram puro movimento.
Após a oração do Angelus, uma das senhoras, com acentuado sotaque italiano, “puxava” o terço, desfiando as contas do rosário com muito carinho, numa espécie de homenagem à Mãe de Jesus, com a qual as mulheres tanto se identificavam em suas dores e amores pela família e os filhos, num tempo de velada submissão feminina e intensa força interior.
Para mim, os cinco mistérios do terço eram longos... Em vez de acompanhar as contas, iam contando quantas Ave Marias faltavam para acabar. Sabia de cor os cantos marianos que intercalavam a reza e ainda os guardo na memória com saudade.
Terminava o terço e começava a Ladainha. Essa era um encanto à parte. Só não entendia porque as pessoas comparavam “ladainha” com um nome de reclamações. Nenhuma semelhança!
Começava enaltecendo as virtudes de Maria como Mãe Rainha, Virgem e outras qualidades tão cheias de ternura. A mulher de sotaque italiano ia recitando a ladainha e os demais respondendo “rogais” por nós. Embalada pela monotonia das aclamações, eu ia cochilando...
Num determinado momento a voz mudava o tom e exclamava mais alto : A Rainha da Paz! “Rogais” por nós! Eu despertava e sabia que estava terminando, só faltava umas poucas Ave-Marias pelas intenções da comunidade ( que não eram poucas ).
Encantava-me aquele ambiente e gostava de observar principalmente a vida daquelas mulheres piedosas e lutadoras, em tempos difíceis, que sabiam onde encontrar a confiança necessária para enfrentar seus problemas e os dos familiares. Outros tempos, outros contextos, mas uma maneira simples e sempre atual de dar sentido à vida
Ainda hoje, nas manifestações marianas da Igreja católica, volta à lembrança aquela imagem : seis horas da tarde, o sino, o rosário e o canto da ladainha , a devoção dos simples, dos puros e de todos aqueles têm amor e vivem a sua fé. ( Texto escrito por ESTELA MARIA FERREIRA, leitora da FOLHA, extraído do espaço Dedo de Prosa, página 1 da FOLHA RURAL, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA, sábado, 14 de março de 2015).
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