"Falo com muito orgulho de Londrina porque hoje, com meus 44 anos, vivi muita experiência aqui que não vi em lugar nenhum. E já assisti a coisas geniais", diz Daniel Belquer |
Radicado em Nova York, londrinense desenvolve espetáculos artísticos e trabalha com projetos para surdos e tratamento aos sintomas do Parkinson
O nome gravado nos contatos é Daniel Loureiro, mas foi descoberto depois um Daniel Belquer. A conversa seria sobre música, arte, teatro, como de fato foi, porém, o assunto se estendeu muito, além disso. O londrinense radicado em Nova York nos recebeu na casa dos pais, no centro de Londrina, cidade em que cresceu, formou-se em Direito, tocou em diversas bandas, até mudar-se para o Rio de Janeiro e depois para os Estados Unidos, onde hoje trabalha com tecnologia, arte e ciência. Em projetos de música para surdos através da vibração do som e de tratamento para os sintomas de Parkinson,, tornou-se um cientista com o apoio da música. Mas toda essa história começou ainda na infância.
O gosto pelas artes aflorou cedo, quando, aos 3 anos, roubou a cena em um casamento, cantando e tocando o instrumento disponível na igreja. Na adolescência, viver a música foi algo muito maior. Com banda de amigos, ensaiava em casa e foi descoberto como um ótimo instrumentista. Indicado para tocar em outras bandas (porque aquela era muito ruim, como avaliada por um vizinho), começou a ir em bares e festivais. Para isso, pulou algumas vezes o portão de casa. “Era uma época independente, a gente saía sozinho, a gente fechava a Paranaguá aos domingos e tinha uma união de pessoas, skatistas, banda tocando, era muito diferente”, recordou.
Em 1996, colocou o Projeto Delírios em prática, com mentoria do professor Dilson Catarino. A proposta deu tão certo, que, após várias versões, ganhou impulso com a banda Iguaranoise, o levando a tocar na Holanda. “Era uma época que havia a busca pela identidade. Tentativa de achar um específico londrinense. Um projeto de cultura, de Londrina brilhante e eu sempre me esforcei para chegar nisso”, defendeu.
Graduou-se em Direito, pela UEL, curso que acredita ter escolhido por ser o mais próximo das ciências humanas. “Não tinha faculdade de Música na época ainda”, argumentou. Mas nunca seguiu carreira. O curso foi como um acordo com a família, que tinha visão tradicional da vida e da carreira para o filho. Com o diploma, poderia sair da cidade e buscar novos olhares. O destino: Rio de Janeiro.
A esta altura, Loureiro já era mais conhecido como Belquer, poque em terras cariocas descobriu que “já tinha muito Daniel Loureiro por aí”. Envolvido com teatro, música, instalações artísticas, se tornou também excelente em tecnologia voltada para artes. Nesse período, foi convidado para dar aulas na Casa das Artes de Laranjeiras. “Foram oito anos dando aulas com muita liberdade de experimentação”, recordou.
Nesse período, teve uma filha, a ex-mulher conseguiu uma bolsa para estudar em Nova York e o pai os acompanhou para a adaptação, inicialmente por três meses. Lá trabalhou como voluntário aplicando linguagem de computador em artes e começou a ser convidado para fazer novos projetos. Em 2013, passou por Berlim e depois mudou-se definitivamente para Nova York, quando se envolveu com Music not Impossible, projeto que permite a surdos sentirem a música por meio da vibração do som. Entre o turbilhão de ideias, em passagem pelo Rio de Janeiro, conheceu e se apaixonou pela atual esposa, com quem teve o segundo filho, hoje com seis meses de idade.
Belquer já estava bastante avançado com os projetos do aparelho para surdos, quando foi visto por um amigo neurocientista contratado pelo Mount Sinal Hospital. O amigo é chefe do departamento de reabilitação e inovação do hospital e queria testar o mesmo aparelho em pessoas com Parkinson. Após algumas modificações, vieram os testes. “O doutor tinha um paciente que parou de tremer completamente com o equipamento. Um senhor de 87 anos que há cinco não tocava piano ficou emocionado”, contou orgulhoso, mostrando o vídeo no final da entrevista.
Com este projeto ativo ( e todos os outros tocados paralelamente), vive em Nova York, próximo da filha, que agora já tem 9 anos, com a atual esposa e o caçula. O projeto para tratamento dos sintomas de Parkinson cresceu e já possui 200 pacientes – a intenção é ter o aparelho no mercado até o fim de 2018. Com tantos movimentos ao mesmo tempo, Belquer brincou com o fato de ter atingido este campo. “Agora sou cotado como cientista, tenho acesso ao hospital, tenho laboratório exclusivo... O que me atraiu é que uso as mesmas ferramentas que usava na arte”, destacou.
Ao mesmo tempo, recordou-se dos tempos de Londrina, onde tudo começou. “Eu falo com muito orgulho que tive uma infância e adolescência aqui extremamente pujantes com relação a festivais de música, festivais de teatro, movimento de bandas. Tinha o Armazém, Mario Bortolotto,..” citou. Com memória privilegiada, falou de bandas, nomes, pessoas e datas que foram importantes para seu desenvolvimento e também para a cidade. “Era um ambiente que você inspirava ousadia, experimentação”, lembrou. “Eu falo com muito orgulho da cidade porque hoje, com meus 44 anos, eu vivi muita experiência aqui que não vi em lugar nenhum. E eu já assisti a coisas geniais”, afirmou. (FONTE: LAIS TAINE – Reportagem Local, caderno FOLHA GENTE, 25 e 26 de novembro de 2017, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).
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