Estou comendo em um
restaurante, ele surge pedindo desculpas, não quer atrapalhar meu almoço, só
perguntar se lembro dele.
- Claro, você é o Janjão!
Ele sorri feliz, levanto para o abraço.
- Quanto tempo – ele diz com olhos úmidos .
- Meio século .
Diz que lê minhas crônicas, e que sempre lembra do dia em que, no colégio, inventaram de premiar quem tivesse mais irmãos.
- Um rapaz tinha quinze irmãos, uma mocinha tinha catorze, e ele ia ser o premiado, mas você falou não, dêem para ela, que ela precisa mais.
Bem, me lembro tanto disso quanto de minhas fraldas. Quem teria inventado o tal prêmio? A direção do colégio, algum professor, um grupo de alunos? Me contento com o contentamento de Janjão, a novamente me abraçar, repetindo que não queria atrapalhar meu almoço
- Janjão, almoçar eu almoço todo dia. Mas não é todo dia que revejo um colega depois de meio século.
Rimos, e sabemos que ficará por isso. Ele talvez até dê um cartão, dizendo aparece para um café, mas não, ele se vai com a elegância de sempre, o Janjão era elegante – nos gestos, nas atitudes – desde o tempo do colégio, tão distante e tão vivido.
A molecada descia as escadarias correndo, num atropelo que fazia as meninas irem para as beiradas, colando-se nas paredes e praguejando.
Os buços iam virando cinzentas taturanas acima dos lábios, até que um dia sumiam, e a gente sabia que mais um começava a fazer a barba.
O recreio era parra os moleques uma correria, para os rapazes um torneio de olhares, os flertes começando namoros.
E coragem para chegar na menina e dizer oi? O coração pulava tanto que eu ia ver no espelho do sanitário se a camisa não estava palpitando.
Moleques voltando para as salas com os cabelos escorridos de suor, Meninas trocando segredinhos aos cochichos e rindo às gargalhadas.
Moleque passando com ruído de vidro, as bolinhas de gude se batendo nos bolsos.
A professora fazendo a chamada, nome por nome , até o Yoshi, a responder tão baixinho que, todo dia, a gente repetia em coro: - o Yoshi tá ali! – e ele sorria.
Naquele tempo s gente tinha inventado pau de selfie, um espelhinho grudado na ponta duma varetinha de guarda-chuva, para esticar até o piso e ver a calcinha da professora quando ela parava ao lado da próxima carteira.
Na saída, o rei do Quebra-Queixo estava lá na calçada, com seu tabuleiro na traseira da bicicleta e a espátula para tirar as porções e colocar no pedaço de papel, que a gente lambia depois de comer o doce.
Um dia, comi sete espetinhos no Bar da Dona Rosa, o Sérgio Campanelli ficou sabendo, no dia seguinte foi lá e comeu oito.
A gente era risivelmente incrível, tenho de parar por aqui porque não consigo escrever com cisco nos olhos. O cisco da saudade, do espanto (meio século) e da ternura, essa embalagem das boas lembranças. Obrigado, Janjão! ( Texto de DOMINGOS PELLEGRINI, escritor, página 21, espaço DOMINGOS
PELLEGRINI d.pellegrini@sercomtel.com.br
publicação do JORNAL DE LONDRINA, domingo, 14 de junho de 2015). - Claro, você é o Janjão!
Ele sorri feliz, levanto para o abraço.
- Quanto tempo – ele diz com olhos úmidos .
- Meio século .
Diz que lê minhas crônicas, e que sempre lembra do dia em que, no colégio, inventaram de premiar quem tivesse mais irmãos.
- Um rapaz tinha quinze irmãos, uma mocinha tinha catorze, e ele ia ser o premiado, mas você falou não, dêem para ela, que ela precisa mais.
Bem, me lembro tanto disso quanto de minhas fraldas. Quem teria inventado o tal prêmio? A direção do colégio, algum professor, um grupo de alunos? Me contento com o contentamento de Janjão, a novamente me abraçar, repetindo que não queria atrapalhar meu almoço
- Janjão, almoçar eu almoço todo dia. Mas não é todo dia que revejo um colega depois de meio século.
Rimos, e sabemos que ficará por isso. Ele talvez até dê um cartão, dizendo aparece para um café, mas não, ele se vai com a elegância de sempre, o Janjão era elegante – nos gestos, nas atitudes – desde o tempo do colégio, tão distante e tão vivido.
A molecada descia as escadarias correndo, num atropelo que fazia as meninas irem para as beiradas, colando-se nas paredes e praguejando.
Os buços iam virando cinzentas taturanas acima dos lábios, até que um dia sumiam, e a gente sabia que mais um começava a fazer a barba.
O recreio era parra os moleques uma correria, para os rapazes um torneio de olhares, os flertes começando namoros.
E coragem para chegar na menina e dizer oi? O coração pulava tanto que eu ia ver no espelho do sanitário se a camisa não estava palpitando.
Moleques voltando para as salas com os cabelos escorridos de suor, Meninas trocando segredinhos aos cochichos e rindo às gargalhadas.
Moleque passando com ruído de vidro, as bolinhas de gude se batendo nos bolsos.
A professora fazendo a chamada, nome por nome , até o Yoshi, a responder tão baixinho que, todo dia, a gente repetia em coro: - o Yoshi tá ali! – e ele sorria.
Naquele tempo s gente tinha inventado pau de selfie, um espelhinho grudado na ponta duma varetinha de guarda-chuva, para esticar até o piso e ver a calcinha da professora quando ela parava ao lado da próxima carteira.
Na saída, o rei do Quebra-Queixo estava lá na calçada, com seu tabuleiro na traseira da bicicleta e a espátula para tirar as porções e colocar no pedaço de papel, que a gente lambia depois de comer o doce.
Um dia, comi sete espetinhos no Bar da Dona Rosa, o Sérgio Campanelli ficou sabendo, no dia seguinte foi lá e comeu oito.
A gente era risivelmente incrível, tenho de parar por aqui porque não consigo escrever com cisco nos olhos. O cisco da saudade, do espanto (meio século) e da ternura, essa embalagem das boas lembranças. Obrigado, Janjão! ( Texto de DOMINGOS PELLEGRINI, escritor, página 21, espaço DOMINGOS
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