Texto escrito por LUCIANA DO CARMO NEVES, advogada e professora de direito e processo penal da UEL, publicado pelo jornal FOLHA DE LONDRINA, página 2, coluna ESPAÇO ABERTO, 11 de janeiro de 2019
Ao ler o artigo do jornalista Paulo Briguet, Menino veste azul e menina veste rosa (Avenida Paraná, 5/01), fiquei perplexa diante do seu esforço em formar a opinião dos leitores reforçando as ideias retrógradas e preconceituosas, de senso comum entre os que vêm sendo nomeados às cadeiras do atual governo que, como a ministra Damares, demonstram a intenção de aniquilar as minorias e desrespeitar orientações que não sejam héteros. Consta nas entrelinhas da frase, objeto da publicação do jornalista, o entendimento de Damares acerca do comportamento de homens e mulheres, pois anteriormente, ela já expôs que o modelo ideal de uma sociedade é o de que a mulher fique em casa, às voltas com as atividades do lar e dos filhos.
O jornalista afirma que “até uma criança de dois anos entende que a cor rosa simboliza o sexo feminino”, quando sabemos que isto é uma construção cultural.
A título de informação, as mulheres foram conduzidas ao mercado de trabalho durante a primeira Guerra Mundial, quando a maioria dos homens foram convocados para campos de batalha; em especial do Reino Unido, industrializado à época; pois o sustento da prole dependia dos seus ganhos. Ao final da guerra, os homens que sobreviveram, retornaram para seus lares e quiseram que as mulheres reassumissem os seus postos junto a pia e fogões, no entanto, houve resistência, o que gerou uma mudança irreversível no comportamento social. E foi aí que as mulheres deixaram de suar rosa para usarem todas as cores, inclusive, as do suor, da graxa e do sangue. Todos sabem que mais da metade dos lares brasileiros são mantidos por mulheres que, também são responsáveis, sozinhas, pelos filhos abandonados pelos pais, homens héteros. E em muitos lares de convivência marital, ocorrem graves violência contra a mulher.
Quanto aos homossexuais, o Brasil é o país que mais mata LGBTs no mundo. Ambos merecem respeito e proteção do Estado. Falta esclarecimento e estudo, pois ser gay não é opção, é orientação sexual, No entanto, o texto diz: “É triste ter que explicar que o rosa e o azul são símbolos contra a perversa ideologia de gênero”. O Brasil é machista, homofóbico e preconceituoso, mas o meu otimismo sempre sinalizou que as coisas poderiam melhorar, e que o caminho para tais melhorias é a educação, em especial das crianças, e aí me deparo com um jornalista, que teve acesso aos estudos, dizer que é perverso respeitar as diferenças? Mas numa coisa estamos de acordo: “É constrangedor ter que explicar algo tão simples a pessoas instruídas”.
Os nossos governantes almejam que a população seja carente de capacidade de interpretação e de senso crítico, e dificulta o acesso à educação com atitudes de viés autoritário e de arbitrário, a fim de conduzir a população para o seu modelo alucinante de família ideal, chutando todas as diferenças e minorias, que o seu preconceito e falta de discernimento não aceitam, para debaixo do tapete; assim, o mundinho cor de rosa e azul poderá ser encenado com todos dançando conforme a música orquestrada pela batuta da mediocridade.
O respeito é a base de todas as relações, o direito de cada um termina quando começa o do outro, e isto não é uma figura de linguagem, é lei constitucional (art. 3º CF). e que cumpre com o determinado pela Conenção Americana de Direitos Humanos, da qual o Brasil faz parte, que determina o respeito aos direitos e liberdade e a garantia do seu exercício sem discriminação alguma, por motivo de raça, cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição social.
“É preciso erguer o povo à altura da cultura e não rebaixar a cultura ao nível do povo”. (Simone de Beauvoir). FONTE: Crônica escrita por LUCIANA DO CARMOS NEVES, advogada e professora de direito e processo penal, página 2, coluna ESPAÇO ABERTO, sexta-feira, 11 de janeiro de 2019, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA. * Os artigos devem conter os dados do autor e ter no máximo 3.800 caracteres e no mínimo 1.500 caracteres. Os artigos publicados não refletem necessariamente a opinião do jornal E-mail: opinião@folhadelondrina.combr).
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