domingo, 4 de fevereiro de 2018

CRÔNICA DAS COISAS PERDIDAS.


   Pedem-me uma “entrevista personalizada”. A ideia é selecionar itens que façam parte da minha história e sobre as quais eu posso falar mostrando porque são importantes. Ao todo, me dão a chance de escolher nove objetos afetivos. Desde que me chamaram para o jogo, já percorri mentalmente minha trajetória e meu pensamento foi parar nos pratos do antigo jogo de jantar da minha mãe. A maioria das peças está amarelada, mas uso as clarinhas em dias de festa. Ants de irem à mesa sempre lavo cada uma lembrando-me das mãos dela sob a água da torneira, com a eterna aliança de casada. Dos meus dedos escorrem também água e sabão, mas já usei tantos anéis quantos os anos de liberdade e penso que eles são acessórios importantes de algumas fases da vida em que lavei e enxuguei dúvidas, além das certezas. 
   O anel de elefante era uma espécie de talismã que um dia perdi lavando a louça quando o deixei sob o parapeito da janela da cozinha. Então o elefante voou, talvez tenha feito uma viagem à Índia, talvez tenha simplesmente escorregado para uma lixeira levando consigo uma partícula das minhas manias ou dos apegos que me levam a acreditar na sorte. A verdade nunca saberei, esse é o mistério dos objetos perdidos, ninguém sabe para onde vão. No seu silêncio de coisas inanimadas não fazem não fazem barulhos como animais e pessoas, não emitem sons nem pedido de socorro, quando muito dão um pequeno sinal quando caem ao chão. 
   Entre os objetos perdidos, aqueles que não farão parte da “entrevista personalizada”, tem ainda um relógio de meu pai, perdido numa mudança quando a falta de experiência deixou-me descuidar de algumas coisas que deveriam ir para uma caixinha fechada e guardada comigo, não nos embrulhos, nas caixas de papelão, nas gavetas que todos reviram. O relógio ainda deve funcionar e penso que essa sobrevida, longe dos meus olhos, tem o sentido de mostrar que algumas coisas existem mesmo sem nós. E elas existem com outros significados, dados por quem encontrou o relógio e se alegrou em achá-lo mesmo sabendo que faz parte de outra história. Uma das coisas que me doem foi ter perdido toda minha coleção de discos de vinil. Eram parte da minha festa particular desde a adolescência, quando a música tomava conta do meu quarto. Dos Beatles a Led Zeppelin, de Bob Dylan a Laurie Anderson, passando por clássicos como a “Fantasia” de Stravinsky e “As Quatro Estações” de Vivaldi, tudo me remete a momentos de solidão consentida, quando me trancava para ouvir o que quisesse, ou momentos de alegria compartilhada quando ouvia com os amigos as mesmas músicas como se fosse a primeira vez. Saudade mesmo tenho dos blues de B. B. King, aquele seu “Live In Cook County Jail”, gravado numa prisão em 1971, quando ele conseguiu “libertar” os detentos enquanto durou o show. Também sinto um aperto ao lembrar da malemolência de um vinil rodando com a poesia de Caetano Veloso. 
   Muitos dos objetos que fazem a minha história tomaram rumos imagináveis e disso deriva sua importância como memória. Posso dizer que aquilo que fica com a gente não é menos importante do que aquilo que se foi. E isso vale para anéis, discos, livros, casas e também pessoas. A história nem sempre é o que fica, mas o que se coloca longe do nosso alcance, perdendo a materialidade e fixando-se como lembrança que nenhuma perda apaga. Talvez, numa “entrevista personalizada” possa constar não só aquilo que se tem, mas o que se perdeu e ainda existe como a teimosia das coisas importantes. (FONTE: Crônica escrita pela jornalista e escritora CÉLIA MUSILLI celia.musilli@gmail.com página 2, caderno FOLHA 2,lacuna CÉLIA MUSILLI, 3 e 4 de fevereiro de 2018, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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Comentários

Wanda Cobo

"Maravilha meu amigo, continue nos deliciando com suas ideias." W.D Londrina-Pr


Adilson Silva

Olá Professor José Roberto, Parabéns pelas excelentes matérias , muito bom conhecimento para todos. muita paz e fraternidade. Londrina-Pr

Marcos Vitor Piter

Excelentes e Sabias palavras parabéns Professor um Abraço dos Amigos de Arapongas - PR.

João Costa

Meus parabéns por vc e por tudo que pude ler continue levando este conhecimento p/ todos. Forte abraço! João Batista.
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Meu amigo continue contribuindo com a sua sabedoria. Forte abraço... João Batista 31/10/2013
Daiane C M Santos
Parabéns, muito criativo e inteligente!
Zeze Baladelli
Oi meu amigo,entrei seu blog,parabéns querido,voce é um gentleman,um grande amigo e muito inteligente,desejo que Deus te abençoe mais e mais...super beijo...



MARINA SIMÕES

Caro amigo Roberto, muito obrigada por suas sábias e verdadeiras palavras. Como é bom encontrarmos no nosso dia adia pessoas que comungam nossas idéias, nossas críticas, ou mesmo comentário sobre determinados assuntos. Eu procuro escrever e mostrar mensagens de
fé, de esperança, ou mesmo um alento carinhoso para nós que vivemos um mundo tão cruel, egoísta e caótico. Estou tentando escrever um comentário sobre seus textos. Parabéns, eu os tenho como que a "arquitetura" com as palavras. É um estilo totalmente seu, e meu amigo é simplesmente estimulante. Ele nos faz pensar e isto é muito bom. Um grande abraço. Marina.



JOÃO RENATO
Aqui estou eu novamente é impossivel não entrar aqui para vê estas maravilha por vc postada. Forte abraço do seu amigo hoje e sempre...........

ADALGISA
Parabéns! meu amigo querido!!!Adorei seu blog, mensagens lindas e suaves como a tua persoalidade e seu jeito de ser!!!Abraços e beijos.
TIAGO ROBERTO FIGUEIREDO
Parabéns professor José Roberto seu blog está divino..abs !
JAIRO FERNANDES
Olá, Querido Professor José Roberto! Fiquei muito emocionado com suas mensagens postadas, gostaria muito de revê-lo novamente após muitos anos, você fora meu professor e tenho muita saudade, gostaria que enviasse-me o seu endereço.ʺ Deus te ilumine sempreʺ Pois fazes parte de minha história de vida.
ALICE MARIA
Oi tio.Muito lindo seu cantinho na internet. Tô de olho. Lembro também de algumas coisas lá da Serra, principalmente da venda do vô Rubens. Beijo ,Alice Maria.

WANDA COBO

WANDA COBO

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