Quando foi a última vez que você começou algo do zero? Quantos estilos de músicas diferente você escuta? Por quais gêneros literários você já se aventurou?
Para professores de cursos voltados para a criatividade e pesquisadores do tema, ações como essas são o ponto de partida para “abrir a cabeça” e ter ideias novas.
“Quanto mais coisas eu faço, maior é o repertório e a biblioteca que eu tenho para consultar quando preciso resolver algum problema com uma solução diferente”, afirma Felipe Anghinomi, publicitário e um dos fundadores da escola Peretroiska de atividades criativas.
O local oferece aulas para quem quer soltar a imaginação. A metodologia privilegia a prática e a informalidade para tornar o ambiente propício à inovação, com atividades de pintura, ilustração, teatro e música.
Os cursos duram de uma semana a três meses e custam de R$ 700 a R$ 4.500.
Para Fernando Suzuki, publicitário e co-fundador da escolar internacional de negócios MBI (Master of Business Innovation), que tem cursos focados em inovação, a criatividade se manifesta por meio da capacidade de relacionar informações desconectadas e encontrar um sentido para a conexão.
“Para criar relações novas é preciso ter uma boa percepção e enxergar o que ninguém havia visto”. Afirma.
Começar uma atividade diferente pode ser um bom impulso, segundo o neurocientista Fabrício Pamplona, pesquisador do Instituto D’Or.
“Experimente um curso completamente novo ou uma viagem a um país estrangeiro do qual você pouco sabe. Coloque-se mais na posição de aprendiz”, recomenda.
Para ele, a criatividade vem com muita prática e insistência. “Primeiro é preciso esgotar todas as possibilidades mais óbvias para só então chegarem as ideias originais”, diz Pamplona.
Ainda de acordo com o neurocientista, um local de trabalho onde os funcionário têm mais autonomia e existem espaços de socialização é mais propício para o surgimento de novas ideias.
“Levante, saia de seu lugar, faça mais pausas, faça perguntas, mantenha a mente livre, quebre a rotina. Esteja aberto à exploração, mas se permita explorar sem julgamento”, afirma.
Segundo ele, a leitura tem um papel particularmente especial no desenvolvimento de novas ideias. “O livro estimula as ideias originais, porque o leitor vira o autor da história enquanto gera imagens só suas”, explica.
EM AÇÃO
Ser criativo é uma demanda crescente em empresas de diferentes segmentos. A lista de companhias mais inovadoras de 2016, divulgada pela revista americana “Fast Company”, de inovação e tecnologia, incluiu diversos nomes de fora do mundo digital, como restaurante e até uma rede de farmácias.
A educação no formato atual, no entanto, falha em fornecer as ferramentas necessárias para a inovação, dizem os especialistas.
Para Maurício Tortosa, diretor da Ebac (Escola Britânica de Artes Criativas), a formação de um profissional criativo deve ir além do pensamento crítico. É preciso também conhecer questões burocráticas dos negócios para colocar ideias em ação.
Foi baseada nesse princípio que a Ebac incluiu a disciplina de empreendedorismo criativo em todos os cursos que oferece.
“Empreender também é um ato criativo”, afirma Bob Wollheim, professor da disciplina. “O objetivo é mostrar as competências que o aluno precisa e, assim, ampliar seu repertório”, completa.
‘DEVEMOS VALORIZAR MAIS O TEMPO DE REFLEXÃO’, DI Z O PROFESSOR DA SCHOOL OF LIFE
Dar uma pausa no trabalho para refletir é tão importante quanto produzir, defende David Baker, jornalista, co-fundador da revista “Wired”, sobre tecnologia e inovação. Hoje, ele atua como coach profissional e professor de cursos sobre criatividade e trabalho da School of Lifedo Reino Unido e do Brasil. Por e-mail, Baker conversou com a Folha sobre o assunto.
Folha – Qual o papel da criatividade no dia a dia?
David Baker – Pensamos que criatividade é só para artistas ou músicos, mas ser criativo é simplesmente pensar em um jeito diferente de fazer algo e testar para ver o que acontece. Fazemos isso quando experimentamos uma receita nova ou pensamos em um programa diferente para o fim de semana. Exercitar a criatividade nos conecta com o mundo.
Quais as melhores formas de estimular a criatividade?
Algumas boas ideias vêm em momentos inesperados. Uma boa dica é anotar pensamentos que surgem durante o dia. Também é bom deixar a cabeça livre, fazendo pausas para caminhadas o colocando o pensamento em coisas diferentes do trabalho às vezes.
O que empresas podem fazer para estimular a inovação?
Funcionário e chefes precisam entender que as melhores ideias aparecem quando estamos relaxados. Devemos valorizar o tempo para reflexão assim como valorizamos os momentos nos quais produzimos. Uma boa forma de estimular a reflexão é dividir as reuniões em dois dias, assim todos têm tempo para pensar e podem trazer novas ideias no segundo dia. (ELB).
CURIOSIDADE SERVE DE COMBUSTÍVEL PARA CABEÇA FÉRTIL
Profissionais que trabalham com criação em áreas como artes visuais e música consideram a curiosidade, o constante aprendizado e o contato com diferentes áreas os principais combustíveis para manter a cabeça fértil.
Daniel Malfa, 39, artista visual e fotógrafo que mora em São Caetano (Grande São Paulo), conta que passou por cursos como biologia e engenharia química antes de fazer graduação em fotografia.
“Gosto de estudar e, quando faço pesquisa para um novo trabalho, incluo o conhecimento de todas as área pelas quais já passei. Até estudar matemática faz parte do meu processo criativo”, diz.
Ele cria cenários, fotografa-os e usa técnicas especiais para revelar a imagem. Segundo ele, sonhos o ajudam a fazer as montagens.
“Fotografo todos os dias experimentando diversos filmes, lentes e câmeras. Vou construindo um arquivo com as informações técnicas. Assim, quando aparecer uma ideia, vou saber qual a melhor forma de executar”, diz.
O compositor de música de orquestra Alexandre Travassos, 46, se formou clarinetista, mas, diz, aprendeu composição por conta própria.
“ O que um compositor coloca na partitura são fragmentos e notas de tudo que ela já ouviu na vida”, afirma Travassos, que já teve suas obras tocadas Experimental de Repertório, ligada à Fundação Theatro Municipal de São Paulo
“Quando escrevo, estou mobilizando todas as minhas referências”, afirma. Segundo ele, as inspirações têm diversas fontes: “Pode ser uma música folclórica que ouvi em um outro país ou uma cor que associo a algum som e tento converter em melodia.”
A leitura também é muito importante nesse processo. “A música é uma narrativa em outra língua”, diz. (ELB) ( EVERTON LOPES BATISTA – DE SÃO PAULO, caderno SOBRE TUDO, página D5, SOBRE CARREIRAS, domingo 25 de dezembro de 2016, publicação do jornal FOLHA DE S.PAULO).
Nenhum comentário:
Postar um comentário