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quinta-feira, 6 de abril de 2017

A ESCOLA E OS PROJETOS DE LEI NA CÂMARA DE LONDRINA


   Estão em tramitação na Câmara Municipal de Londrina dois projetos de lei (PLs) que, se aprovados terão repercussão sobre a escola e o trabalho dos professores. O PL 145/2013 visa instituir o Dia do Nascituro (8 de outubro). As comemorações envolveriam palestras nas escolas com base na posição pró-vida, que defenda a vida do feto, mormente assumida pelas religiões e cujos adeptos são contra o direito de escolha da mulher, muitas vezes, incluindo situações como o estupro e a anencefalia.
   O Ministério Público e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) manifestaram-se contra, por considerarem esse PL inconstitucional. É ilógico defender o nascituro (feto) num país com 7,7 milhões de milhões de crianças sem creche. O tema pode e deve, sim, ser discutido nas escolas, mas sem doutrinação, mostrando aos alunos a posição de várias religiões e a posição pró-escolha, que defende o direito de escolha e decisão da mulher e pauta-se nos direitos reprodutivos e no aborto como questão de saúde pública. É uma oportunidade para se conversar com os alunos sobre a responsabilidade na prevenção da gravidez, que deve ser de ambos os sexos. 
   O segundo projeto o PL 98/2016, que já passou por uma aprovação na Câmara e está temporariamente suspenso, apresenta impedimentos para que a educação sexual aconteça nas escolas, impõe multas e restrições aos professores, como por exemplo mostrar aos pais o livro didático que será utilizado, com vistas a obter a aprovação deles. Professores têm a capacidade para desenvolver o trabalho com seriedade e consideração pelos valores morais, que também são da família.
   Livros didáticos sérios e livros de educação sexual contém ilustrações didáticas e não pornografias. Mostrar para a criança e adolescente, num desses livros, a imagem dos órgãos sexuais (o que o PL proíbe) faz parte do processo de ajudá-los a ver o corpo e a sexualidade com naturalidade, sem tabus e sem bloqueios emocionais. A escola consciente não vai interferir dizendo o que é certo ou errado em termos de normas, regras, para a vivência sexual, mas precisa ensinar as normas de segurança para a saúde sexual e ajudar garotas e garotos a pensar e conhecer para decidir com liberdade e responsabilidade sobre sua vida sexual, no tempo certo. 
   Se as pessoas estão preocupadas com o nascituro, é preciso investir em educação sexual na escola, para diminuir o alto número de gravidez não planejadas e as mortes de mulheres por aborto inseguro. A criança que conhece o que é sexo está mais preparada para não ser vítima de abuso sexual. Falar sobre sexo faz com que as crianças compreendam que é coisa de adulto, que exige responsabilidade e seriedade, e, como mostram os estudos, essas iniciam-se sexualmente mais tarde do que as que não têm quem converse com elas. A família pode e deve trabalhar com seus filhos o assunto, expondo seus posicionamentos e, se a relação pais e filhos é calcada no amor e respeito e na capacidade de ouvir, de dialogar, ela não tem o que temer. Mas a escola não pode omitir-se de sua responsabilidade de ajudar os jovens a pensar, com criticidade, o mundo, as relações sociais, afetivas e sexuais. 
   O abuso sexual de crianças e adolescentes, que cresce dia após dia, o aumento assustador de violência sexual e das Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST), com destaque para sífilis e aids, e o alto número de casos de gravidez na adolescência requerem que família e escola unam suas forças, ao invés de rivalizarem. Senhores legisladores e religiosos, não fragilizem a interação família-escola, pois ela é muito importante para o êxito da educação das crianças e dos jovens. Deixem os professores trabalhar com autonomia; grande parte deles sabe o que faz e por que faz. (MARLY NEIDE DAMICO FIGUEIRÓ, doutora em Educação e psicóloga em Cambé, página 2, coluna ESPAÇO ABERTO, quarta-feira, 5 de abril de 2017, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).   

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