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domingo, 11 de setembro de 2016

CARTA A UM AMIGO ATEU


   Querido amigo,
   Não sei se já lhe disse, mas meu pai era ateu. Ao menos agnóstico. Acredito, porém, que ele esteja no Céu, ao lado de Jesus e Maria. E acho que daqui a muitos anos – está provado cientificamente que moradores da Vila Casoni são longevos – você estará Lá também. Digo isso porque sei que você é um homem bom, um pai exemplar, um marido amoroso, um amigo leal, além de um baita profissional. 
   Vou lhe confessar uma coisa: uma das minhas vaidades é saber que você está entre meus leitores. Você não imagina como isso me estimula a escrever mais, e melhor. Só o fato de você fazer um comentário na minha página já me enche de arrogância pecaminosa. Tá bom, tá bom, eu sei que você não acredita em pecado. Deixemos só a arrogância. 
   Confesso que sou um admirador de sua história de vida. Cara, aquela entrevista que você deu na televisão me arrepia até hoje. É uma obra-prima que harmoniza duas noções aparentemente contraditórias: o sofrimento e o humor. Me fez lembrar o livro de Jó, que considero um dos mais belos poemas de todos os tempos. 
   Por todos esses motivos, devo dizer que você faz parte do meu Clube de Ateus Queridos. Deixe-me explicar: é um clubinho imaginário onde ponho todos aqueles amigos que não acreditam em Deus mas são excelentes pessoas, melhores que a maioria dos carolas, você, Samuel Beckett, Emil Cioran, Wallace Stevens, João Cabral, Paulo Francis, Dr. João Tavares, José Pires (o jotinha), meu amigo Luis Emilio (que chamamos de Zé Puliça) e tantos outros. Lá, no meio deles, eu gosto de imaginar oo meu pai, divertindo-se a valer com as tiradas dos sócios. Tenho certeza de que a misericórdia de Deus os salvou. Quer dizer, o João, o Jotinha e o Zé Puliça ainda nã0 morreram: Deus os proteja. 
   Quando penso em você e em todos eles, quando rezo por você e por todos eles, lembro-me de um conto do João Ubaldo: “O santo que não acreditava em Deus”. Já leu? É um primor! Uma das coisas mais engraçadas da literatura brasileira. Sinceramente, penso em você na pele daquele pescador incrédulo que Deus vem conhecer pessoalmente.
   Por último, meu caro, que não passou despercebido o seu respeitoso silêncio durante todos esses anos, em que publiquei toneladas de material carola nas minhas crônicas, poemas e vídeos. 
   Quero que você saiba que eu assino embaixo de muitas de suas críticas à religião e aos religiosos. O que tem de padre e pastor picareta não é brincadeira (e uma enormidade de fieis também). Considero a igreja como um grande hospital, uma grande Cracolândia, lá o que você mais encontra é gente doente.
   Antes de me despedir, quero dizer que você e sua família estão em minhas orações. Se você não acredita na existência de um Ouvinte para esses preces, que elas se dirijam a você na forma de energia positiva, paz e inspiração. 
   Um o abraço de Paulo Birguet, esse cara que nunca vai brigar com você. (Crônica de PAULO BRIGUET, jornalista e escritor. Fale com o colunista: avenidaparana@folhadelondrina.com.br página 6, FOLHA GERAL, 10 E 11 de setembro de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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