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quinta-feira, 26 de maio de 2016

UM VIRA-LATA AO SOL


   Diz a lenda que Alexandre Magno foi levado à presença de Diógenes de Sinope, o filósofo que viva nas ruas de Atenas e dormia dentro de um barril. O rei conquistador teria dito com altivez: 
   - Pede-me o que quiseres.
   Como a sombra de Alexandre havia interrompido o seu banho de sol, Diógenes apenas fez um gesto de impaciência e respondeu:
   - Não me tires o que não me podes dar!
   Conta-se ainda que os oficiais caçoaram do filósofo mendigo na presença de Alexandre, mas o rei os calou dizendo: 
   - Se eu não fosse Alexandre , queria ser Diógenes. 
   Lembrei-me dessa história quando vi meu cachorrinho Cisco tomando seu banho de sol na sala, indiferente aos acontecimentos políticos do país. Como se vê pela foto que ilustra a coluna de hoje, Cisco não tem nenhum Alexandre Magno por perto para lhe fazer sombra. Às vezes eu gostaria de ser tão alienado e feliz como um vira-lata.
   Em Atenas, Diógenes era conhecido como O Cão, até porque estava sempre rodeado de cachorros. Daí nasceu o nome de sua escola filosófica, o cinismo ( que deriva de kynós = cão). Hoje em dia a palavra “cinismo” tem outro sentido, bastante pejorativo. Mas, considerando que Diógenes era avesso a qualquer forma de poder, é impróprio chamar de cínicos esses caras que destruíram o nosso país. Eles são só bandidos. 
   Deixei meu cãozinho tomando sol e fui até a esquina comprar um litro de leite. Ali encontro o Padre Aristides. Ele me perguntou como andava o Cisco. Em seguida emendou:
   - E a trave, Paulo?
   Você se sente um católico um pouquinho melhor quando começa a entender as piadas dos padres. Essa eu entendi: Padre Aristides se referia à passagem em que Jesus diz: “ Hipócrita! Tira primeiro a trave do teu olho, e então poderás ver com clareza para tirar o cisco do olho do teu irmão” ( Mt 7,5).
   Um cristão deve sempre retornar a essa mensagem. Seremos julgados pelos mesmos critérios que utilizamos para julgar os outros. Ao mesmo tempo em que temos a obrigação de combater o mal em todas as suas formas, é indispensável fazer, todos os dias, um rigoroso exame de consciência para reconhecer e eliminar o mal que existe dentro de nós. Do contrário, estaremos sendo hipócritas. 
   Até os 30 anos de idade, quando militava na esquerda, eu adorava apontar os ciscos nos olhos dos outros, enquanto a trave da mentira continuava ferindo e cegando os meus próprios olhos. Ainda sou um homem imperfeito e cheio de falhas, um pecador miserável; tenho muitos ciscos em meus olhos, mas eliminei a trave. E por isso não quero deixar que as traves dos antigos erros continuem a ferir e cegar as pessoas. 
   Uma das coisas que precisamos resgatar no Brasil é o óbvio. Urge voltar àquelas verdades que saltam aos olhos, mas durante treze anos tornaram-se proibidas nos círculos oficiais. São verdades evidentes como a luz do sol, e que agora começam a ser ditas, para desespero dos mentirosos. Quando finalmente essas verdades triunfarem em nossa vida pública, eu quero me tornar um ser tão alienado feliz quanto Cisco. ( Coluna AVENIDA PARANÁ, página 3, caderno FOLHA CIDADES, espaço AVENIDA PARANÁ – por Paulo Briguet. Fale com o colunista: avenidaparana@folhadelondrina.com.br quinta-feira, 26 de maio de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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