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segunda-feira, 4 de abril de 2016

APRENDER COM OS OUTROS É SINAL DE INTELIGÊNCIA


   No dia 21 de março, num jornal de grande circulação nacional, li uma reportagem que me assustou: “Projeto que limita gasto vai prever demissão voluntária de servidor”. Ele fala sobre um projeto do governo federal que tem por objetivo limitar os gastos públicos a fim de equilibrar as contas da União. É louvável que o governo faça sua tarefa e ajuste suas contas; o problema é “como” ele quer fazer isto. A primeira opção é suspender o aumento salarial dos servidores, restringir a ampliação do quadro de pessoal e diminuir gastos discricionários. A segunda opção, corte nos salários dos servidores públicos em 30%. 
   Como professor, sempre indiquei aos meus alunos que devemos aprender com os erros dos outros, analisando as ações e os resultados e assim diminuindo as possibilidades de fracasso. 
   Entre o fim do ano de 2015 e início de 2016, passei quarenta dias estudando em uma grande universidade do interior de Portugal, como bolsista do Programa Ibero-Americano Santander para Professores Pesquisadores. Minha área de pesquisa são as Teorias Organizacionais; busco por meio das relações de trabalho entender o papel do ser humano, suas motivações e o seu desenvolvimento através das tarefas que executa no dia a dia. Estive em Portugal para entender as “medidas de austeridade” aplicadas no país e as reações dos trabalhadores, ou seja, dos servidores públicos portugueses. 
   Essas medidas que o governo português impôs à sua população também tiveram o objetivo de “ajustar contas diante da crise econômica que assolou a Europa, somada aos devaneios dos governos anteriores com o oferecimento desmedido de créditos, história muito parecida com a nossa nesses últimos anos. 
   O que constatei foi um cenário amargo. Não tendo outro caminho, indo em direção à saída mais fácil, o governo seguiu os conselhos do Banco Central Europeu e fez o impensável: cortou em aproximadamente 20% os salários dos servidores públicos daquele país. Minhas pesquisa foi orientada para descobrir as consequências dessa decisão na vida dos trabalhadores. 
   Muitos apontaram que o governo “rasgou” a constituição e a legislação trabalhista, onde se assegura a não redução do vencimento dos trabalhadores (como também acontece no Brasil). Mas a nefasta estratégia utilizada não foi a redução de salários e sim a criação e o aumento de impostos para esses salários. 
   Entrevistei alguns funcionários públicos da área de Educação e o que vi foram pessoas desmotivadas. Muitos dos bons funcionários saíram, foram trabalhar em outros países, como a Alemanha e a Holanda. O desânimo é geral. Essa medida de austeridade baseada no corte salarial envenenou o sistema de educação, desmoralizou o trabalhador, piorou o atendimento à população e diminuiu a motivação.
   Também é preciso apontar que essa estratégia afetou de maneira significativa a economia, reduzindo o poder de compra desses trabalhadores.  Vi professores que tiveram que reduzir a utilização do aquecimento em suas residências , funcionários públicos que tiveram que vender suas casas, pessoas que tiveram seus bens comprometidos com dívidas agora impagáveis pela situação atual do país. O que medi e evidenciei por meio de minha pesquisa foram o sentimento de frustração, impotência, indignação e raiva desses servidores. Um dos professores que entrevistei talvez tenha resumido em uma frase toda a situação: “O povo português está triste, desanimado. Os bons estão saindo e não podemos fazer nada... nada! O que será de nós? Me preocupo com o dia de amanhã”.
   E aqui no Brasil? Parece que o movimento da economia está indo para o mesmo lado. Espero que os responsáveis por essas decisões estudem, analisem e aprendam com os erros de quem já fez. Cortar salário, ou aumentar os impostos do funcionalismo público, não ajuda ninguém a sair da crise. Esse tipo de estratégia afunda ainda mais a moral dos que trabalham e produzem, retira o dinheiro da economia e diminui o consumo. Aprender com o erro dos outros não é uma vergonha...é sinal de inteligência. ( HENRIQUE GAMBARO VIEIRA, professor e coordenador dos cursos de Tecnologia em Logística, Gestão de Recursos Humanos e Gestão Comercial da Universidade Norte do Paraná (Unopar) em Londrina, página 2, ESPAÇO ABERTO, domingo 3 de abril de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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