Páginas

sábado, 12 de março de 2016

SOBRE LULA TER RAZÃO


   Você pode detestar a pessoa do Lula, no entanto, é obrigado a dar mão à palmatória: não existe na história deste país um homem que sabe valer-se da retórica e da oratória para fins próprios como ele. Você pode sentir verdadeira ojeriza pelo velho barbudo mas é inegável que o sujeito entende exatamente como brincar com as palavras e suas significações a seu bel-prazer.
   Prova das virtudes acima elencadas do ex-presidente foi o mesmo dizer, após prestar depoimento à Lava Jato, a seguinte frase: “A partir de agora, se me prenderem, eu viro herói. Se me matarem, viro mártir. E, se me deixarem solto, viro presidente de novo!”. Tal afirmação gerou blasfêmias e louvores de uma nação dicotômica: (Isso até me faz lembrar um ex-prefeito londrinense, que após sua prisão, fortaleceu-se tanto como mito e herói a ponto de vencer as eleições municipais anos mais tarde, impedido de assumir apenas por intervenção judicial. 
   O interessante, porém, é notar que o líder do PT sabe usar tudo ao seu redor em seu favor como se fosse inatingível. Sabe aquela expressão: tire o bem do mal”? O ex-metalúrgico vale-se ela como lema de vida! Afirmar uma coisa dessa após vários delatores citarem-no como sabedor ( e beneficiário!) de propinas, depois de extensa investigação em andamento contra ele (e que não é de hoje, vide o mensalão em seu primeiro mandato) não é coisa de gente néscia, muito menos de alguém que acredita piamente em sua inocência por saber-se injustamente perseguido, mas sim, de quem é muito sagaz e extremamente esperto. 
   E sabe o que é mais curioso? É entender que o presidente não mente em sua afirmação. Em um país como o Brasil, cujos cidadãos enxergam a política com um quê romântico; que torce pelos políticos como como a um atleta olímpico; que enaltecem aquele 1% de sinceridade contra os 99 de mau-caratismo, é perfeitamente cabível e honesto o que o Lula diz. Porque, para uma boa (e nada pequena) parcela de brasileiros, o ex-sindicalista já é herói, mártir e presidente desde sempre e para todo o sempre. 
   É desonesto dizer que não houve nenhum benefício na era Lula. Seria uma negação do óbvio. O Brasil vinha de um processo de mudança e o petista soube aproveitar o ensejo. No entanto, necessitado de um mito, de um ser fabuloso, praticamente um semideus a quem se assujeitar, boa parcela dos brasileiros elegeu Lula como um messias por quem todos esperavam, e ele, melhor que ninguém, soube encenar tal papel com um brilhantismo ímpar, sem nunca ter se desfeito de tal personagem. 
   Mesmo que a razão grite em nós um chamado à consciência sobre a importância de nosso papel político, que nem de longe é levantar deuses, tem razão Erasmo de Roterdã em seu “Elogio da Loucura”: “ A pior das loucuras é, sem dúvida, pretender ser sensato num mundo de doidos”. Lula entendeu (aplicou e aplica) esse aforismo como ninguém. ( FONTE: EVELYN MAYER, mestranda em Estudo da Linguagem e professora de Língua Portuguesa em Londrina, página 2, ESPAÇO ABERTO, sábado, 12 de março de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

Nenhum comentário:

Postar um comentário