Páginas

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

'ESCOLA SEM PARTIDO' É INCONSTITUCIONAL



   O projeto de lei denominado “Escola sem partido”, em discussão atualmente na Assembleia Legislativa do Paraná, apresenta dois equívocos fundamentais: um constitucional e outro educacional.
  
O equívoco constitucional é simples. O referido projeto atenta contra a Constituição Federal, que reza em seu artigo 206 que: “O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: 7.II- liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; 7. III- pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições publicas e privadas de ensino”. Portanto,  a inconstitucionalidade do texto é gritante.
   O segundo equívoco, o educacional, é mais amplo e complexo. O projeto parte de uma concepção ingênua da psicologia do estudante, uma concepção aberrante de educação, uma criminalização prévia e suspeição ética de todos os professores e a ideia de que o Estado é neutro, entre outras.
   Ao contrário, do que pensa os proponentes, o estudante não é a “a parte fraca” da relação de aprendizado, mesmo porque o aprendizado não é disputa de forças. Se os deputados visitassem as escolas de hoje em dia, perceberiam que os estudantes são seres com vontade própria, críticos, ativos, participantes e defensores de seus direitos. Não compõem rebanho.
   Ao contrário do que pensam os proponentes, à educação escolar não cumpre reproduzir o mundo doméstico, mas abrir o leque de possibilidades culturais, científicas, filosóficas e humanas. Cumpre dar acesso ao conhecimento historicamente elaborado pela humanidade, independentes de seus criadores serem cristãos, judeus, muçulmanos, de religiões de matriz africana, agnósticos, capitalistas ou socialistas, hetero ou homossexuais, e assim por diante.
   A educação não pode nem deve criar uma bolha privada em volta de cada aluno, ou não se cumpre o que o próprio apóstolo Paulo recomendou: “Experimentai tudo e retei o que for bom”.
   Ao contrário do que pensam os proponentes, os professores são, por princípio, profissionais éticos, justos, pluralistas, acostumados a dar voz a todas as opiniões e argumentos. Claro que cada um tem opinião: ter posições e ter lado nos debates é inevitável, mas isso não impede o diálogo democrático e o respeito às diferenças. Claro também que há exceções, que devem ser coagidas com as leis já disponíveis. Mas, sem nenhuma base, nenhum estudo, os proponentes julgam que a doutrinação é generalizada, e criminalizam a priori todos os professores, invertendo o princípio de que todos são inocentes até prova em contrário. E essa generalização sobre os professores merece o nosso mais firme repúdio.
   O projeto quer colocar uma espada pendendo sobre a cabeça de cada homem e mulher que dedicou sua vida à docência, como se não bastassem as recentes humilhações e usurpações de direitos que foram impostas  este ano professorado do Paraná.
   Por fim, ao contrário do que pensam os proponentes, o Estado não é neutro, o Estado é laico. A diferença é que na laicidade, o Estado não assume uma posição de acordo com uma fé ou doutrina, mas sim garante a liberdade de culto, a liberdade de expressão, a liberdade de cátedra, a liberdade de organização e manifestação para todas as formas de pensamento,  desde que não atendem contra a democracia, a integridade nacional e as demais cláusulas pétreas da Constituição. ( ANGELO PRIORI, historiador, ex-reitor da Universidade Estadual de Maringá e presidente da Associação Nacional de História, Núcleo Regional do Paraná, página 2, ESPAÇO ABERTO, domingo, 15 de novembro de 2015, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).  

Nenhum comentário:

Postar um comentário