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quinta-feira, 16 de abril de 2015

MAIORIDADE PENAL


   Escrevo essas letras quando as estatísticas nos dão conta que 87% dos brasileiros são a favor da redução da maioridade penal.  É  portanto deslizar morro acima contrariando a corrente de opiniões. Mas é necessário fazê-lo. É urgente que manifestemos, não só opiniões, mas apelemos para a racionalidade e  analisemos argumentos e fatos.

   O Congresso patrocina esta discussão. Desenterra na verdade um projeto da década de 1990 e pretende assim responder à sede de sangue que vem das bases e com isso diminuir a desmoralização da Casa que atingiu índices escandalosos. Não podia ser maior o golpe! A sociedade brasileira, inflamada com um debate pífio e inconsistente nos grandes meios de comunicação, ignora números, derruba o bom senso, atropela o ECA e se embriaga mais uma vez com exemplos anacrônicos de países como os EUA, com tradicional influência nestas terras tupiniquim.
   Até as pedras das calçadas sabem que o número de crimes cometidos por adolescentes  (e crianças) é ínfimo.  A Unicef tem estatísticas bem claras  sobre a América Latina. Os menores não estão “fora da lei”. Existem medidas claras e eficientes contra os infratores. Se nos queixamos das atuais casas de detenção, imaginem o que não dizer de nossas prisões. Escolas superiores de criminalidade! Está em 70% o número de reincidência  no crime.
   O que mais nos assusta é o equívoco consciente e assumido.! Adolescente não é potencial criminoso. Ele é vítima em primeiro lugar. São os menores que morrem e são eles os preparados para o crime, por uma sociedade que ignora e ataca a instituição familiar e não proporciona políticas públicas adequadas. Queremos tirar de circulação os que não soubemos educar. Ter uma sensação de proteção, mesmo sabendo que voltarão! Mais fortes, com delinqüência requintada e rindo do sistema que os trancafiou!
   Me pergunto: a quem interessa esse, chamemos-lhe, rigorismo legal contra o crime?! Candidatos malvados, ávidos de votos? Audiências de programas policiescos? Existirão máfias ligadas ao sistema prisional desejosas de aumentar a clientela? Porque ignorar exemplos como a da Alemanha, que reverteu uma tendência de reduzir a Maioridade penal?  Poder-se-á discutir esta questão em cima de casos isolados de gente que sofre até hoje com filhos assassinados por adolescentes?
   Se temos medo de adolescentes e crianças “perigosas” na rua, não acabemos com as ruas nem com eles! Combatamos as causas e não as conseqüências. Não sejamos autofágicos. Não demos tiros  no pé! Uma sociedade medrosa é capaz de tudo! Até de se destruir! Os nossos Congressistas,  deveriam andar mais ocupados em responder à legítima cobrança popular pela reforma política, que mude definitivamente o atual sistema gerador de tanta injustiça e corrupção. Num momento em que, com o Executivo acuado e desgastado, o Legislativo se impõe, a sociedade brasileira deveria desconfiar da oportunidade e das reais intenções da discussão desse Projeto.
   A redução da maioridade penal é mais perigosa ainda em países como o nosso. Como seria por  exemplo a própria pena de morte? O crime organizado continuaria recrutando “menores” cada vez com menos idade.  E a sociedade, incomodada, apelaria para medidas semelhantes a esta. Ou seja, não seriam perigosas as nossas CEIs?!  Uma espiral de violência insana e um círculo infinito devorador de sonhos! Vejo com tristeza uma maioria apoiando esta  ideia. Enxergo da parte de quem a “ressuscita ”, um aproveitamento maldoso da situação e um desrespeito para com a própria verdade! O ECA nos colocou no patamar de países sérios e desenvolvidos. Reduzir a maioridade penal seria um enorme retrocesso. Combater com energia a corrupção não pode dar ensejo a alargar o âmbito do combate à criminalidade prendendo menores! ( Texto escrito por MANUEL JOAQUIM DOS SANTOS, padre em Londrina, extraído do  ESPAÇO ABERTO, página 2, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA, quinta-feira, 16 de abril de 2015).

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