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sábado, 17 de janeiro de 2015

A ROMARIA



     Nos idos da  década  de 1970 a cafeicultura familiar passava por dificuldades em razão  das geadas que assolaram o Norte paranaense. Meus pais, agricultores e de pouca  leitura , labutavam com nosso pequeno sítio.  Seus sonhos eram de ter um filho “doutor” e eu fui o escolhido para realizar esse sonho. Fui para a cidade para fazer o colégio Científico, cursinho e prestar vestibular. Muitas noites lembrava  com aperto no  coração e lágrimas corriam no meu rosto ao lembrar que meus pais trabalhavam duro enquanto eu estudava.
     Certa época, meus pai comprou uma kombi e para ajudar nas despesas  organizava  Romarias para Aparecida do Norte.  Meus pais,  italianos, muitos fervorosos e tinham muita devoção por Nossa Senhora de Aparecida. Lembro-me que muitas vezes,  nas minhas férias ou mesmo nos feriados prolongados , meu pai organizava romarias na Kombi  e  eu  era  escalado, como motorista, para ir. Na época tinha pouco mais de vinte anos, saíamos ao entardecer, da frente da igrejinha da nossa vila, e viajávamos durante toda a noite chegando ao amanhecer em Aparecida.  Nos dias que antecediam a viagem , as senhoras e as moças se preparavam, fazendo as unhas. “permanente” nos cabelos, muitas andavam o dia todo de “bobi” , compravam sapatos novos que em muitos casos chegavam a fazer bolhas nos pés de tanto andar nos morros de Aparecida.
     A viagem muita  longa, mais de 700 quilômetros, tinha uma coisa mística, pois não cansava. Durante todo o percurso os romeiros iam cantando hinos, rezando terços. Parávamos nos postos e ali era um verdadeiro  piquenique,  pois levavam alimentos, bebidas e a alegria eram imensas. Muita fé em todos!  Emocionante era nossa chegada em Aparecida, muitos  chorava,  outros cantavam. Como era gratificante.
     Eu os levava a uma pensão e após o banho e o café matinal, seguiam para a igreja. Tinham senhoras que assistiam várias missas no período. Depois, compravam as encomendas,  santinhos, medalhinhas, terços, relógios, guarda-chuva, ou seja, muitas lembrancinhas para os que ficavam. Eu ficava  na pensão dormindo durante todo o dia, pois ao anoitecer tinha que enfrentar centenas de quilômetros no retorno.
     A partida era de novas emoções, choros, orações, hinos.  Dona Zefina , uma senhora  gorda, e seu esposo eram passageiros freqüentes  e ao voltar já iam falando para colocar seus nomes na próxima romaria, na qual levavam sempre um de seus vários filhos.
     A Creuza, esposa do Pedrão, brigava o tempo todo com ele, pois era chegadinho em uma “birita” e já na saída tomava um gole “para agüentar o baque”, como ele dizia. A Creuza sem pre  me cobrava um remédio para fazer o Pedrão deixar  de beber. Seu Ijarras, um sergipano, todas as vezes que ia tinha de comprar uma vela do seu tamanho e entrar na Basílica de joelhos. Eram muitas promessas a serem pagas.
     Ah! Em Aparecida os romeiros compravam muitos rojões e na  chegada  parávamos na entrada do vilarejo e a saraivada dos fogos de artifício acordava toda a vila, que imediatamente ia para a frente da igreja para nos receber. Que alegria!  ( Texto escrito por SIDNEY GIROTTO, médico em Londrina. Texto extraído do espaço Dedo de Prosa, pag 2, da FOLHA RURAL, publicado pelo jornal FOLHA DE LONDRINA, sábado, 17 de janeiro de 2015).

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