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sábado, 11 de outubro de 2014

PERDER PARA GANHAR


     A solidão é uma queixa que tem atravessado os  tempos  e hoje habita com freqüência  o consultório do analista. Desde Freud, ela é mote de sofrimento e trabalho na clínica, envolvendo a vida familiar, amorosa, profissional ou social. Sim, mesmo com um milhão de amigos nas redes sociais e com a sensação de poder encurtar distâncias em segundos, as pessoas se sentem e estão sozinhas.
     Os mais variados saberes atestam as dificuldades com o contato e o convívio social, mas também  são unânimes em afirmar que o homem não é uma ilha, e que sua existência depende da presença de outras pessoas. Tal condição é facilmente perceptível no início de nossas vidas, todos fomos pequenos  bebês  dependentes dos adultos no mais amplo sentido, mas é equivocado pensarmos que esta questão se restringe à infância. A autonomia que adquirimos à medida que crescemos  não exclui a importância de mais alguém em nossa vida. Certamente não se trata de qualquer pessoa, mas daquela com a qual podemos compartilhar idéias, desejos, afetos ou tempo. Com quem nos sentimos próximos.
     Entretanto, também não é difícil comprovarmos em nosso cotidiano o quanto nos custa o laço social: o incômodo causado pelas pequenas e grandes diferenças, a rivalidade e competitividade proveniente das semelhanças, a dor da indiferença, o desespero frente às inúmeras e diferentes demandas, o recuo necessário a alguns prazeres.
     Será que hoje, quando as pessoas se relacionam com “a menina do aplicativo” ou o “carinha da internet” e quando acreditam excluir,  deletar  ou bloquear alguém de suas vidas com um movimento do dedo, estariam tentando se proteger das inevitáveis dificuldades que a presença concreta do outro  impõe? E quando imaginam estar presentes e controlando a vida uns dos outros através de um aparelho celular, tratar-se-ia da produção de uma  ilusão de proximidade?
     Independentemente das respostas que possamos construir para estas perguntas, sabemos que não há combate à solidão sem presença e proximidade. Por mais paradoxal que possa parecer, aquele incômodo trazido pelo outro, o qual sempre está associado a algum tipo de satisfação,  é essencial para nossa existência. E mais, a proximidade se dá exatamente  quando a  presença   de  alguém é o suporte dessa perda de satisfação, o que nos permite um  encontro com os limites e com o vazio que nos habita.

     Tal encontro, ao contrário de produzir solidão e ausência de sentido, impulsiona a produção. Podemos nos pautar na sabedoria popular que diz “quem tudo quer,   nada tem” e afirmar que “quem tudo tem, nada quer”. No jogo da vida é preciso perder para ganhar e, neste caso, jogar sozinho, além de ser muito sem graça, é game over na certa.  ( Texto escrito por ZEILA  TOREZAN, psicanalista e coordenadora da Associação Livre- Psicanálise em Londrina, publicado no espaço PONTO DE VISTA, do JORNAL DE LONDRINA, sexta-feira, 10 de outubro de 2014). 

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