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quarta-feira, 11 de junho de 2014

COMPRO OURO

                          Na esquina da Catedral, perto da Caixa Econômica, a senhora me entrega um panfleto no qual se lê: “ Compro ouro “. O problema é que não tenho ouro para vender: todos os meus bens estão comigo e não podem ser convertidos em moeda sonante.  
Tenho  ouro, sim. Mas é um ouro que não posso carregar, nem depositar num banco. Vejo-o quando atravesso a rua e vou à igreja na missa do meio-dia, celebrada pelo monsenhor Bernardo. De repente, abro a porta de casa e o encontro ali, a me esperar com  os nomes de Rosângela e Pedro. Na  hora do almoço,  a minha amiga Teresinha me pergunta se eu quero alguma coisa. Digo que não, obrigado. Preciso terminar uma crônica. Sobre quê? Sobre ouro.
             Sou um estranho minerador. Descubro ouro enquanto caminho pelas ruas de Londrina nos dias frios de outono. É  um ouro que não se encontra no chão , mas no alto. Nas primeiras manhãs da semana, olhei para céu da cidade e tive a certeza de que ele foi pintado pessoalmente por Deus. Fiz 14 fotos do céu de Londrina com meu celular: um amigo mais atento, e generoso, disse que era um “ soneto azul “. Como se sabe, o soneto tem 14 versos, mas eu nunca serei capaz de escrever com a luz.   
          Dou-me conta de que esse azul não custa nada, nem entra no PIB, nem aumenta nossa renda per capita. Mas devolve troco: até a placa de PARE, assim, maiúscula, parece mais vermelha e mais bonita, quase tão bonita quanto uma tela de Changali, de Montrian, de Hopper.
 Nem sempre a vida nos dá as costas. Com Edith Stein, a filósofa atéia que virou santa, aprendi que acreditar em Deus é ser mendigo  e milionário ao mesmo tempo. Temos tudo, não possuímos nada. Tudo  que podemos acumular é a riqueza dos pobres de espírito: este céu, este chão, estas palavras. Não é o caso de evitar os bens materiais ou as honrarias, mas  de colocá-los nos seus  devidos lugares. Ter como se não tivesse. Ser como se não fosse. De volta à esquina,  não vejo mais a senhora que me deu o panfleto. Olhando para a Catedral lembro-me da igreja queimada que vi há 14 anos , em Minas Gerais. Lamento,  minha amiga, mas não posso comprar nem vender esse ouro. Seu nome é vida eterna.
        
( Texto escrito pelo escritor PAULO BRIGUET,   briguet@jornaldelondrina.com.br, coluna DIA DE CRÕNICA, sexta-feira, 6 de Junho de 2014 ).  

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