Páginas

terça-feira, 4 de abril de 2017

ESCOLAS ALFABETIZAM COM 'LETRA DA INTERNET'


Alunos do colégio Santa Amália, na zona sul de São Paulo, escrevem com letra de fôrma
   Para se encaixar à realidade dos pequenos, familiarizados com os caracteres, colégios ensinam com o estilo fôrma

   Para especialista, aprender letra cursiva mais tarde não traz prejuízo; MEC diz que escolas têm autonomia 

   A forte presença no dia a dia de crianças de recursos tecnológicos como tablets, joguinhos e aplicativos de telefones celulares, além dos vídeos musicais com legendas, tem ampliado rapidamente uma mudança na forma de alfabetização das escolas. 
   Para se encaixar às realidades dos pequenos, que muitas vezes já chegam à sala de aula conhecendo as letras, aprender a ler e a escrever agora pode começar com a chamada letra bastão ou de fôrma: a letra da internet.
   Não existem sinais de total abandono da letra cursiva no Brasil, o que já acontece em países europeus e nos EUA, mas ela já não é prioridade absoluta de ensino e é aprendida em um segundo momento em parte dos colégios. 
   No colégio Santa Amália, na Saúde (zona sul), as salas do primeiro ano do ensino fundamental são decoradas com letras bastão. 
   Das anotações da professora no quadro à cartilha da molecada, tudo remete à grafia com que os alunos têm familiaridade seja por meio do teclado do computador dos pais, seja pelos joguinhos eletrônicos e pelas animações. 
   “A letra bastão traz para a escola o mundo real da criança, a letra que ela vê no dia a dia e que, com a tecnologia, tornou-se ainda mais presente, mais referência”, diz Adriane Ideta, coordenadora pedagógica do colégio.
   Segundo ela, quando a criança estiver alfabetizada. Inicia-se o ensino da letra cursiva que, “culturalmente, é ainda forte no Brasil”. 
“É função da escola dar á criança ferramentas para que ela decida, no futuro, que tipo de letra prefere para escrever e que faça isso corretamente, sem vícios de escrita.”
   O colégio Dante Alighieri, na região da av. Paulista (zona oeste), segue o mesmo princípio pedagógico do Santa Amélia, mas há escolas que optam por iniciar com o ensino da cursiva e as que ensinam os estilos diferentes ao mesmo tempo. 
   Francisca Maciel, doutora em educação pela UFMG e especialista em alfabetização diz que é mais fácil alfabetizar pela letra bastão ou, como ela prefere chamar, “de imprensa, maiúscula”.
   “Quando a criança está no início do processo de aprendizado, é mais fácil distinguir as letras, saber qual é qual, quando se usa a de imprensa, que também tem o traçado mais simples e favorável à coordenação motora”, diz. 
   Para a especialista, aprender a letra cursiva posteriormente não traz prejuízo aos alunos. Mas é importante que ela seja ensinada. 
   “A cursiva é um desenho, não acrescenta nada especial, mas é mais rápida e dá uma certa identidade. Sem a manuscrita, como ficariam as assinaturas?”
   Já Leopoldo Leal, doutor em design pela USP e que já trabalhou apresentação de tipografias na rede municipal, “o [estilo] cursivo nada mais é que o reflexo de uma época em que se usava pena e nanquim para escrever”.
   “Hoje em dia, digitamos muito mais do que escrevemos. Quantos e-mails e mensagens trocamos e quantas anotações à mão fazemos no mesmo dia? A justificativa para não abolir o cursivo é a não inclusão digital total e também a pressão de pais que querem que as crianças sejam educadas exatamente como eles foram.”

   SEM MODISMO

   Os alunos da rede de colégios Vicentinos de São Paulo continuam aprendendo antes a letra cursiva. 
   A linha pedagógica das escolas segue o que consideram tradição, “sem apelo aos modismos”. “Sem a quebra das letras, que acontece com a letra bastão que exige tirar a mão do papel, o aluno dá sequência ao pensamento, à elaboração de ideias”, afirma Soreny do Espirito Santo, 54, pedagoga no colégio São Vicente de Paulo, na Penha, zona leste.
   O MEC afirma que livros didáticos, aprovados pelo Programa Nacional do Livro Didático, em geral, apresentam propostas para a inserção do reconhecimento e uso dos diferentes tipos de letras e que as escolas têm autonomia na alfabetização. (JAIRO MARQUES – DE SÃO PAULO, caderno cotidiano, domingo 2 de abril de 2017 B1, publicação do jornal FOLHA DE S.PAULO).

Nenhum comentário:

Postar um comentário