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domingo, 9 de abril de 2017

A ARTE DE CRIAR COELHOS


   Os textos que saem da minha cartola são coelhinhos que crio como os desenhos de Hanna-Barbera
   Todo ano ele reaparece com aquela cara de fofo, todo peludo, orelhudo e colorido. Dizem que traz chocolates, mas eu observo o Coelho da Páscoa sob um outro prisma, no fundo, acho esse personagem maluquinho, ele se multiplica com mais facilidade em facetas diferentes do que na sua própria criação. 
   Primeiro me identifico com o Coelho de Alice no País das Maravilhas porque ele vive atrasado, eu também. Perco a conta de quantas vezes no dia me sinto ofegante, de olho no relógio para saber quanto tempo resta para dar conta do recado. Em dias puxados, passo pelas pessoas dizendo: “estou atrasada, estou atrasada” e, nestes momentos, acho que minhas orelhas crescem, sem contar que esbarro e derrubo coisas tentando vencer os prazos sempre curtos. 
   Se fosse coelho seria muito desastrado, não teria aquela gravata do Coelho de Alice e os óculos já teria espatifado no chão. Mas como sou gente tento manter a calma e dar um contorno humano à minha falta de tempo. 
   A cultura é um terreno fértil para os coelhos: nas HQs tem o Max, do Sam & Max, que é um coelho com um sorriso medonho, talvez mais enigmático que o Gato que Ri. Tem ainda as Coelhinhas da Playboy que ficaram fora de moda depois que o movimento feminista mostrou que as mulheres são mulheres e não tem nada a ver com “coelhinhas”, aquele ícone sexy inventado por Hugh Hefner, o homem que achava que podia tudo até mesmo pôr orelhas e rabos de pelúcia em mulheres lindas, transformando a vida delas numa rotina humilhante. 
   Mas é melhor pular essa parte e voltar a exemplos inspirados nesses animais simpáticos, mas sempre bonzinhos. Na ordem dos coelhos poderosos temos o coelho da Mônica que adquire uma velocidade estonteante nas histórias de Maurício de Souza distribuindo porradas para Cebolinha e Cascão. Seu nome é Sansão e ele tem muita força, não só física, mas da força lúdica que faz dele um dos personagens mais conhecidos das histórias infantis, inspirando os dentes da Mônica e desconfio que até os de Dilma Rousseff.
   Mas o mais representativo da família dos coelhos fictícios é o Pernalonga que vive dizendo: “O que há velhinho?” . Quando o velhinho é ele mesmo porque nasceu em 1940. Ele tem em sua vida uma coleção de aventuras, chegou a jogar basquete com Michael Jordan, coisa que nunca vi, mas posso provar convidando vocês a assistirem vídeos no YouTube nos quais a realidade tem tudo a ver com a ficção. 
   Até por isso, acreditem no Coelhinho da Páscoa e não tenham vergonha de criar histórias. Eu acredito piamente nele e faço ninhos para que me tragam ovos de chocolate, única função série de um coelho que, além disso, só tem que comer cenouras e correr na grama. Eles ainda não têm nada a ver com Jessica Rabit, a coelha ruiva, de peitos grandes, inventada pelo desenhista Robert Zemeckis. A Jessica, dublada pela atriz Kathleen Turner, nas telas embalada por trilhas de blues. Mas, cá entre nós, eu acho a Jessica sexy demais, tão sexy que em vez de coelhinha ficou parecida com uma mulherzinha da Playboy. E uma coelha de verdade, vocês sabem, tem muitos filhos sem apelar porque transa rapidamente, repetindo há séculos um padrão procriativo que se encaixa mais no “crescei e multiplicai-vos” da Bíblia do que num salão de beleza. Com toda essa rapidez, não é à toa que os mágicos transformam os coelhos em seus coadjuvantes, tirando um deles da cartola toda vez que a situação exige um pouco de ilusão. É isso que eu faço, nos fins de semana, quando preciso transformar os textos num desenho de Hanna-Barbera, eles são os coelhos que saem da cartola de uma jornalista que vive atrasada. E se você me acompanharam até aqui, correndo e pulando, só posso desejar, desde já, Feliz Páscoa a todos para adiantar o expediente. (Crônica escrita pela jornalista e escritora CÈLIA MUSILLI, celia.musilli@gamail.com páginas 2 e 3, coluna CÉLIA MUSILLI, 8 e 9 de abril de 2017, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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