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domingo, 19 de março de 2017

A PRÇA FICOU SEM O PIPOQUEIRO


   Certo domingo alguém anunciou durante a missa: “Queremos rezar pelo nosso irmão (...) que faleceu hoje. Era o pipoqueiro da nossa praça”.
   Um sentimento de tristeza silenciou o ambiente. Parece que todo mundo se deu conta de alguém que ninguém fazia muita conta. Eu, particularmente, tentei lembrar do senhorzinho que estava sempre ali na praça, na saída da igreja, aos domingos, sábados à noite, dias santos, dias de festa. Tentei me lembrar desde quando, e um homem comentava que “desde meus tempos de criança, quando eu era coroinha, quando a igreja ainda era de madeira”. Na verdade, parecia que desde sempre ele esteve ali, solícito, sorridente, trazendo alegria com pipoca para as crianças, e para os adultos também. 
   Fui fazendo um caminho inverso enquanto olhava para a praça que, de repente, ficou vazia, vazia. Lembro de tê-lo cumprimentdo vindo do lado de lá .. ou chegando do lado de cá, ou enquanto fechava o portão e pedia licença, avisando para quem esta comprando pipoca: “Vocês vão passar por aqui? Vamos fechar o portão “. Comecei a lembrar de detalhes que nunca havia notado: as pipocas coloridas espalhadas no chão pela meninada que não esperava o término da missa e fazia os pais menos enérgicos irem comprar: o caminho de pipoquinhas em volta da igreja disputadas pelos pardais; as crianças cobrando dos pais que queriam pipoca pois haviam se comportado na Igreja, mas já não aguentavam de vontade. Alguns senhores sentados em volta do carrinho, papeando, antes e depois da missa e, um último detalhe que me inquietou ainda mais: o rosto do pipoqueiro! Eu não conseguia lembrar, por mais que me esforçasse! E olha que já o havia cumprimentado, observado, até comprado pipoca para minhas filhas. 
   Que pena me deu a morte do pipoqueiro! Não por ele ter ido para a casa definitiva do Senhor daquela Igreja, que, com certeza, o acolheu com muita festa e pipoca, naturalmente! Pipoca é sinal de infância, de felicidade, de brincadeira de criança – “e delas é o Reino dos céus...”
   O que me deixou mais triste foi não poder lembrar seu rosto que deveria transmitir alegria, bondade, felicidade, amor ao próximo, profissionalismo, humildade, serviço. Fiquei arrependida e pedi perdão a Deus. Pedi que Ele nos ajudasse a olhar para as pessoas com mais interesse, com carinho, sem pressa, da forma como seu Filho olha para cada um de nós. 
   Hoje, a praça vazia lembra com saudade daquele homem sem rosto, que fazia a diferença em seu ofício, com seu carrinho que irradiava um cheiro gostoso, feito chamariz para as crianças, atraindo-as assim como a flor atrai as abelhas e faz dançarem a sua volta as borboletas. Plagiando o poeta, pode-se dizer, a respeito do pipoqueiro de Santo Antônio que, “naquela praça está faltando ele e a saudade dele está doendo em nós!”
   Simples assim! (Crônica escrita por ESTELA MARIA FREDERICO FERREIRA, leitora da FOLHA, página 2, coluna DEDO DE PROSA, caderno FOLHA RURAL, 18 e 19 de março de 2017, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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