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segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

PAI LARGA EMPREGO E PROJET CADEIRA DE RODAS QUE 'LIBERTA' FILHA COM PARALISIA

Mario Alvitti investiu todas as suas economias no projeto da cadeira para a filha Ana Paula: ele pretende que outras crianças com deficiência tenham acesso a esse veículo

   Modelo inédito no país deixa criança próxima ao chão e permite deslocamentos e brincadeiras 

   Para que Ana Paula, 3, pudesse ser uma criança com mais liberdade, sem precisar se rastejar para alcançar um brinquedo ou para brincar de esconde-esconde, ela ganhou um modelo de cadeira de rodas inédito no país, que a deixou quase na altura do chão. 
   E quem desenvolveu esse veículo, que parece um carrinho de corrida estilizado, foi o próprio pai da menina, Mario Alvitti, 33. 
   Ana tem uma deficiência que a deixou paraplégica. Por isso, para melhorar a qualidade da infância da filha, Alvitti largou a carreira militar e torrou as economias guardadas ao longo da vida, R$ 30 mil. 
   Para desenvolver todo o projeto, com design, escolha dos materiais ideais, pesquisa, patente e fabricação, o pai contou ainda com a ajuda de amigos, que doaram mais R$ 40 mil para que o sonho fosse concretizado. 
   “As cadeiras de rodas infantis são para deslocamentos maiores. Elas não dão a segurança e a comodidade que ela precisava para pegar uma boneca no chão, para se deslocar rapidamente pela casa, para explorar o ambiente. Isso me tirava o sono”, afirma Alvitti. 
   Ele demorou um ano para fechar o projeto, que já tem patente requerida e será lançada em uma grande feira de empreendedores e inovações, a partir do dia 18 deste mês. 

   PAREDE RISCADA 

   Quando Ana tinha oito meses de idade, uma lesão tirou da pequena os movimentos das pernas e parcialmente do tronco. Trata-se de uma lesão muscular não traumática, sem um choque físico e cujas causas ainda são investigadas. 
   Ela também perdeu a sensibilidade tátil da cintura para baixo, o que comprometeu funções fisiológicas.
   Mas o que o trauma parece não ter tirado da garotinha é a fofice, claro, a tagarelice infantil (fala pelos cotovelos) e uma inquietação de descobrir o mundo – ela se movimenta na cadeirinha por todos os cômodos da casa, pela escola e nas áreas planas do condomínio onde mora, na zona oeste de São Paulo. 
   “A ficha de que ela não pode andar parece que ainda não caiu para a gente. É difícil de assimilar. O que nos sustenta e nos conforta é que ela é uma menina cheia de vida, alegre”, diz o pai. 
   A mãe de Ana Paula, Fernanda Cristina Caldeira Leitão Teixeira, 35, é fisioterapeuta e também ajudou na criação do conceito e da ergonomia da cadeira.
   “A Ana ganhou uma autonomia fantástica e teve crescimento cognitivo podendo tatear o chão, alcançar as coisas. Quando ela riscou a parede pela primeira vez, o que conseguiu usando a cadeira, foi uma alegria”, afirma. 
   O pediatra Emanuel Sarinho, presidente do Departamento Científico de Alergia da Sociedade Brasileira de Pediatria, elogiou a iniciativa do pai de Ana Paula. 
   “O pai da criança, com sua sabedoria afetiva, abraça a lógica biológica e o conhecimento científico atual”, diz.
   Sarinho explica que “o canto da criança com bactérias probióticas nas fases iniciais da vida promove no intestino , e em outros sistemas orgânicos, uma verdadeira harmonia no sistema imunológico”.
   Ainda segundo o médico, “ver o verde, admirar o céu, fazer brincadeiras ao ar livre são poderosos estímulos ao desenvolvimento afetivo e psicomotor fazendo com que a criança apresente experiências marcantes e positivas. 

   CHANCE DE BRINCAR 
   A “Fly Children”, nome de registro da cadeirinha, é indicada para crianças de 1 a 4 anos e atende diversos tipos de deficiências, como as provocadas pela paralisia cerebral ou pela mielomeningocele, de acordo com os idealizadores do projeto. 
   O veículo pesa 8,5 kg – não pode ser muito leve para manter a estabilidade e segurança da criança – e é feito de material atóxico, não inflamável e flexível, o que propõe conforto ao usuário. 
   A intenção do projeto é ser autossustentável. A cadeira custa R$ 2.000. Até agora, foram feitas apenas seis unidades, e todas foram doadas.  
   “Não tenho nenhum objetivo de ficar rico vendendo essa cadeira. Quero que mais crianças tenham a chance de poder brincar mais livremente, de mais pais poderem ficar felizes com o desenvolvimento de seus filhos”, declara o pai da menina. (JAIRO MARQUES – DE SÃO PAULO, página B9, dias melhores, caderno COTIDIANO, domingo, 5 de fevereiro de 2017, publicação do jornal FOLHA DE S.PAULO. 

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