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sábado, 29 de outubro de 2016

SABOR DE INFÂNCIA


   Dias desses, uma colega de trabalho, que também se dedica à gastronomia, trouxe à Redação para que experimentássemos os biscoitos de uma nova receita que estava testando. A novidade, como nos contou, era preparada há tempos pela avó de sua sócia. Logo na primeira mordida o quitute me levou aos tempos de menina: os biscoitos tinham a mesma aparência, textura e sabor dos que era feitos pelas minhas tias paternas que moravam no sítio, lá na comunidade São Lázaro, próximo ao distrito de Yolanda. 
      Mais que o delicioso sabor de infância, voltou à memória também todo o ritual do preparo dos biscoitos, que era conhecidos por um dos ingredientes: “biscoitos de sal amoníaco” – nada glamouroso se comparado se comparado à atual onde de gourmetização generalizada. Em um dia de festa e muita bagunça entre todos os primos. A produção atendia as duas casas do sítio por algumas semanas garantindo o café da manhã e o lanche da tarde. Por isso, todas as mulheres da propriedade se envolviam no preparo. 
   Ovos frescos já tinham sido recolhidos dos ninhos do galinheiro no período da manhã, assim como estava separada a porção do leite retirado logo cedinho e que seria utilizado na receita. O sal amoníaco. Responsável pela maciez do biscoito, tinha sido trazido da cidade no dia anterior, quando eu e meus primos também vínhamos para o sítio, junto com meu tio que era o responsável pelas compras. .
  Mesas se juntavam na varanda para acomodar as bacias de alumínio onde os biscoitos seriam preparados. Os fornos ( a lenha e do fogão “econômico”) também já estavam aquecidos. Com as mãos na massa, minhas tias se dividiam entre misturar os ingredientes, modelar os biscoitos, acomodá-los nas formas e levá-los para assar. Tudo minuciosamente acompanhado pela galera de sobrinhos que compunham a plateia de curiosos. Para dar-nos uma certa participação no preparo, podíamos apertar alguns biscoitos com o garfo, para garantir a “decoração” do produto. 
   Conforme as formas saíam do forno, os biscoitos eram colocados em outras bacias maiores, onde ficariam até esfriarem no ponto ideal para serem guardados nas latas de 18 litros. Na época, esse tipo de vasilha era a única forma de acomodar alguns tipos de alimentos, por isso eram encontradas em qualquer vendinha. 
   Naquele dia lanche da tarde ganhava ainda mais sabor. As jarras cheias de água fresca, recém-tirada do poço, recebiam os pozinhos de Q-refresco ou Q-suco nos sabores de groselha, uva ou laranja, ou também a limonada, feita com limão-rosa ou limão-galego, dependendo da safra, completavam o banquete. 
   De volta ao presente, e desejando muito sucesso no empreendimento de minha colega de trabalho. Fica a constatação de que as alegrias da vida pedem muito pouco: uma receita simples, pessoas dispostas ao trabalho, a conversa posta em dia, e o momento torna-se uma confraternização, uma celebração. Que tal pôr a mão na massa?! (Crônica da jornalista desta FOLHA, CÉLIA GUERRA, página 2, caderno FOLHA RURAL, coluna DEDO DE PROSA, 29 e 30 de outubro de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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