Páginas

sábado, 16 de julho de 2016

O AMIGO JUAREZ




   Morávamos num pequeno sítio nas proximidades de Astorga na década de 1960. Nossos vizinhos, uma família de evangélicos, da Congregação Cristã, muito honestos, sérios e trabalhadores e que seguiam com muito afinco suas doutrinas. Nós, católicos, também seguíamos nossa religião. Nunca houve qualquer desconforto durante os anos em que fomos vizinhos, pois os respeitos das doutrinas eram mútuos. 
   A família dos Batistas, além dos pais, tinha duas filhas e três filhos que regulavam as idades dos meus irmãos e a minha. Eu tinha a mesma idade de Juarez. As crianças eram muito unidas e Juarez e eu sempre juntos nas “caçadas de pássaros” com estilingues, armando arapucas. Nos dias de muito calor íamos nadar no rio Pimpinela com suas águas frias e fundo pedregoso, que muitas vezes cortavam nossos pés. Nossa alegria foi quando meu pai tirou uma câmara de ar do velho jeep e nos deu de presente. Era uma festa só no rio, quando descíamos rio abaixo com a câmara. Todos os dias da semana eles passavam pela nossa casa para irmos juntos à nossa querida escola rural da professora Ica.
   Passaram anos, mudamos para a cidade grande e os Batistas seguiram para outro destino. Perdemos o contato com eles, pois naquela época era difícil a comunicação. 
   Certo dia, já casado, fui convidado para ser padrinho de um casamento em uma pequena cidade próxima a Londrina. Ao subir no altar vi no padre uma figura que me parecia familiar, e o mesmo aconteceu com ele. Após a cerimônia, o padre veio até onde eu estava e me perguntou se eu não era o seu amigo de infância ao que prontamente o reconheci. Foi uma grande alegria e indignação por minha parte.
   Juarez, o padre, compreendeu minha dúvida e foi logo explicando. Quando adolescente, morava numa cidade e as escondidas dos pais começou a frequentar uma paróquia católica. Aí resolveu que queria estudar para padre. Disse que foi a pior fase de sua vida, pois como comunicar aos pais sua decisão? Os pais evangélicos fervorosos. Que situação! Mas sabiamente e muito cristãos, seus pais compreenderam e apoiaram o filho na sua vocação, embora jamais se convertessem ao catolicismo. 
   Na sua ordenação sacerdotal, toda a família dos Batista comparecera e foi uma grande festa. Seus irmãos – o Sérgio tornou-se dentista e o mais velho, Alberto, juiz de direito – continuaram evangélicos, suas irmãs tocam órgão na igreja. Juarez perdeu seus pais mas a família continua sempre unida. (SIDNEY GIROTTO, leitor da FOLHA, página 2, espaço DEDO DE PROSA,FOLHA RURAL, sábado, 16 de julho de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

Nenhum comentário:

Postar um comentário