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sábado, 2 de abril de 2016

O CARDÍACO GENARO


   Nos idos da década de 1960, morávamos no sítio e nossos vizinhos eram uma família de descentes de italianos, por sinal, muito trabalhadores. Trabalhavam de sol a sol e eram muito honestos. Compraram alguns pequenos sítios nas redondezas. Frutos do trabalho e de suas economias. Com o passar dos tempos tornaram-se compadres de meus pais. Eram em oito irmãos, cinco homens e três mulheres, além dos pais.
   O Genaro, o segundo filho, era um rapaz claro, avermelhado, com uma barriga protuberante e que não trabalhava na roça. Segundo a família, quando ele era pequeno, um médico do interior de São Paulo disse aos pais que ele tinha um “assopro” no coração e não podia fazer muito esforço. O Genaro então foi criado como “cardíaco”. Estudou até a quarta-serie primária e depois de adulto, era ele quem tinha a conta no banco, vendia a produção agrícola família, comprava os insumos para as lavouras , assinava os cheques das compras, ou seja, fazia o trabalho burocrático. Frequentemente via o Genaro às tardes na pracinha do vilarejo jogando dominó ou baralho com os velhos. Dificilmente ia ao médico. Toda a vizinhança sabia que ele tinha um “assopro” no coração e era cardíaco.
   Certa ocasião, ele pegou uma forte gripe e foi ao pequeno hospital do vilarejo. Doutor Mendes, um médico sábio, capaz e muito ético, também sabedor da fama do cardíaco Genaro, examinou minuciosamente o coração do paciente. Nada encontrou e constatou que o coração dele era um “relógio”. Não disse nada ao Genaro e solicitou um raio-X do coração e um eletrocardiograma justificando ao paciente que era para ver como estava evoluindo a sua doença. Genaro prontamente dirigiu a uma cidade vizinha maior e se submeteu aos exames requisitados pelo doutor Mendes. Ao retornar, confirmou o que seu médico previa. Genaro tinha uma saúde cardíaca perfeita. 
   A notícia se espalhou, não pelo doutor Mendes, mas sim pelas funcionárias do hospitalzinho, deixando o médico muito bravo. Passado alguns dias, os irmãos do Genaro ficaram sabendo do resultado dos exames e procuraram o doutor Mendes, que após muitas tentativas de negar, acabou confirmando a boa saúde do irmão. Revoltados, os irmãos voltaram para casa e obrigaram os pais a tirar Genaro da sociedade familiar. Deram a ele um pequeno sítio como agrado. Sem ter como trabalhar na lavoura, pois não tinha costume e com dois filhos, foi pra cidade onde arrumou um emprego na prefeitura local para cuidar da pracinha onde jogava baralho e dominó. 
   Além de tudo isso, ainda tinha de aguentar as gozações dos antigos companheiros de jogo sempre dizendo que era um artista em ter enganado a família o tempo todo. Pobre Genaro. ( SIDNEY GIROTTO, leitor da FOLHA, página 2, espaço DEDO DE PROSA, FOLHA RURAL, sábado, 2 de abril de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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