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sábado, 30 de abril de 2016

BASTA-ME UMA ARMA!


   Lá se foram 12 anos do início da campanha deflagrada para desarmar a população. A Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, proibiu o uso de armas ao cidadão comum, salvo em situações muito específicas que envolvem um complicado processo. Medida pretendia amenizar os índices de homicídios, suicídios, latrocínios e os fatídicos acidentes com armas de fogo, mas foi um fiasco. 
   Para a “banda podre”, que nunca respeitou as leis mesmo, não fez a menor diferença. Para ela, comprar uma pistola automática, um fuzil, ou uma submetralhadora, é moleza, enquanto a parcela ordeira da população, assustada e refém dos bandidos, sente-se tolhida da possibilidade de se defender e, aflita, apela para as redes sociais pedindo a revogação do Estatuto do Desarmamento, pois quer restituir o direito de ter uma arma em casa. 
   Ao ver esse movimento penso no quanto fui inocente ao acreditar que desarmando a população haveria uma calmaria nas ruas, que as pessoas iriam voltar a passear tranquilas pelas praças e parques nos finais de semana e as madrugadas voltariam a pertencer aos boêmios e românticos. Ledo engano! A matança continuou numa estatística ascendente e, pior, produziu um novo fenômeno que vem estarrecendo a população: o linchamento! É, digamos, uma nova moda, sem glamour, mas é moda, pois reúne os elementos típicos para isso: consumo compulsivo, padronizado, além do alto preço, frequentemente, nesse caso, a vida da vítima ou a cadeia para o linchador. 
   O desarmamento revelou o instinto animalesco do qual o ser humano só se dá conta quando ouve o brado “mata, mata”! Ao ouvir essa ordem o cérebro reage de forma primitiva e os homens adotam uma postura de manada, seguindo irracionalmente o macho alfa e se torna capaz de atacar e matar a mãos vazias, chutes, pauladas, pedradas, etc. Diante desse risco venho reivindicar o meu direito de também possuir uma arma, pois ando com medo. Estou com medo de ser cooptado, por uma dessas turbas ensandecidas e acabar sendo guiado como rês numa manada. Quero ter a minha arma para não sujar as mãos de sangue, especialmente do sangue de alguém julgado, sentenciado e executado no tribunal das ruas e que depois de descobre que era inocente, fato que tem se tornado comum. A morte produzida por arma de fogo dói menos, é mais rápida, menos ultrajante e menos cruel, além do que, matar usando as mãos também desqualifica o matador.
    A reflexão acima é apenas para lembrar que o homem não precisa de armas de fogo para matar quando é movido por impulsos que despertam o pavor da ameaça da sua destruição. Por isso a Lei do Desarmamento jamais será percebida como algo de interesse da sociedade, pois foi construída ao revés da realidade assustadora que assola nosso dia a dia. Nesse quesito nos encontramos nas escalas inferiores da “Hierarquia das necessidades”, de Abraham Maslow, que dizia que “p homem vive só de pão, quando não há pão”. Analogamente dizemos: bastam-nos armas, pois fomos proibidos de tê-las. 
    Mas sabemos que a convivência harmoniosa não depende de armas, mas dos valores e princípios que orientam as relações humanas, além de atitudes como o respeito à diversidade, tolerância, aceitação incondicional do outro, empatia, qualidades que têm se tornado raras. Se atingíssemos esse nível de interrelacionamento poderíamos fechar as fábricas de armas, pois se seriam inúteis. Creio nisso, embora creia como essência filosófica do Inter-humano, mas utópico e irrealizável diante do nosso sistema falido, das instituições que servem apenas para perpetrar sujeiras que nem o mais equipado “lava jato” consegue limpar. Nesse cenário dantesco continuaremos ouvindo ecoar o grito “mata, mata” e o cidadão honesto – além de outros nem tão honestos assim – postando o reclame: Basta-me uma arma!. ( JAIR QUEIROZ, psicólogo clínico com pós graduação em Segurança Pública em Londrina, página 2, ESPAÇO ABERTO, sábado, 30 de abril de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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