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segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

SENADO, CÂMARA E OS LIXÕES


   A prioritária erradicação dos lixões, que deveria ter ocorrido em agosto de 2014, segue sem dinheiro para sua execução. Para se entender melhor o problema, é importante lembrar que essas excrescências ambientais – nas quais os resíduos sólidos, principalmente os domiciliares, são depositados a céu aberto e sem proteção do solo e onde as pessoas paupérrimas buscam migalhas em meio à imundície – deveriam ser proibidas desde 1981, quando a lei que criou Política Nacional do Meio Ambiente vedou sua existência. A Lei 12.305/2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos sólidos (PNRS), fixou agosto de 2014 para sua erradicação.
   Lá se vão cinco anos, e mais de 3 mil municípios continuam com os lixões. Houve, até mesmo o temor de eu os gestores municipais fossem denunciados por não cumprirem a lei. Porém, como já se viu tantas vezes em nosso país, encontram-se alternativas enviesadas para se acomodarem problemas não resolvidos. Foi assim, num desses ímpetos de criatividade dispersiva, que o Senado aprovou, por meio do Projeto de Lei PLS 425/2014, a prorrogação da vigência da validade dos lixões em prazos que vão de 2018 a 2021. A senadora Vanessa Graziotin (PC do B- AM), relatora do projeto, apresentou a seguinte justificativa para referendá-lo. “Por falta de quadros técnicos e gerenciais qualificados e de insuficiência de recursos financeiros (dos municípios), 
não se conseguiu cumprir a determinação legal”. 
   Concordamos com a justificativa da senadora, aceita pelo plenário. Entretanto, se o problema é a falta de pessoal qualificado e dinheiro, o texto do projeto aprovado repete o erro: alongam-se os prazos, mas nada é dita sobre a incapacidade financeira dos municípios. Assim, pergunta-se: de onde virão os recursos? Dos orçamentos exauridos das prefeituras? A questão é só interesse local? Estados e União não são partes da solução? 
   Caberia à Câmara dos Deputados, à qual a matéria seguiu, sendo convertida no Projeto de Lei 2289/2015, corrigir o problema em questão, determinando formas de participação da União aos investimentos requeridos, como também instituir definitivamente aquilo que os municípios ão têm coragem de fazer: criação de instrumento de cobrança ao usuário desses serviços. Considerando a importância de se rever o texto, é preocupante constatar que a Câmara, além de não corrigir o projeto ainda incluiu emenda, simplesmente prorrogando o prazo de erradicação dos lixões para 2018. Na Medida Provisória 678/2011, votada e aprovada em 13 de agosto de 2015, que institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas, sem qualquer relação com o tema. 
   Percebe-se, nessa manobra, total falta de preocupação com os 75 milhões de brasileiros que vivem em áreas nas quais os resíduos sólidos continuam sendo depositados em cerca de 3 mil lixões, com danos à saúde e ao meio ambiente. Pelo menos 1% da população atendida por lixões desenvolve doenças, o que equivale a cerca de 750 mil pessoas, revela estudo da International Solid Waste Association (ISWA), em parceria com o Sindicato das Empresas de Limpeza Urbana no Estado de São Paulo (Selur) e a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública (Abrelpe).
   A prorrogação dos prazos sem o provisionamento de verbas é um salvo-conduto para que os lixões eternizem-se. Está se pensando somente no conforto de todos os ocupantes de cargos públicos e eletivos responsáveis pela aplicação da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Sua preocupação é apenas estar adimplentes com os prazos, pouco importando a saúde pública e o meio ambiente. Caso o Congresso Nacional ratifique tão distorção, Brasília respirará aliviada , a despeito do odor do ar: impunemente, os lixões p dentre os quais o da própria capital federal - resistirão impávidos ao bom senso. ( ARIOVALDO CAODAGLIO, cientista social, biólogo, estatístico e pós-graduado em Meio Ambiente e presidente do Sindicato das Empresas de Limpeza Urbana no Estado de São Paulo, página 2, ESPAÇO ABERTO, segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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