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sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

A VIDA SEM COMPUTADOR



   Aqui em casa temos dois computadores: um para mim, outro para minha mulher. De repente, sem explicações, recusou-se a rodar os programas mais importantes. Como agendar a visita de um técnico no carnaval é mais difícil do que marcar audiência com o papa, o computador dela continua quebrado. 
   O computador que eu uso, um laptop que pertenceu à minha mãe, é feito o sertanejo de Euclides da Cunha: antes de tudo, um forte. Raramente me dá problemas. Eis que ontem, quando liguei a máquina para escrever esta coluna, o bicho resolveu dizer que não estava em condições de trabalhar. 
   Seria um protesto contra o conteúdo de minhas crônicas? Bem, por tudo que eu já escrevi, tenho certeza de uma coisa: petista ele não é. 
   Entrei em leve desespero. Até rezei um pouco para Santo Expedito, especialista em causas urgentes. Já estava pensando em alternativas – inclusive as mais malucas, como comprar um computador novo - quando me ocorreu parar e dar um tempo a ele. Fui tomar com café com a Rô, ver se o Pedro estava dormindo bem, trocar a água e a ração do cachorro, quem sabe lavar a louça. Entrementes, rezar.
   Quando tomava café, eu disse a Rô:
   - Computador quebrado não é nenhum bicho de sete cabeças. E mostrei a ela um dinossauro de três cabeças que é monstro do mal quando eu o Pedro brincamos de Star Wars. O jeito é rir!
   Os mais jovens podem não acreditar, mas eu venho de um tempo em que não existiam computadores. Nem celulares. Nem Internet. Nem Google. Nem Facebook. Na sala de aula do curso de jornalismo, em 1989, havia dezenas de máquinas de escrever, quase todas quebradas. A minha máquina era interessante: como eu havia quebrado, por uso excessivo, o chumbinho da letra A, todos os meus textos eram escritos sem a primeira vogal, que só era colocada nas palavras depois, com caneta Bic. Uma das minhas estratégias para paquerar as meninas era fazer o convite:
   - Vamos lá na república botar letra A nos meus textos?
   A primeira matéria que fiz na FOLHA , em 1992, foi escrita numa velha e boa Lexikon. Essa tinha A. Era um perfil de Enrivelto Martins, escrito em 20 linhas e 70 toques (lembra, Célia Musilli?). Até hoje, quando me pedem para escrever alguma coisa minha reação natural (a custo contida) é perguntar:
   - Quantas laudas? 
   Depois de tomar café e brincar com o bicho de três cabeças, voltei silenciosamente para o escritório. Por um momento pensei como seria a vida se subitamente todos os computadores pessoais resolvessem desligar ao mesmo tempo, acompanhados de seus colegas celulares. Talvez fosse um mundo caótico, talvez fosse um mundo mais humano, em que os pais teriam mais tempo para brincar com os filhos e rezar.
   Mas o computador já tinha voltado à ativa, com a ajuda de Santo Expedito e minha mãe. Eis por que vocês sete estão lendo esta coluna. ( CRÔNICA extraída da página 3, caderno Folha Cidades, espaço AVENIDA BRASIL – por PAULO BRIGUET. Fale com o colunista: avenidaparaná@folhadelondrina.com.br sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA.

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