Páginas

sábado, 19 de dezembro de 2015

A PERDA NA COLHEITA



    Era meado de março e a colheita de soja estava a toda na região norte do Paraná. Tinha um sol para cada um naquele dia, tamanho o calor que fazia nas roças próximas de Londrina. Saí naquele calor infernal para fazer uma matéria sobre produtividade da soja para o jornal da cooperativa. 
   Seguindo a sugestão do agrônomo da cooperativa, fui entrevistar uma cooperativa que já tinha um bom histórico de produtividade e estava colhendo uma boa safra. Também prestei atenção no conselho do amigo. Ele é um produtor bem tecnificado, só tem umas manias meio esquisitas”, disse o técnico. 
Estrada para cá, poeira para lá, cheguei na propriedade para fazer a matéria. A entrada da fazenda ficava em um parte alta e, lá de cima, vi o produtor no meio da lavoura trabalhado na colheita da soja.
   Mas percebi que aquela cena estava meio estranha e logo me veio à mente o que o agrônomo tinha dito sobre as excentricidades do produtor. Normalmente, na hora da colheita o produtor ou está dirigindo a colheitadeira ou o caminha que irá leva a produção na cooperativa. 
   Assim que desci mais perto, vi que ele estava atrás da colheitadeira, recebendo praticamente na cara toda a palhada que saía da máquina. Então, me perguntei: “O que esse sujeito está fazendo aí atrás, no meio dessa poeira toda?”
   Quando cheguei ainda mais perto , tomei um susto. Além de estar onde ninguém fica, na traseira da colheitadeira, o produtor ainda estava vestindo uma jaqueta e capacete de motociclista, com a viseira fechada, naquele calor todo. 
   Não saia se saía correndo ou fazia a entrevista. Como tarefa dada é tarefa cumprida, lá fui eu interromper aquela cena inusitada e me apresentar para o cooperado. Cheguei perto dele, gritei meu nome e nada. O barulho da colheitadeira, mais a poeira da palhada e o capacete na cabeça me tornavam invisível para ele. 
   Uns cinco minutos depois, e já não entendo mais nada, finalmente ele sai detrás da colheitadeira e veio conversar comigo. “Olá, tudo bem? Você que é o repórter da cooperativa e que veio me entrevistar?”, perguntou. 
   Devidamente apresentado, minha pauta para a matéria foi para o espaço e agora minha única curiosidade era saber o que diabos esse sujeito estava fazendo, de jaqueta e capacete, atrás de uma colheitadeira de soja.
   Se a cena foi esquisita, a resposta foi surreal. “Essa é uma técnica que inventei para saber a quantidade de perda na colheita. Durante dez minutos, fico atrás da colheitadeira contando os grãos de soja que a máquina joga junto com a palhada e que batem na viseira do capacete. Depois faço as contas e descubro quantos quilos de soja estou perdendo por hora de colheita”, me disse diante de toda sua autoridade na inovadora técnica de contabilizar as perdas na colheita. 
   Fiz a entrevista com o cooperado e depois fiquei contente em saber que ele colheu muito bem ao final da safra. Só não consegui saber qual foi o índice de perda dele com essa técnica “revolucionária”. ( ANDRÉ TOTTTENE, jornalista e coordenador de Comunicação da Cooperativa Integrada, página 2, caderno FOLHA RURAL, espaço DEDO DE PROSA, sábado, 19 de dezembro de 2015, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA). 

Nenhum comentário:

Postar um comentário