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domingo, 22 de novembro de 2015

O SABIÁ E O POETA




   Se há alguém que sabe assobiar, é o sabiá. Tem um aqui na chácara cantando cedinho, de tarde e noitinha. Canta tanto que espanta, a gente se pergunta como pode. É a energia do amor, diz Dalva, ele canta para encantar a sabiá.
   O cantor apaixonado lembra o poeta Gonçalves Dias da Canção do Exílio: “Minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá”...
   Ele escreveu isso na Europa, onde tentava melhorar da tuberculose, mas piorou. E lá, doente, encontrou ao acaso sua paixão Ana Amélia, que fez não o reconhecer.   É que ele tinha sido rapazola pobre e órfão que, conforme Steve Wonder, podia ser pior, podia ser negro. E era mesmo “pior”: mestiço de negro e índia, somava dois preconceitos. Mas era também tão talentoso que foi estudar Direito em Portugal custeado por amigos, principalmente Teófilo Leal. 
   Voltando ao Brasil advogado e já com renome literário, conheceu em Fortaleza a irmã do amigo, linda mocinha a quem dedicou poemas mas esqueceu, indo morar no Rio de Janeiro. Mas o destino não esqueceu: voltando ao Maranhão anos depois, ele se apaixona pela bela mulher, sabendo que a família não aprovaria a união. Ela sugere ser raptada, mas ele prefere respeitar a família benfeitora, e novamente volta ao Rio sozinho.
   Adoecendo, volta à Europa, já famoso poeta, com casamento desfeito – como ela, quando se reencontram em Paris e ela magoada o desconhece. Ele então escreve o doloroso poema Mais Uma Vez, Adeus, com versos como estes: “Mas que tens? Não me conheces?/ De mim afastas teu rosto?/ Pois tanto pode o desgosto/ transformar o rosto meu?/ Sei a aflição quanto pode,/ sei quando ela desfigura,/ e eu não vivi na ventura.../ Olha-me bem, que sou e   Volta ao Brasil muito doente, em navio veleiro que naufraga no litoral do Maranhão, e o poeta é o único que não se salva, esquecido no leito do camarote, já diante da praia com palmeiras e sabiás como no se poema: “Não permita Deus que eu morra/ sem que volte para lá./ Sem que ainda aviste as palmeiras / onde canta o sabiá!
    Sua morte aos 41 anos, causou tanta comoção que seu versos foram inseridos no Hino Nacional: “Nossos bosques tem mais vida/ nossa vida mais amores”. Rapazola, fui apaixonado por seus poemas, que sabia de cor, ou seja, guardados no coração. E hoje, pensando em sua morte tão precoce e trágica, por estar vivo dou graças a Deus sempre que canta nosso sabiá. ( Crônica do escritor londrinense Domingos Pellegrini, página 21, cultura, espaço DOMINGOS PELLEGRINI 
d.pellegrini@ercomtel.com.br facebook.com/escritordomingospellegrini fim de semana, 21 e 22 de novembro de 2015, publicação do JORNAL DE LONDRINA).

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