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segunda-feira, 31 de agosto de 2015

O SENHOR DAS ESCULTURAS


   

   Henrique de Aragão chegou a Ibiporã em 1965  a convite do padre José Zanelli, onde permaneceu trabalhando incansavelmente em suas obras.

   Ainda lúcidos, mas com devaneios, muitas dores e movimentos restritos, o artista plástico Henrique de Aragão certo dia tentou moldar o lençol da cama onde esteve pelos últimos quatro meses. Era uma tentativa de retornar o trabalho que o tornou reconhecido não somente aqui em Londrina ou em Ibiporã, onde morava desde os fins da década de 1960. De abril para cá, o câncer de próstata com o qual lutava há quase seis anos avançou e atingiu os ossos, levando-o à morte anteontem, por volta das 16,20.
   O paraibano Joaquim Henrique de Aragão nasceu em Campina Grande. No dia 1º de agosto de 1931. Veio para Ibiporã  trazido pelo padre Jose Zanelli, italiano que se estabeleceu na cidade em fins da década de 1960 e que desenvolveu um trabalho muito grande na área cultural – música, teatro e dança.

   BARRACÃO

   Quando Henrique se mudou, em 1967, ganhou da prefeitura um antigo barracão para realizar suas atividades. ”Ele  veio em 1965 a convite do padre José Zanelli. Depois, veio definitivamente. E eu morava em frente de onde ele veio se estabelecer”, conta Marilza Ribeiro, bancária aposentada que se considera discípula do artista.
   Marilza tinha 8 anos de idade.  “Eu  rabiscava as paredes, a calçada. Então minhas irmãs diziam que a solução seria ter aulas com o Henrique. Tive aulas enquanto criança, de tarde, e depois como adulta, aos domingos”, lembra.
   Nesta  época, ela fez também aulas de teatro, literatura e cerâmica.  “ Enquanto  a escola funcionou, eu tive aulas. Ele também me deu aula de educação artística na quinta série. “ Embora não tivesse filhos, Henrique de Aragão era conhecido pelo amor com que tratava as pessoas. “ Era como um pai, um tio, um irmão amoroso. Foi ensinando a gente a se soltar, a demonstrar sentimento. A manifestar amor”.
   Apesar de amoroso, era uma pessoa difícil. Quem conta é a professora aposentada Benedita de Fátima Ribeiro, muito emocionada ao falar do amigo. “ Ele não era só meu melhor amigo, era padrinho do meu filho. Ele dizia que eu era a nora postiça dele e que meus filhos eram seus netos”. Benedita o conheceu em 1978. O ex-marido, na época namorado, era muito amigo de Henrique e a trouxe para conhecê-lo. Logo depois o casal se mudou para Ibiporã. Hoje, ela mora em Peruíbe, no litoral paulista, próxima dos filhos.

   AULAS

  “ Comecei a frequentar a Casa de Artes, por conta do teatro, do Grupo Célula. Cheguei a dar aulas de educação artística e, e por influência dele (Henrique), larguei o outro curso (filosofia)”, lembra Benedita. A última vez que se viram foi há quatro semanas, quando ela veio visita-lo. “ O câncer veio em 2009, mas ele lutou bem até o ano passado. No Natal passado nós cozinhamos juntos, tinha uma torta de nozes que ele gostava muito. Em fevereiro e março começou a debilitar.
   A doença tirou de Henrique o que ele mais gostava de fazer: esculturas. “ Ele começou a parar em Abril, não estava com muitos movimentos. Ele sentia dores nas mãos, mas queria fazer esculturas. Não dava. Até tentamos fazer umas pinturas ( o artista chegou a pintar duas ou três telas ) . Fui um dia lá e ele me disse: ‘ veja o que estou fazendo ‘. E começou a moldar um lençol para tentar fazer uma escultura. Ele estava lúcido, mas sem expressão. Só tinha olhar “, recorda Marilza.

   ACERVO

   Obras serão preservadas por associação


   As tintas que Henrique de  Aragão usou na última vez em que tentou pintar ainda marcam uma mesa da casa onde funcionava a associação que leva seu nome, criada por desejo dele com o objetivo de preservar a obra e manter a memória. No mesmo barracão onde se instalou, hoje Casa de Artes e Ofícios Paulo VI, onde também era o ateliê do artista. Algumas obras de Henrique estão em capelas, praças e na Igreja Matriz de Ibiporã. O Cristo Libertador hoje está restaurado e instalado em frente à Secretaria de Educação de Ibiporã. Em Londrina, existem obras de Henrique Aragão na Igreja Sagrados Corações, na Capela do Seminário São Vicente Palotti e o Monumento ao Passageiro, na rotatória da Rodoviária. ( FÁBIO
   LUPORINI  fabiol@jornaldelondrina.com.br  página 23, cultura, MEMÓRIA, publicação do JORNAL DE LONDRINA, quinta-feira, 27 de agosto de 2015.    

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