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sexta-feira, 5 de junho de 2015

O TEMPO DEVE PARAR



   Lá se vão muitos anos desde que li “O Tempo deve Parar”, de Aldous Huxley. Os enredos do autor inglês que permanecem mais vívidos em minha memória são os de “Contraponto” e “Admirável Mundo Novo”. “O Tempo deve Parar” me comove acima de tudo pelo título, um dos mais belos de que tenho lembrança.
   Mas por que recordo o livro de Huxley? A explicação é simples: por alguns dias, o Relojão parou de novo.
 pouco órfão. É como se o coração da cidade parasse de bater e o tempo, esse inimigo íntimo, não passasse mais.
   No auge do desespero, Ana Karênina olha para o relógio e não consegue ver as horas. A personagem de Tolstoi enxerga claramente todos os ponteiros, os números e o mostrador – mas simplesmente não é capaz de decodificar a informação. Um daqueles raros instantes em que a eternidade emerge do tempo.
   No filme “O curioso caso de Benjamim Button”, há um relógio na estação de trem que não me lembro de ter visto no conto original de Fitzgerald. Gira ao contrário. Foi construído por um engenheiro que perdeu o filho na guerra. O pobre homem tem a esperança que o tempo caminhe ao contrário e o jovem soldado volte à vida.
   às vezes eu fico pensando no que aconteceria se o Relojão girasse no sentido anti-horário. Levar-nos-ia de volta para uma cidade que não existe mais? Poderíamos frequentar o Clube da Esquina, o Dunk’s , o Apreitivos do Paulinho, o Beco, o Carlão, o Jota, o Araucaria, a Casa do Vinho? Ou assistir a um show da banda Nem Morre nem Tem? Seria possível entrar na República da Humaitá, 143? Encontraríamos o Tiola no Buraquinho do CCH? Haveria Assembleia Geral Universitária chamando para greve e “ocupação pacífica” da Reitoria?
   Na verdade, eu não quero nada disso. Bastaria ouvir a voz de meu pai ou ver o sorriso de minha mãe por alguns instantes. E as flores amarelas espalhadas pelo chão da praça. As flores marelas, enquanto eu lia Henry Miler... ( Texto extraído da página 11. Espaço DIA DE CRÔNICA  PAULO BRIGUET  briguet@jornaldelondrina.com.br  www.jornaldelondrinalcom.br/blogs/comoperdaodapalavra  publicação do JORNAL DE LONDRINA, sexta-feira, 5 de junho de 2015).  

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