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domingo, 7 de junho de 2015

A ÁRVORE E A FÉ

                                                                                                                                         
                                                                                                       

   Diante do horror das decapitações e das demolições  de monumentos arqueológicos, contemplo as árvores da chácara.
   As árvores são o contrário dos fanáticos, que pregam uma só crença para todos, sob pena de morte, e com regulamentos de  todo tipo para a vida, Não vestir isto, não comer aquilo, rezar assim-assim.
   Enquanto isso as árvores são fontes de vida e generosidade. Não dão apenas sementes, para reprodução, mas sementeiam e frutificam para os pássaros, os bichos, os humanos, como também dão folhas para a terra, flores para o vale, galhos para o vento, perfumes para a noite, oxigênio para o planeta.
   Porque existiriam tantos frutos da terra se não fossem para todos serem comidos  ou de alguma forma transformados? Porque existiriam tantos frutos do mar se não fossem para todos terem o direito de lutar pela vida? A vida não pode ser, além de uma luta, também uma festa em vez de apenas arena de sacrifícios?
   A árvore não escolhe onde nasce, nem nós. A árvore estará condenada a viver com mais ou menos sol e vento, em terra boa ou ruim, conforme onde germinar a semente. Também gente será católica, evangélica ou islâmica conforme o país e a família onde nascer, como também poderá mudar de crença quando crescer, ao contrário da árvore que é transformada em móveis ou lenha.
   Se temos essa liberdade de mudar, não será por criação divina? Querer que todos  tenham a mesma crença não será o mesmo que todas as árvores sejam iguais? Como haveria frutos se só houvesse  pinheiros?
   A variedade é o fermento da democracia, como a uniformidade é o cimento do fanatismo. O fermento faz a massa crescer, o  cimento é massa morta, condenado à erosão.
   O democrata abraça e confraterniza, o fanático rejeita e agride. Um culto ecumênico é tão mais bonito quanto mais religiões congrega, do católico ao umbandista, do evangélico ao espírita, do budista ao ateu. Sim, o ateu consciente não só respeita como participa do ritual ecumênico, como o cacto participa do jardim e também dá flores e frutos
   Sim, Pudin é o novo Hitler e o Estado Islâmico é o novo nazismo. Mas Mandela não morreu. Ghandi continua tecendo sua roca. Tenhamos fé no jardim da vida. A árvore da democracia tem apenas dois mil anos, e continua a crescer e se transformar. Os martelos, as foices, as picaretas e as bombas não vencerão, porque o destino humano é melhorar, tenhamos fé.
   Boto o ponto final nesta crônica, olho pela janela e – surpresa – a laranjeira começou a florir! Vou lá cheirar o perfume, eis que onde enterrei o lixo orgânico a seu pé, está brotando uma aboboreira. E a palmeira-real abriu seu cacho de flores brancas que virarão coquinhos vermelhos. Como não ter fé na vida e na sua variedade? ( Texto escrito por DOMINGOS PELLEGRINI, página 17, espaço DOMINGOS PELLEGRINI  d.pellegrini@sercomtel.com.br publicação do JORNAL DE LONDRINA, domingo, 7 de junho de 2015).        

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