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sábado, 21 de fevereiro de 2015

ARROZ DE TAIOBA



     No começo do ano passado minha esposa foi visitar parentes em Ponte  Nova,  estado de Minas Gerais, onde passou alguns dias na casa dos tios Sebastião e Maria.  Assim como muitos mineiros, Sebastião e Maria vieram para o Norte do Paraná na década de 1960 para trabalhar nas fazendas de café.  Naquela época era comum famílias  inteiras de mineiros virem trabalhar nas lavouras e algumas delas fincavam raízes na terra vermelha, outras voltavam para Minas  ou se dispersavam por outras localidades.
     Sebastião e Maria, mais conhecidos como Tião das Linguiças e Dona Tuca, depois de muitos anos  de trabalho árduo no Paraná, acabaram retornando para Minas.  Essa viagem aumentou o interesse da minha esposa pela comida mineira, afinal, quem pode fazer desfeita a uma canjiquinha, leitão à pururuca, bambá de couve, frango com quiabo ou feijão tropeiro, servidos com a cordialidade mineira? E resistir aos doces de mamão, ambrosia ou queijo com goiabada? A cozinha mineira é singular, tem um sabor de história, remete aos costumes dos índios, dos escravos e às tradições dos colonizadores portugueses, dos bandeirantes e tropeiros. Por isso se utiliza muito de produtos como milho, mandioca, carne de galinha e de porco, além de uma variedade de temperos, pimentas e plantas, inclusive algumas já esquecidas por grande parte da população, como o lobrobó  (ora-pronóbis)  e a taioba.
     Assim, para minha surpresa, ao retornar da viagem ela retirou da mala algumas mudas de taioba, planta muito consumida  pelos mineiros, dizendo que seus tios nos haviam mandado para que eu as plantasse no quintal de casa.  Fiz isso de imediato e dali a poucos dias as mudas já estavam firmes na terra rosa de Londrina.
     A segunda surpresa foi observar que após alguns meses a taioba havia se esparramado pela horta, tomando o lugar das outras plantas.  Não tive dúvidas, passei o facão nas folhagens e comemos taioba refogada por vários dias. Fiz isso sem saber que haveria uma terceira surpresa., a qual me trouxe muito trabalho, porque no final do ano, ao atender um telefonema, constatei com alegria que quem nos procurava  era o Tião das Linguiças: pessoa querida, simples e sábia, jeito mineiro de ser. E na sua mineirice relatou que viajariam ao Norte do Paraná para rever os parentes, beijar o chão paranaense e comer um lombinho de porco com arroz de taioba, pois sabia que as mudas haveriam de ter vingado, disse ele, na melhor terra do mundo.
     Conhecendo a cultura mineira, ficou claro pra mim que ele agiu como bom mineiro, dando mudas de caso pensado, ou seja, comer arroz de taioba quando viesse na nossa casa.  Como havia arrancado as taiobas da horta, lá fui eu  percorrer as feiras, falar com os amigos, e explicar para as pessoas o eu era taioba.  A tarefa foi difícil e só se tornou possível quando deixei a cidade e fui para a zona rural buscar uma ramada no sítio do Zilo no distrito de Guairacá, na beira do rio Tibagi. Quando o almoço ficou pronto contei aos tios sobre o ocorrido, o que foi motivo de muitas risadas. O arroz de taioba ficou delicioso e aprendi que não se joga fora um presente sem pensar nas intenções de quem nos presenteou. ( Texto escrito por GERSON ANTONIO MELATTI, leitor da FOLHA RURAL, dela extraído, pág. 2, espaço Dedo de Prosa, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA, sábado, 21 de fevereiro de2015).

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