Neto pergunta quem é meu herói preferido, Batman ou Superman? Digo que deixei de ter heróis há muito tempo, daí vamos comer em pequeno restaurante popular na vila, e eis que o sanitário cheira a limpeza e tem até fio dental. Então digo que tenho, sim, meus heróis.
Herói é quem abre restaurante, num bairro pobre, mas com até fio dental no sanitário.
Herói é o pai que sai de casa cedinho para trabalhar e só volta à noite, perguntando a cada um como foi seu dia e pronto para ouvir e conversar.
Herói é a professora que prepara suas aulas com amor para turmas que trazem de casa revolta, descrença e outras mazelas da pobreza sem esperança.
Herói é o lixeiro que salta do caminhão para pegar pencas de sacos, alguns escorrendo chorume, e entretanto sorri dando bom dia.
Herói é quem insiste em separar o lixo, mesmo sabendo que a coleta não será seletiva.
Herói é o funcionário público que atende a todos com gentileza e presteza o tempo todo.
Heroína é a mulher que, no ônibus, pergunta alto se alguém está pensando que é fruta para ser apalpada, porque, se fosse, seria abacaxi, então não bote mais a mão em mim!
Herói é o menino convidado a dar uma tragada no cachimbo, uma tragadinha só, pra ver como é bom a primeira vez, mas diz não, se isso fosse bom mesmo a primeira vez não precisava ser de graça.
Heroína é também a menina que diz às amigas não, não quero passar batom porque ainda sou criança.
Herói é o cidadão que paga 40% de imposto, embutido, embutido em tudo que compra, e pede CPF na nota fiscal para... pagar mais imposto com desconto.
Heroí é a moça que pede calma, calma aí, ou você põe camisinha ou vamos parar por aqui porque não quero ser mãe solteira.
Herói é o comerciário que toma o ônibus lotado e vai apertado em pé, aguentando som alto e sacolejo de mil buracos, para chegar ao trabalho com bom humor para a freguesia.
Heroína é quem limpa, lava, passa, cozinha, arruma, sabendo que no dia seguinte terá de limpar, lavar, passar, cozinhar e arrumar, sem reclamar.
Herói é quem recebe proposta de propina e denuncia, até agora um tipo raro de herói, decerto porque pra gente assim não oferecem propina.
A grande façanha deles é fazer o certo sempre, anonimamente, sem nem pensar que, sem eles, nem existiria o que chamamos civilização, essa construção dos heróis do dia a dia.
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A BANANEIRA
Se frutas tivessem vaidade, ah, como a banana teria o que falar! “Sou a mais fácil de descascar, tão macia e gostosa, para ser comida pura ou com mistura, amassada com aveia, transformada em bananada ou tantos doces. Minhas folhas são tão grandes quanto bonitas e meu porte é elegante, meu pé é fácil de cortar e no solo vira adubo... Precisa mais?”
Mais: aqui na chácara, colhemos cada cacho só depois que começa a amarelar, para os passarinhos bicarem sua parte e, assim, nossas bananeiras também cantam. E, como mesmo assim não damos conta do resto do cacho, picamos as bananas mais maduras para cozinhar em panela de barro, sem mais nada, apenas mexendo com colher de pau e, quando o caldo engrossa borbulhando bonito, pronto, eis bananada pronta que só e sem tico de açúcar. Não é à toa que a banana estava sempre na cabeça de Carmem Miranda. (Crônicas escritas por DOMINGOS PELLEGRINI, jornalista, professor e escritor, d.pellegrini@sercomtel.com.br página 3, caderno FOLHA 2, 27 e 28 de janeiro de 2018, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).
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