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segunda-feira, 24 de abril de 2017

PROMESSA RESGATA TRADIÇÃO NOS 1.500 M

O nadador Guilherme Costa, destaque brasileiros nos 1.500 m livre, posa após treino no Parque Aquático Maria Lenk 

   NATAÇÃO: GUILHERME Costa, 18, busca marca histórica na prova que deu 1ª medalha olímpica do Brasil na modalidade

   Ao cumprir a mais longa distância das piscinas em 15min05s23, Guilherme Costa, 18, fez mais do que conquistar um recorde sul-americano para o combalido esporte aquático do país.
   Sua performance no último dia 1º, em um torneio regional em Santos, trouxe de volta aos holofotes a prova que primeiro pôs o Brasil no mapa da natação olímpica. E que por décadas permaneceu relegada a plano secundário.
   O fluminense, nascido em Itaguaí (a cerca de 70 km de distância do Rio), fez reascender a expectativa de bons resultados de um brasileiro nos 1.500 m livre, evento outrora de tradição e cobiçado entre os competidores nacionais.
   Foi exatamente nos 1.500 m livre que Tetsuo Okamoto conquistou o primeiro pódio do país em Jogos Olímpicos (bronze em Helsinque -1952).
   Ainda que seja cedo para almejar outra façanha olímpica, a marca obtida por Guilherme é promissora. Até esta sexta-feira (21), ela era a 13ª melhor do ano. Ainda que não fique no topo 10 internacional, é seu potencial o que mais salta aos olhos. 
   Em um ano, o fundista reduziu em 21 segundos sua marca pessoal na distância – na seletiva olímpica realizada em abril de 2016 ele fora o terceiro, com 15min26s94.
   O tempo registrado há poucos dias comprova a sua ascensão. Em Santos, Guilherme superou em seis segundos o antigo recorde do país, que pertencia a Brandonn Almeida desde 2015 (a5min11s70). 
   Também foi três segundos mais veloz que o prévio recorde sul-americano, até então de posse do equatoriano Esteban Enderica (15m08s57). 
   Entre os mais jovens destaques da prova no cenário internacional, Guilherme prevê nova evolução para o início de maio, no Troféu Maria Lenk, no Rio. A principal competição do calendário nacional classifica para o Campeonato Mundial de Budapeste, que ocorrerá em julho. 
   Ele sabe que quebrar a barreira dos 15 minutos é imperativo para cobiçar para cobiçar finais em Olimpíadas e Mundiais. 
    "Eu estou muito confiante para já entrar na casa dos 13 minutos no Maria Lenk”, afirmou Guilherme, que nadará a competição em casa – ele treina no Parque Aquático Maria Lenk, palco do evento. 
   O primeiro ser humano a percorrer os 1.500 m livre abaixo da desejada marca foi o russo Vladimir Salnikov, nos longínquos Jogos Olímpicos de Moscou, em 1980. 
   Quase quadro décadas depois, ainda nenhum brasileiro obteve a façanha. “Minha meta é nadar 14,59s ou 14m58s. O que vier abaixo de 15 minutos vale”, disse. 
   Se conseguir concluir o objetivo, Guilherme pode aspirar a sonhos mais altos e minar tabus brasileiros. 
   Desde 1976, quando Djan Madruga terminou em quarto lugar nos jogos de Montréal, o país não tem um finalista olímpico na prova. 
   Na Rio 2016, foi necessário no mínimo uma marca de l4m55s40, tempo feito pelo norueguês Henrik Christiansen, para avançar à final. 
   Em Campeonatos Mundiais, o jejum não foi tão grande. Luiz Lima, hoje secretário de alto rendimento do Ministério do Esporte, foi o último a ter vaga entre os oito primeiros , na edição de Perth-1998. Terminou em sexto lugar. 
   Contudo, desde a edição de Fukuoka-2001 do Mundial de natação, quando Lima e Bruno Bonfim competiram, nenhum nadador do país aparece nos 1.500 m livre. 
   Brandonn Almeida e Miguel Valente se classificaram para os Jogos do Rio – os primeiros a participarem em 16 anos -, mas ficaram longe de avançar para a decisão. 
   “Quero voltar a pôr o Brasil lá, na elite dessa prova”, afirmou Guilherme. 
   Para tanto, ele chega a percorrer 70 mil metros por semana. Cortou frituras, pão e leite e adotou batata doce no café da manhã em nome da obtenção de preciosos segundos. 
   “Em 2020, nos Jogos de Tóquio, quero medalha e acredito que com minha melhora é possível disputá-la. Penso em nada 14m38s, mas sei o quanto tenho que melhorar a cada ano”, disse. 

   ‘Cachorrão” nas piscinas, atleta é tímido fora dela

   Guilherme Costa é mais conhecido no meio esportivo como “cachorrão”.
   O apelido pode indicar perfil permissivo, mas ele vai na contramão. Reservado, gosta de receber amigos para jogar videogame. 
   A razão da alcunha é outra. Há alguns anos, em visita à Praia Secreta, em Angra dos Reis, foi mordido por um cachorro. 
   Poucas semanas depois, ao voltar ao local, descobriu que o animal morrera. As piadas sobre a letalidade do nadador pulularam. “Meu amigo que estava comigo e meu técnico à época puseram o apelido, que pegou”, lembrou. 
   Ele tem tornado a alcunha conhecida no âmbito esportivo nacional. 
   Antes especialista nos 200 m borboleta, prova na qual chegou a ser campeão brasileiro na base, Guilherme mudou sua especialidade para os 1.500 m livre por sugestão do técnico Rogério Karfunkelstein.
   “Quero motivar os mais novos a nadar as provas de fundo, retornar uma tradição perdida no Brasil. Os jovens querem nadar os 50 m e 100 m livre por terem em quem espelhar.”
   A alusão é aos medalhistas olímpicos César Cielo, Gustavo Borges e Fernando Scherer, todos velocistas. “É pelo exemplo que dá para motivar a molecada”, afirmou. (PRC.) (PAULO ROBERTO CONDE – DE SÃO PAULO, página B-7, caderno esporte, sábado, 22 de abril de 2017, publicação do jornal FOLHA DE S.PAULO).

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