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domingo, 14 de agosto de 2016

EM BUSCA DO IMAGINÁRIO



   O Pokémon Go propicia uma nova aventura urbana, caçar criaturas virtuais em lugares reais cheios de história

   O que me encanta na caçada aos pokémons é o encontro da realidade com a fantasia. Coisa para surrealista nenhum botar defeito. Os pokémons são encontrados com facilidade nos locais históricos das cidades, que passaram a se chamar pokéstops porque estão no mapa do jogo.
   Em Londrina, o ponto do calçadão em frente ao Ouro Verde agora vive ocupado por uma multidão que deve agradar aos fantasmas do velho teatro que esperar ressurgir das cinzas. Penso que a antiga Fênix está na expectativa de pegar o Pikachu, nada como um encontro da velha mitologia com a moderna. Neste caso, a tecnologia favorece a imaginação. 
   Da mesma forma, o Bosque converteu-se num território de caçadas a seres imaginários, enquanto as pombas sobrevivem a todas as novidades dando graças a Deus por não serem mais o principal ponto de interesse do local. Olhando para o celular ninguém se importa com o que vem de cima. Do antigo território de risco - seja por medo de assaltos ou pela sujeira das aves – o Bosque transformou-se numa verdadeira “piazza”, onde dia e noite uma multidão procura criaturas imaginárias. Se a imaginação é a arte de combinar ideias, nada mais apropriado a pessoas criativas do que tocar o intangível graças à tecnologia e a um acessório moderno – o celular que agora nos põe em contato com o outro mundo, ultrapassando a barreira da fantasia para encostá-la na realidade. 
   Acho divertido ver tantas pessoas de olhos baixos enxergando aquilo que nem todos veem e enquadrando na telinha personagens fictícios. Dá a impressão de que entrei num livro de Asimov ou num filme de Stanley Kubrick que se passa ai bem perto da minha janela, numa verdadeira odisseia. 
   De vez em quando, gritos e urros dão conta de que alguém encontrou uma criatura imaginária que foi capturada por uma bola também imaginária , o que me faz pensar que as coisas redondas sempre se prestam a atividades lúdicas. O incrível é que já existem serviços de táxi ou helicóptero para caçar pokémons. 
   Mas não basta capturar os bichinhos, é preciso treina e batalhar com os seres virtuais e, nesta parte, minha aprendizagem do jogo vai depender de muito esforço. Percebi que os métodos para fazer um Pokémon “evoluir” se assemelham à dificuldade que tenho para resolver teoremas, são tantas regras que prefiro capturar criaturas menos exigentes, como os gatos que se aproximam ao simples cheiro de uma sardinha, evoluindo para hábitos que os deixam completamente adestrados em pouco tempo. 
   Mas lembro-me que nos games de épocas remotas – entre 2010 e 2013, porque hoje é remoto tudo o que se passou há pelo menos 3 anos – havia pokémons que evoluíam a partir de algumas emoções como a felicidade, ampliando o elo entre o treinador e sua criatura. 
   De certa forma, eles também nos sociabilizam e nos deixa mais felizes à medida que partimos para aventuras que são um modo de evolução na convivência urbana. O jogo tirou de casa jovens sombrios habituados a viver basicamente com seus tablets entre quatro paredes. Agora andam em bandos pelas ruas e, ainda que só enxerguem a telinha, trocam informações cara a cara para saberem como melhorar no jogo, estabelecendo um diálogo especializado e, nem por isso, menos importante na escala das trocas humanas, demasiadamente humanas. 
   As expressões em inglês para pegar pokémons –“to catch a Pokémon- nos põe em sintonia com outro tipo de diálogo, dinâmico, rápido, como as criaturas virtuais que podem estar aqui, ali ou escaparem de vez. No mais, não fique triste se o pokémons escapou - “the pokémons broken free” – sempre haverá uma nova oportunidade para quem caça aquilo que não existe ou existe num mundo de faz de conta no qual as perdas significam apenas que você precisa de mais treino.
   E vou por ali porque acabo de avistar o Mew.Gotcha! (Crônica escrita peloa jornalista e escritora CÉLIA MUSILLI, celiamusilli.@gmail.com caderno FOLHA 2, coluna CÉLIA MUSILLI, domingo, 14 de agosto de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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