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segunda-feira, 29 de agosto de 2016

DOENÇA DO CIGARRO SERÁ 3ª MAIOR CAUSA DE MORTE EM 2020


   Silenciosa e incurável, DPOC provoca diminuição progressiva da capacidade respiratória; estima-se que em Londrina 30 mil pessoas tenham a doença. 

   As restrições às publicidades e aos locais de uso do cigarro até conseguiram reduzir o número de fumantes no País, segundo o Ministério da Saúde (MS). A quantidade de pessoas doentes por causa do cigarro, no entanto, continua crescendo. Isso porque algumas doenças surgem mesmo depois que o fumante abandona o vício, como a doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), que, segundo estimativas de pesquisadores, em 2020, será a terceira maior causa de morte no mundo, atrás apenas das doenças cardiovasculares e neurológicas. 
   Segundo dados do MS, a DPOC mata cerca de 100 pessoas por dia no Brasil. “A DPOC provoca uma diminuição progressiva da capacidade respiratória causada de duas formas: pela obstrução dos alvéolos pulmonares, no caso de enfisema, e dos brônquios, no caso de bronquite. Normalmente, ocorrem os dois tipos ao mesmo tempo”, explica o pneumologista e professor da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Alcindo Cerci Nero.
   Um levantamento feito pelo especialista mostra que, na última década, a doença foi a quinta maior causa de internamento no Sistema Único de Saúde (SUS), entre os maiores de 40 anos, com cerca de 200 mil hospitalizações por ano. Apesar de pouco conhecida pela população, a DPOC acomete aproximadamente 11 milhões de brasileiros, das quais, estima-se, 70% permanecem não diagnosticadas. Segundo Nero, com base nos dados de prevalência, é possível estimar, só em Londrina, 30 mil pessoas tenham a doença. 
   A ocorrência da DPOC na população tem aumentado, segundo o pneumologista, por ser esta uma doença crônica, que evolui silenciosamente e não tem cura. “Mesmo depois que a pessoa deixa de fumar, ela pode ter o problema. Depende de quanto ela fumou e por quanto tempo”, explica. O especialista afirma que, apesar de não ser a única causa, o tabagismo é o principal responsável pela doença. “A DPOC depende sempre de um agente externo: poluição, fumaça do fogão à lenha, da queima de biomassa. Mas quase sempre é o cigarro”, afirma. 
   O tratamento da DPOC consegue estabilizar o quadro do paciente, evitando o agravamento e prolongando o tempo de vida. Por isso, é importante que o diagnóstico seja feita no início da doença. Os sintomas iniciais são tosse, falta de ar, chiado no peito e cansaço, desconfortos que a maior parte dos fumantes costuma ignorar. “Sintomas mais específicos, como insuficiência respiratória, só vão surgir no estado avançado da doença”, conta Neto.
   SOFRIMENTO
   O aposentado Artur de Oliveira passou 60 dos seus 76 anos fumando. “Eram dois maços por dia e, dependendo do dia, não era suficiente”., conta. Apesar de receber alertas ao longo de toda a vida, ele nunca se preocupou com a possibilidade de uma morte precoce por conta do cigarro. “Não tinha medo de morrer. O que começou a me preocupar foi o sofrimento que o cigarro causa.” E o sofrimento dele começou há 20 anos, quando a respiração ficou muito comprometida por causa da DPOC. “Há três anos, quando eu ainda fumava, já estava dependendo de oxigênio em alguns momentos. Não conseguia andar da minha casa até a ambulância do Samu, parada na rua.”
   Foi quando ele teve que parar com o cigarro para não morrer. Oliveira iniciou o tratamento com medicamentos que o ajudaram a ter um pouco mais de qualidade de vida. Ainda assim, o fôlego é insuficiente até para as atividades mais rotineiras. “De uns dois anos para cá, minha mulher me ajudava a tomar banho, mas ela se foi. Agora, que sou sozinho, quando está frio, tem dias que eu não tomo banho, porque falta ar”, conta o aposentado. 
   DETERMINAÇÃO 
   A jornalista Telma Elorza fumou durante 31 anos, dos 18 aos 49 anos de idade, e só teve motivação suficiente para parar quando viu um grande amigo perder uma das pernas por causa de uma tuberculose, que teve como uma das causas o cigarro. “Soube que haviam grupos de apoio nos postos de saúde e um programa de quatro sessões semanais. Passe por avaliação médica e psicológica, participei das sessões e, a partir da terceira, recebi gratuitamente adesivos e bupropiana”, conta. 
   Hoje, há três anos sem fumar, “Telma garante que, apesar de conviver com muitos fumantes, nunca teve recaídas. “Já tive cigarro nas mãos e não fumei. Raramente, bate uma vontade, mas passa.” Para ela, é a determinação do fumante que vai definir se o vício vai ser superado ou não. “Se a pessoa não quiser parar de verdade, não tem tratamento que dê jeito. Eu decidi que ia parar e parei.”
   90% DE EX-FUMANTES TÊM RECAÍDAS
   Quem quer deixar o cigarro, encontra diferentes opções de tratamento, inclusive pelo Sistema Único de Saúde (SUS), mas pouca gente consegue a remissão definitiva. Por isso, o conselho dos médicos é não dar o primeiro passo. “Os programas de tratamento de tabagismo até tem um bom índice de sucesso imediato, mas ao longo do tempo só 10% dos ex-fumantes conseguem manter. Na maioria dos casos, eles sofrem recaídas, às vezes anos depois”, afirma o cardiologista Ricardo José Rodrigues.
   Os muitos prejuízos causados pelo cigarro todo fumante já conhece. O equívoco de quase todos eles ainda está em achar que vai ser capaz de parar de fumar quando achar necessário. “O grande problema está na adolescência, que é quando a maioria começa a fumar. Depois que começa é muito difícil parar”, garante o especialista.
   Os tratamentos mais comuns para o tabagismo, segundo Rodrigues, incluem três diferentes recursos: a vareniclina, a reposição de nicotina e o antidepressivo bupropiona.”A vareniclina é um medicamento oral que, para o cérebro, imita a nicotina. A pessoa tem um estímulo como o da nicotina, mas não tão intenso e sem levar a dependência física”, explica o cardiologista. 
   A terapia de reposição de nicotina mais comum é feita através de adesivos de nicotina, mas também já existem no mercado chicletes, pastilhas e sprays nasal de nicotina. “Este método lança no organismo, a quantidade de nicotina que ele está acostumado a receber através do cigarro, mas vai diminuindo gradualmente”, conta. 
   A bupropiona passou a ser utilizada no tratamento de fumantes depois que se notou que, como efeito colateral, ele amenizava os sintomas de abstinência do tabaco. “Ele aumenta a concentração de serotonina, noradrenalina e dopamina, diminuindo a ansiedade e a angústia e simulando a sensação de prazer da nicotina”, esclarece o especialista. 
   Segundo ele, a escolha do tratamento do tabagismo deve ser individualizada, de acordo com o grau de subordinação ao cigarro de cada paciente. “Quando a dependência é muito forte, é necessária a terapia tríplice que combina vareniclina, adesivo e bupropiona. Pode ser preciso até um acompanhamento psicológico ou psiquiátrico”, afirma. (J.G.) (JULIANA GONÇALVES - ESPECIAL PARA A FOLHA), página 10, FOLHA SAÚDE, segunda-feira, 29 de agosto de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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