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quarta-feira, 9 de março de 2016

PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA


   Após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que admitiu a reclusão do réu para fins de cumprimento da pena, desde que tenha sido condenado em segunda instância, os críticos passaram a argumentar que essa decisão fere o princípio da presunção de inocência, o qual, no Brasil, até então, e por força de norma constitucional determinava que a   hipótese de segregação carcerária somente pudesse vir a ocorrer depois do trânsito em julgado da sentença condenatória. 
   Alguns ilustres advogados, em especial, aqueles que defendem réus na Operação Lava Jato teceram críticas ferozes, afirmando que o Brasil além de ferir a sua Constituição distanciava-se do ordenamento jurídico-penal internacional, pois se isolava ao permitir a segregação do réu já após o seu julgamento em segundo grau, contrariando as normas legais/penais dos demais países. 
   O princípio da presunção de inocência adotado pelo Brasil, até então, garantiu, para muitos, em verdade, a impunidade, haja visto que a quase eternização do processo, com inúmeros recursos em diversas instâncias provoca em todos a sensação de impenitência, e conduz o processo à prescrição, ou seja, perde o Estado o direito de punir pelo decurso do prazo estipulado em lei. E o pior: isso sempre beneficiou os mais abastados. O pobre, como diz o adágio popular “mofa” na cadeia, inclusive, em muito casos, até mesmo depois de ter cumprido a pena. 
   A presunção de inocência surgiu de forma eficaz no Estado absolutista do século 18, e veio como uma resposta do povo contra as barbaridades praticadas pelo poder central, em especial pelo poder que o rei detinha de mandar prender os cidadãos de forma extraprocessual e quase sempre arbitrária, pois a prova do delito, ao contrário dos dias de hoje não era o elemento por si só constitutivo ou necessário para a caracterização do crime e, por consequência, da condenação. Um simples indício, ou uma meia prova não deixava o acusado inocente; fazia dele um “meio culpado”, ou um “pouco criminoso”. Nunca inocente!
   Foi, como muitos afirmam, a partir do lançamento da obra “Dos Delitos e das Penas, de Cesare Bonesana, o Marquês de Beccaria, que importante lição foi difundida, ou seja, a de que “um homem não pode ser considerado culpado antes da sentença do juiz; e a sociedade apenas lhe pode retirar a proteção pública depois que seja decidido que ele tenha violado as normas em que tal proteção que lhe foi dada”. Note-se que o Marquês de Beccaria não fez crer que o homem só poderia ser preso após o trânsito em julgado de uma sentença condenatória, mas sim, após a sentença de um juiz. 
   Na Declaração de Direitos do Homem, de 1789, que é uma das fontes do princípio da presunção de inocência consta que “todo homem é considerado inocente, até o momento em que reconhecida a sua culpa”. Por sua vez, a Declaração Universal dos Direitos do Homem , da ONU, destaca que “toda pessoa acusada de um delito penal tem o direito à presunção de inocência até legalmente provada a sua culpa em um processo público em que ele tenha todas as garantias necessárias para a sua defesa”. Note-se, de novo, que nenhuma das duas importantes declarações menciona a exigência do trânsito em julgado de uma sentença condenatória.
   Houve, agora, no Brasil um grande equívoco  daqueles mais inconformados em afirmar que o país se isolou do resto do mundo no campo jurídico/humano ao permitir o cumprimento da pena após o julgamento em segunda instância. Nos Estados Unidos, por regra, o réu passa a cumprir a pena logo após o julgamento de primeiro grau. Se desejar recorrer, o fará preso. Na Espanha, Inglaterra, Canadá, Alemanha e França , dentre tantos outros países também não se exige o trânsito em julgado para o réu iniciar o cumprimento da pena. Portanto, o Brasil não está se isolando do mundo. Ao contrário, vai mostrar que doravante, a todos, que os condenados cumprirão as penas que lhes forem aplicadas. (ALMIR RODRIGUES SUDAN, advogado em Londrina, página 2, ESPAÇO ABERTO, quarta-feira. 9 de março de 2016, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA).

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