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sábado, 25 de julho de 2015

ÁLCOOL E JUVENTUDE, COMBINAÇÃO DELICADA



   Uma das mais conhecidas poesias do poeta francês Arthur Rimbaud inicia: “Ociosa juventude/a tudo escravizada/por delicadeza/eu perdi minha vida”. O poeta faz referência à sua própria adolescência e às perdas havidas como resultado de más escolhas, conseqüência da delicadeza – que impossibilitou recusá-las. A realidade de 1872 era bem diferente da atual, mas permanece atualíssima a ideia de uma juventude que se deixa envolver por fatores que lhe são, ou deveriam ser, alheios e, que pelas fragilidades normais dessa etapa da vida, insegurança, vaidade, medo de ser diferente do grupo, permite que seja tirada até mesmo a sua vida, talvez pela delicadeza de não se negar a cumprir desafios sem qualquer sentido.
   Lamentamos recentemente a perda de um estudante que entrou em uma competição estúpida numa festa em que tomou quase 30 doses de vodca. E lamentamos muito mais saber que isso não foi uma exceção; o consumo exagerado de bebidas alcoólicas entre jovens, e até crianças,já assume a dimensão de um dos maiores problemas de saúde pública, e está em toda parte, como um inquietante desafio, uma prova de alguma coisa, que certamente não será bom senso.
   Comportamentos autodestrutivos têm em  sua própria gênese a barreira que dificulta controlá-los; a pessoa ainda em amadurecimento, exposta, diante do grupo ao qual deseja pertencer, ao álcool, drogas, riscos descabidos, não aceitará facilmente ponderações racionais sobre isso. A inadequação, insatisfação, ostentação, solidão, o que for que lhe tenha sido gatilho para disparar essa arma sobre si mesmo, parecem um pouco aplacadas no início do processo, e são quase incoercíveis em seu decorrer.
   Pesquisas no Brasil e no mundo apontam o crescimento entre os jovens do que é chamado “binge drinking”, ou seja, um beber episódico, no qual uma grande quantidade de bebidas é consumida em curtíssimo tempo, sem dar ao organismo possibilidade de recuperação, podendo levar à morte ou comportamentos inadmissíveis ou altamente constrangedores.
   Assim, meninas, praticamente crianças, deixam-se fotografar em trajes sumários e poses eróticas apenas porque se não o fizessem seriam rotuladas de caretas, ou qual seja o xingamento da moda para o recato, pelos instigadores da insanidade, geralmente interessados materialmente nela. Estudantes  se embriagam para não fugir à “competição”. Jovens motociclistas e motoristas  dirigem seus veículos de modo suicida e  assassino, acreditando com isso obter respeito dos demais.
   A  venda de bebidas a menores de idade é proibida, mas tal lei é amplamente desconhecida  mostrando claramente que a solução não é criar boas normas,  que já  temos em quantidade suficiente, mas sim cumpri-las.
   Resolver problemas na teoria, sem o ônus do envolvimento e da ação, costuma ser inócuo, as famílias precisam refletir sobre seus conceitos de autoridade, distinguindo-o de autoritarismo, aproximando-se verdadeiramente de seus filhos, interessando-se de fato  pelo que pensam, pelo que fazem, pelos seus sonhos e pesadelos e contando o que sabem de escolhas e conseqüências.
   Escolas podem auxiliar trazendo para as salas de aula discussões sobre o tema e evidenciando eu aulas de ciência as sequelas do consumo prematuro e exagerado do álcool; mas o relacionamento parental, e seus valores, sempre serão preponderantes.
 Temos que conceder autonomia, sem deixar de compartilhar valores, e este é um desafio verdadeiro aos pais,  professores, irmãos, amigos, para quem ame esses meninos e meninas e se sinta responsável por eles. E ter consciência de que partilhar sua vida não significa de modo algum viver a sua vida.
   Adolescentes parecem não ter real consciência de que a vida é frágil e pode terminar, nada parece ser capaz de atingi-los de verdade; ressalvadas as tristes exceções de quem perdeu entes queridos, padece doenças graves ou sequelas de acidentes, sentem-se imortais. Apenas pessoas amorosas podem convencê-los de que não são. ( WANDA CAMARGO, educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil (UniBrasil) em Curitiba, página 2, FOLHA OPINIÃO, ESPAÇO ABERTO, publicação do jornal FOLHA DE LONDRINA, sábado, 25 de julho de 2015).     

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